Texto: Marcos Anubis
Fotos: Divulgação/Reprodução Facebook Sepultura

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“Max e Igor se recusaram a participar desse filme”.  A frase que é exibida no final do documentário “Sepultura – Endurance”, que teve a sua pré-estreia nessa segunda-feira (14) no Cinesystem do Shopping Curitiba e no Cinemark do Shopping Mueller, resume bem o sentimento dos fãs. Afinal, não contar com os irmãos Cavalera, que fundaram a banda, dá ao filme um tom de melancolia.

Não que ele não seja interessante, afinal, o Sepultura tem mais de 30 anos de estrada e simplesmente saiu de Belo Horizonte para ser reconhecido e respeitado nos quatro cantos do mundo. Mesmo sem Igor e Max, o longa aborda muito bem os bastidores do grupo, principalmente quando mexe nas várias feridas que a banda carrega até hoje.

O longa foi realizado pela Interface Filmes, com produção de Luciana Ferraz, distribuição da O2 Play e direção do cineasta Otavio Juliano. Foram usadas mais de 800 horas de gravações, registradas por Otavio durante os seis anos em que acompanhou o grupo durante as turnês dos álbuns “Kairos” (2011) e “The Mediator Between Head and Hands Must Be the Heart” (2013). Além disso, imagens antigas de arquivo, fotos e shows da banda ao redor do mundo ajudam a contar a história do Sepultura.

O roteiro do filme é norteado pelos depoimentos de Andreas Kisser e Paulo Xisto. Em umas das sequências, por exemplo, os dois aparecem andando pelas ruas de Belo Horizonte mostrando, entre outros locais, a loja onde ficava a Cogumelo Records (selo que deu o grande impulso ao metal nacional na década de 1980) e a casa de Paulo, onde aconteceram os primeiros ensaios da banda. Andreas, sempre bem articulado e inteligente em suas afirmações, acaba sendo o fio condutor nesse mergulho dos fãs no universo do Sepultura.

Mas é nas entrevistas internacionais que é possível perceber o quanto o grupo é respeitado. Lars Ulrich (baterista do Metallica), David Ellefson (baixista do Megadeth), Phil Campbell (ex-guitarrista do Motörhead), Scott Ian (guitarrista do Anthrax), Todd Singerman (ex-empresário do Sepultura e do Motörhead), Phil Anselmo (ex-vocalista do Pantera) e Corey Taylor (vocalista do Slipknot) rasgam elogios ao Sepultura.

Scott diz que achava que os brasileiros eram uma banda “comum”, na mesma linha do Slayer e do Possessed. Mas revela que tudo mudou quando ouviu a música “Refuse/Resist”, do álbum “Chaos A.D.” (1993). “Eu me arrepio até hoje ao lembrar da sensação que eu tive ao ouvir essa canção pela primeira vez! Aquilo era a trilha sonora do apocalipse!”, diz.

David Ellefson afirma que o fato de a banda ser do Brasil ajudou a aumentar a aura de mistério em torno do grupo. Afinal, no mundo pré-internet, quando o Sepultura começou a se destacar na Europa e nos Estados Unidos, não existiam muitas informações sobre a banda. “Eles já eram celebridades e nem sabiam disso”, opina.

Já Phil Campbell elogia Andreas de uma forma surpreendente. “Ele é um dos melhores! Deveria estar junto aos deuses da guitarra!”, afirma.

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As feridas ainda abertas

São poucas as imagens em que Igor e Max aparecem junto à banda. Em uma delas, o vocalista está na tribo Xavante onde o grupo gravou parte do álbum “Roots” (1996). Igor aparece dando um depoimento sobre a reestruturação da banda após a saída de Max.

Uma das sequências mais interessantes do doc mostra a banda reunida no ônibus que estava sendo usado na turnê de divulgação do álbum “Kairos” pelos Estados Unidos. Nas imagens, Jean fala que não está mais aguentando a vida na estrada e a saudade de sua família. Andreas “aconselha” o baterista, falando de uma forma bem tranquila e usando suas décadas de experiência para mostrar que todos já passaram por essas “provações”. Jean sairia da banda em 2011, justamente por não conseguir se adaptar a esses problemas.

Mas o momento mais tenso e emblemático do documentário é quando Andreas fala sobre a saída de Max. O envolvimento do vocalista com a empresária da banda, Gloria, que acabou se tornando a sua esposa, é apontada como o grande motivo para a sua saída. “Ele nem brigou pelo nome da banda!”, diz Andreas.

Esse desgaste provocado pela convivência diária em uma banda, principalmente durante as longas turnês, também é abordado pelos outros entrevistados. “Eles já tocaram em mais países do que eu visitei em toda a minha vida”, diz Phil Anselmo.

O fato de Max não ter aceitado participar do filme (na versão da banda e dos produtores) deixa uma grande lacuna quando esse assunto é abordado. Afinal, fica faltando a versão do ex-vocalista para se contrapor ao depoimento de Andreas.

Aliás, quando o filme já estava quase finalizado, os irmãos Cavalera exigiram que fosse realizada uma reedição. Juliano, então, cortou um trecho das músicas “Roots” e “Attitude” que, no documentário, são executadas pela formação atual do Sepultura.

No final da exibição do filme, após os créditos, foram exibidas duas músicas gravadas ao vivo no show de 30 anos da banda, realizado em 2015 no Audio Club, em São Paulo: “Choke” e “Convicted in life”. Esses vídeos não farão parte do documentário em suas exibições a partir de agora. A assessoria de imprensa informou que, a princípio, o filme não terá outras sessões em Curitiba.

Os fãs receberam o filme com bons olhos, mas ficou evidente a ausência de Max e Igor deixou “Sepultura – Endurance” incompleto. “A espera por um documentário que retratasse a história da maior banda de Metal do Brasil foi grande. Eu, como a maioria dos fãs mais antigos, tinha uma desconfiança para saber como seria sem a participação dos irmãos Cavalera, fundadores do Sepultura. O resultado final, ao meu ver, é um bom documentário que busca retratar todas as fases da banda e o seu impacto na cena metal internacional, trazendo importantes relatos de grandes músicos!”, avalia o gerente de suprimentos Andrey Guimarães, de 36 anos. “Sem dúvida nenhuma a ausência dos irmãos Cavalera deixa o filme com a nítida sensação de que algo está faltando para completar a história! É uma pena que eles não tenham aceitado participar de um documentário que promoveria ainda mais o legado da banda”, complementa.

O Sepultura, sem nenhum exagero, renasceu em três ocasiões: nas saídas de Max, Igor e Jean Donabella. Esse é um mérito que ninguém pode tirar de Andreas e Paulo. Mesmo sem os Cavalera, “Sepultura – Endurance” cumpre bem o papel de mostrar os bastidores e as dificuldades enfrentadas pelo grupo durante suas mais de três décadas de vida.