Texto: Marcos Anubis
Revisão, tradução e fotos: Pri Oliveira

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O Jokers Pub viveu nesse sábado (30) mais uma noite especial para a cena Psychobilly curitibana. Dessa vez, foram os dinamarqueses do Nekromantix que escreveram mais uma página inesquecível para os fãs do estilo.

Viajantes de outra galáxia

A abertura da noite ficou a cargo dos curitibanos do Wi Fi Kills, novo projeto do multi-instrumentista Klaus Koti (Penitentes e O Lendário Chucrobillyman). O grupo surpreendeu com uma performance impactante e repleta de citações musicais.

A formação do grupo tem Klaus Koti (sintetizador, teclado, bateria eletrônica e vocal), Gean Santos e Fernando Nishijima (guitarras) e Babi Age (bateria). “A banda surgiu durante uma reunião despretensiosa de Gean, Koti e Nishijima, munidos de duas guitarras e um teclado de brinquedo com vários efeitos. Nesse dia já foram criadas duas músicas e o esqueleto do que seriam algumas outras”, explica Fernando.

A postura de palco e as composições do Wi Fi Kills mostraram uma variada gama de referências. Estão ali, de forma perceptível, elementos que remetem a grupos seminais, entre eles Devo, Kraftwerk e Talking Heads.

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Além deles, o Punk Rock parece ser uma espécie de fio condutor no som da banda. “Devo, Kraftwerk e outros sons são gostos que todos da banda compartilham. Mas a ideia central é fazer um som bem mais experimental do que estamos acostumados. O Punk e o Garage se incluem na mistura porque tudo que tocamos acaba saindo assim (risos)”, explica Fernando.

Entre essas referências estão os gigantescos capacetes na cor cinza, usados pela banda no palco, no que parece ser uma referência aos velhos filmes de ficção científica. “Os Wi Fi Kills vieram de outra galáxia. São viajantes que estão aqui para passar a mensagem de que muitas frequências que estão no ar podem ser nocivas ao seu cérebro. É um alerta”, revela Fernando.

A boa notícia é que, apesar do pouco tempo de vida, a banda já está gravando seu álbum de estreia, que deve ser lançado em breve.

A julgar por sua primeira aparição em nosso orbe terrestre, as frequências do Wi Fi Kills ainda atingirão muitas mentes. “Esse foi o primeiro show oficial da banda e recebemos vários feedbacks positivos. Foi bastante interessante, pois não divulgamos nenhum tipo de material prévio, apenas algumas fotos. Então, ninguém sabia muito bem o que esperar. Foi bem legal!”, finaliza Fernando.

 

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Clássicos e diversão

A última vez que o Nekromantix se apresentou no Brasil foi em 2011, no festival curitibano Psycho Carnival. Na época, a banda teve alguns problemas com voos e visto, mas apesar disso, a primeira vinda parece ter marcado esses simpáticos dinamarqueses. “A nossa participação no Psycho Carnival foi incrível. Para nós, foi um show de estreia fantástico no Brasil. Público imenso, atmosfera legal e um ótimo som”, diz o baixista e vocalista Kim Nekroman.

Ele é o único remanescente da formação original da banda, criada em 1989 na cidade de Copenhagen. Na apresentação desse sábado, Kim (baixo e vocal), Franc (guitarra e backing vocal) e Adam (bateria) iniciaram o show com “Struck by a Wreckin’ Ball”.

O setlist teve músicas de todas as fases da carreira do grupo, entre elas “Necrofelia” e “Alice in Psycholand”. Durante o show, de forma simpática, Kim chegou até a perguntar aos fãs o que eles queriam ouvir.

Franc chamou muito a atenção pela velocidade e precisão com que toca os riffs das canções da banda, como “Alive”, por exemplo. Adam também teve o seu destaque, com direito até a um solo de bateria. Esse é um fato interessante porque, no Psychobilly, devido à configuração de seu instrumento, o baterista precisa ser muito criativo.

Enquanto no Heavy Metal ou mesmo no Rock a bateria é cheia de acessórios, no Psycho ela é quase minimalista. Além do chimbal e de dois pratos, Adam tinha bumbo, surdo, caixa e um tom. “Who Killed the Cheerleader” encerrou a apresentação. “O show foi incrível! Nós nos divertimos muito e foi ótimo voltar a Curitiba”, afirmou Kim.

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O Coffin Bass

Existem instrumentos musicais que ficam marcados na história da música. O baixo de Gene Simmons do Kiss e a guitarra de Zakk Wylde são dois bons exemplos desse tipo de ligação.

Quando os fãs lembram do Nekromantix, a primeira imagem que vem à cabeça é a do baixo de Kim Nekroman. “O coffin bass (baixo caixão) certamente se tornou um ícone e é o membro mais conhecido da banda”, afirma Kim.

A história de sua criação começa no fim da década de 1980, época em que o Nekromantix dava os seus primeiros passos. “Logo depois do nosso primeiro show, em 1989, que tinha sido filmado por um amigo, eu estava assistindo à nossa apresentação e comecei a pensar que eu precisava de algo mais interessante do que um contrabaixo comum”, explica Kim. “Um amigo me deu um caixão de criança e foi assim que eu fiz o meu primeiro ‘coffin bass’. Desde então, criei mais sete ou oito baixos assim, tentando desenvolvê-los e melhorá-los cada vez mais”, complementa.

Os ajustes que criam o som característico do coffin bass, porém, são segredos que só Kim possui. “O design do instrumento não faz com que o som fique muito diferente. A forma como eu o configuro (cordas, captadores, etc.) é o que faz com que ele tenha uma sonoridade única”, conta.

A conexão com a capital paranaense

Há muito tempo Curitiba é considerada a capital do Psychobilly no Brasil. Além de uma cena solidificada e atuante, a cidade tem várias bandas que conseguem se destacar internacionalmente, como o Sick Sick Sinners e As Diabatz.

Esse protagonismo também leva a uma relação de amizade e respeito entre os curitibanos e muitos grupos seminais na história do estilo. “Eu conheci o Vlad e os Catalépticos há muitos anos, em um festival na Inglaterra. A cena Psychobilly é pequena, então, todo mundo se conhece. A internet tornou muito fácil o modo como mantemos contato com todos”, conta Kim.

Na esteira desses laços de amizade, algumas portas sempre acabam se abrindo para músicos talentosos. E, na cena Psycho curitibana, não faltam instrumentistas acima da média. “Um fato engraçado e que nem todo mundo sabe é que o Cox (baterista dos Catalépticos e agora baixista do Sick Sick Sinners) foi, ou na verdade, era para ser o nosso baterista substituto numa época em que precisávamos de baterista para uma tour pelos Estados Unidos. Infelizmente, problemas com o visto tornaram isso impossível”, revela.

Em 2001, após o lançamento do álbum “Return of The Loving Dead”, o Nekromantix se mudou para  Los Angeles, na Califórnia. De acordo com Kim, a diferença entre as cenas dos dois países é gigantesca. “Não existe e nem nunca existiu uma cena Psychobilly na Dinamarca (risos)”, afirma.

Kim acredita que sair da Dinamarca e encarar uma nova realidade nos Estados Unidos foi uma decisão acertada para a banda. “A mudança foi, definitivamente, um movimento certo para a nossa carreira. Tudo neste mundo é sobre o tempo certo (e também alguma sorte) e ter assinado com um selo norte-americano e viver lá exatamente quando os Estados Unidos ‘descobriram’ o Psychobilly foi um importante fator que contribuiu para a carreira da banda”, diz.

Psychobilly sem fronteiras

Surgido na Europa, o Psychobilly encontrou no Brasil um cenário perfeito para a sua evolução. Mesmo distantes do chamado “primeiro mundo”, Curitiba e outras cidades brasileiras possuem cenas fortes desde a década de 1980.

Acostumado a tocar em vários países e, consequentemente, conhecer suas cenas, Kim vê com tranquilidade essa realidade globalizada. “Eu não acho estranho, de maneira nenhuma. Tanto a América do Sul quanto a América Central têm cenas de Metal e de Rockabilly muito prósperas. Mencionando o Vlad Urban e os Catalépticos novamente, eu não tenho dúvida de que o fato deles viajarem para o exterior para estabelecer o seu nome na cena e o incrível trabalho na organização do Psycho Carnival são razões diretas que comprovam uma cena ativa e criativa do Psychobilly brasileiro”, opina.

O festival, que em 2016 teve a sua 17ª edição, é realmente um dos principais fatores para esse reconhecimento. Nos últimos anos, o Psycho Carnival se tornou um dos festivais mais importantes do mundo Psychobilly. “O Psycho Carnival é definitivamente conhecido fora do Brasil e, embora o mundo tenha se tornado ‘menor’, o Brasil ainda fica um pouco ‘distante’. Os festivais internacionais de Psychobilly mais importantes são o Psychobilly Meeting em Pineda de Mar (Espanha) e o Satanic Stomp (Alemanha)”, diz.

O futuro do Nekromantix

O Nekromantix está prestes a lançar um novo álbum, o décimo de sua carreira. “A Symphony Of Wolf Tones and Ghost Notes” é o primeiro desde “What Happens in Hell, Stays in Hell” (2011). “Ele está pronto. O lançamento acontecerá no dia 21 de outubro, ainda em tempo para o Halloween. O novo álbum é uma coleção de toda a história do Nekromantix, novo e antigo, mas sem nos repetirmos ou sem escrevermos as mesmas músicas”, revela.

Uma das características de Kim Nekroman é que ele tem uma visão muito particular sobre o Psychobilly. “Primeiro, eu quero dizer que não considero o Psychobilly um gênero musical, mas sim uma subcultura que ouve uma ampla variedade de ‘billy’ e músicas relacionadas. Então, o Psychobilly realmente absorve os estilos de fora. E, em minha opinião, é isso que tem mantido essa subcultura viva e emocionante por tantos anos”, finaliza.

Com quase 30 anos de estrada, o Nekromantix continua produzindo material inédito e fazendo turnês pelo mundo afora.  Ao ver a vitalidade e o prazer que a banda demonstra ter no palco, essa história parece que não terá fim tão cedo.