Texto: Marcos Anubis
Foto: Reprodução/Blindagem

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No dia 8 de abril de 2010, morria Ivo Rodrigues, a “voz disfarçada de gente”. O cantor esteve à frente das bandas paranaenses Blindagem e A Chave e, ainda hoje, segue bem vivo na memória dos fãs e das pessoas que conviveram com ele. Sua música também continua sendo ouvida nos shows do Blindagem, que atraem fãs que não se cansam de ouvir um repertório que faz parte da vida de várias gerações de curitibanos.

Ivo dividiu o seu talento com o poeta Paulo Leminski (1944-1989) e com os seus companheiros de banda. Músicas como “Oração de um suicida”, por exemplo, nasceram da união da genialidade dos dois. Com o Blindagem, o cantor se tornou conhecido nacionalmente nos anos 1980. Canções como “Operário padrão”, “Gaivota” e “Se eu tivesse” fizeram parte da vida de muita gente. É o caso da bailarina Maria Helena Martins. Fã do grupo desde aquela época, ela guarda a imagem de Ivo durante um dos grandes momentos da história do grupo: a gravação do DVD “Rock em Concerto”, filmado em 2007 no Teatro Guaíra lotado, ao lado da Orquestra Sinfônica do Paraná (OSP). “Eu acho que eles não tinham noção de que poderiam lotar o Guaíra. Muita gente chorou, foi emocionante. O Ivo pediu várias vezes para acenderem as luzes para que ele pudesse ver o público”, recorda Maria Helena.

O baixista do Blindagem, Paulo Juk, também lembra com carinho daquele momento. “Quando a OSP fez a primeira leitura das músicas do Blindagem que seriam apresentadas no “Rock em Concerto”, eu e o Ivo estávamos sozinhos, sentados na plateia. De repente, ele me olha com os olhos cheios de lágrimas e disse: ‘Eu não sabia que a nossa música era tão bonita’. Foi emocionante”, relembra.

A consciência dessa beleza talvez tenha motivado o último pedido de Ivo ao amigo, feito três dias antes de sua morte, em um quarto do Hospital de Clínicas de Curitiba, onde tratava um câncer na uretra, detectado apenas um mês antes do seu falecimento. “Conversamos, demos boas gargalhadas e, na hora de eu ir embora, quando fui para a porta, ele me chamou e falou: ‘Sócio, não acabe com a banda’. Eu disse que estávamos esperando que ele se recuperarasse. Ele apenas sorriu para mim. Fui embora e foi a última vez que o vi”, conta Juk, emocionado.

Resgate

Para manter viva a história do Blindagem e de Ivo, o jornalista Luiz Felipe Fagundes está finalizando um livro em que pretende recontar a história do grupo. “Enquanto buscamos formas de publicar, o processo de pesquisa continua. Ainda tem gente para conversar e muito material perdido por aí”, conta.

Uma das pessoas que podem ajudar a recontar alguns capítulos curiosos dessa história é a ex-presidente do fã-clube  do Blindagem, chamado Loba da Estepe, Claudia Falce.

A pedido de Ivo, pouco antes de sua morte, ela mandou confeccionar uma camiseta com uma caricatura do vocalista e os dizeres “Rock star, Blindagem vocal”. Segundo ela, o vocalista não gostava de apelidos e procurava sempre chamar as pessoas pelo nome. Outra “mania” de Ivo era contar piadas. “Ele contava a mesma piada umas 30 vezes e nós sempre ríamos”, relembra.

Paizão

As memórias deste lado sensível e bem-humorado de Ivo são tão marcantes quanto seu talento musical. Sua presença, em qualquer ambiente, trazia risos e boas conversas. São muitas as histórias engraçadas e curiosas que os amigos guardaram da convivência com o cantor.

A sua relação com a família – Ivo é pai da DJ Angela e do baterista Ivan Rodrigues, sempre foi marcada pelo carinho. Angela revela que o pai era cuidadoso e protetor. “Ele me levava e ia me buscar na escola até os 16 anos. Na adolescência, naquela fase em que não queríamos que ele fosse ao colégio, ele nos deixava na esquina e ficava olhando nós caminharmos até a entrada. Quando estávamos bem na porta, na frente dos amigos, ele passava buzinando e gritando: ‘te amo princesa’. Isso com aquele vozeirão. Aí sim, ele ia embora”, conta.

Uma das grandes paixões de Ivo era o cinema. Ele passava muito tempo com a sua família, em casa, assistindo à tevê e vendo filmes clássicos. Outra, era a gastronomia. “Nos finais de semana, quando não estava tocando, seu programa preferido era almoçar em Santa Felicidade, isso desde que os filhos eram bem pequenos”, revela a esposa do cantor, Suka Rodrigues. “O que ele gostava mesmo era de tomar a sua cerveja, compor, cantar e se divertir”, complementa Paulo Juk.

No mundo atual, em que os artistas estão cada vez mais distantes do seu público, a paixão pela música e pela arte não é uma qualidade facilmente encontrada no meio musical. Esse talvez seja o maior legado que Ivo Rodrigues tenha deixado para os fãs e para as novas gerações de artistas paranaenses. “Um músico com uma voz sem igual, um poeta, um grande artista. Alguém que viveu da sua arte, sem se corromper. Um ser humano ímpar, na sua integridade e quase pureza! Um menino grande, uma voz disfarçada de gente!”, finaliza Suka.