Tods show 92 Graus Curitiba

Tods, Rodrigo Elias está ao fundo (Foto – Arquivo pessoal Rodrigo Elias)

 

Seattle brasileira. Nos anos 1990, Curitiba recebeu essa alcunha da imprensa nacional. O adjetivo se referia ao grande número de bandas guitar e grunges que dominavam a capital paranaense. Um dos grandes nomes dessa cena era o Tods. Pois eis que o quarteto formado por Rodrigo Elias (guitarra e vocais), Igor Amatuzzi (guitarra e backing), Fernando Lobo (baixo e backing) e Rodrigo Thur (bateria) está de volta.

O show de retorno acontece hoje no 92 Graus, na UVNGT #10, ao lado do Cassim & Barbária do ex-Magog Cassiano Fagundes que fará o lançamento de seu mais recente álbum “III”, e do April Seven do baixista e vocalista Lee Kinski e do guitarrista Milkman Stars, ambos ex-Eletric Heaven. “O que motivou essa volta foi o retorno do nosso baterista, que foi o último a regressar de Londres desde nossa mudança para lá no ano 2000”, explica Rodrigo Elias.

O processo que envolve a volta de uma banda envolve muitos fatores, mas talvez o principal seja a química entre os músicos. E isso parece ter se mantido intacto no Tods. “Há cinco anos nós fizemos um show aqui em Curitiba com a formação original, sem ensaiar, e foi perfeito. Fora isso fazia quase dez anos que estávamos separados. De certa forma ainda estamos, pois o nosso baixista mora em São Paulo e o Thur perto de Criciúma, em uma vila que nem sei o nome. Sempre que estamos na mesma cidade temos essa vontade de tocar juntos, pois nossa afinidade musical e a amizade são perfeitas”, elogia.

O que chama mais a atenção é que a intenção do grupo é que essa volta seja realmente uma retomada do trabalho do Tods, uma sequência que gere novos frutos. “Temos várias propostas, ou pretensões, pois sempre tivemos fama de pretenciosos, talvez por eu sempre ter alimentado o sonho de uma carreira internacional. Ainda alimento!”, diz.

O grupo já faz planos para 2015 e um deles é “reforçar” a sua discografia. “Queremos voltar a tocar pelo Brasil no ano que vem e gravar o nosso primeiro disco, pois até hoje só fizemos EPs. Chegamos a gravar um álbum em 1997, que se perdeu, pois o dono do estúdio simplesmente sumiu”, relembra.

Outra ideia do quarteto é fazer um documentário mostrando como foi a música curitibana na década de noventa. “O Thur trabalha com vídeo e sempre tivemos a vontade de fazer um filme mostrando como eram os 1990, não só o Tods, mas todo o circuito, bares, casas de show, público”, conta.

Rodrigo é enfático ao afirmar que a banda não está fazendo uma “volta nostálgica”. A intenção é realmente continuar o trabalho do quarteto. “O Tods nunca acabou e nunca vai acabar! Nesses últimos dez anos nós gravamos dois mini – álbuns, cada um com seis ou sete músicas com nosso baterista reserva, o querido Victor Schemes que também fez parte de bandas como Marigold e Góticos For Fun, entre outras”, explica. “Temos cerca de 50 músicas. Não tivemos tempo nem de ensaiar para esse show e muito menos compor. Faremos a apresentação com o set antigo, mas provavelmente para 2015 venha coisa nova, além da regravação dos velhos hits!”, complementa Rodrigo.

 

Tods show 92 Graus Curitiba

Tods em um show na década de 1990 (Foto – Arquivo pessoal Rodrigo Elias)

 

A década de ouro da música curitibana

 

Nos anos 1990 Curitiba conseguiu construir uma grande cena do som guitar. Grupos como Dive, Magog, C.M.U Down flertavam com o barulho e a melodia de forma perfeita. Balizados por veículos com o Caderno Fun, do jornal Gazeta do Povo, comandado pelo jornalista Abonico Smith, e pela rádio Estação Primeira, Curitiba foi colocada no mapa da música brasileira, e com muita qualidade.

Hoje esse cenário de apoio se perdeu. É cada vez mais difícil para as bandas daqui mostrarem os seus trabalhos, seja nas rádios ou órgãos de imprensa. Quais seriam os motivos que levaram a essa involução? “Realmente os anos 1990 foram riquíssimos no quesito bandas, em Curitiba. Hoje, a música ainda é muito forte aqui. O som eletrônico tem caras muito feras, dos quais eu sou fã, mas em relação às bandas eu fico um pouco frustrado”, analisa Rodrigo. “O bairrismo tomou conta. Adoro letras em português e o sotaque sulista, mas acho que há um pouco de exagero. Nossa música não tem nacionalidade e também não gosto de enquadrar em nenhum estilo”, complementa.

Na visão de Rodrigo, um dos grandes vilões do atual cenário curitibano é a segmentação exagerada das bandas e seus públicos. “O pessoal se divide muito, hoje em dia. Banda indie toca com indie, banda psycho toca com psycho, banda punk com punk, banda metal com metal e assim por diante. Nos anos 1990 era tudo mesclado, inclusive o público que se unia e fazia a cena forte com potencial pra cruzar fronteiras inimagináveis. Agora o pessoal quer ser artista, famoso, só olha para o próprio umbigo!”, critica.

Dentro desse contexto, Rodrigo acredita que a união entre as várias cenas e bandas curitibanas na década de 1990 foi um dos segredos para aquele momento mágico para a música na capital paranaense. “Na nossa época ajudamos e estimulamos muita gente a ter banda. Uma prova disso é o CD ‘Guitar’, realizado pelo Manoel Neto. Abrimos muitos bares que estão aí até hoje. Nós montávamos palcos na mão nos dias dos shows, gostávamos de ter toda uma cena envolvida. Nunca subi em um palco antes do último amigo entrar no bar!”, relembra.

O apoio da mídia realmente parece ser um dos maiores entraves para que as bandas curitibanas alcem voos maiores. Felizmente o jornalismo musical em Curitiba ainda tem algumas figuras importantes que carregam a bandeira da valorização aos artistas locais, como os jornalistas Cristiano Castilho e Sandro Moser, na Gazeta do Povo, e Clóvis Roman na rádio 91 Rock, mas essa é uma luta inglória. “Com esse lance da Internet e do DIY, (faça você mesmo), a mídia curitibana, que já era fraca, se tornou inexistente. Tínhamos o Prêmio Fun, que elegia os melhores músicos, canções e bandas, e agora tem alguma coisa? Pergunto de verdade, pois realmente não sei. Ando bem desapegado das coisas, não pesquiso mais música, estou de certa forma meio por fora, mas acredito que não tenha nada”, comenta Rodrigo.

Novamente o guitarrista e vocalista vê a questão do isolamento dos pequenos nichos, em detrimento de uma cena maior e mais abrangente, como um dos motivos para que tudo se torne mais difícil. “Isso é devido à singularização. Ninguém apoia ninguém. Curitiba é uma cidade onde quase todo mundo dessa cena se conhece e por essa razão ainda temos grupinhos x e y. Nós somos do ‘todo’, quem quiser experimentar e vir na nossa onda é muito bem vindo”, diz.

 

Admirável mundo novo

 

O mais intrigante é que hoje as ferramentas disponíveis para que uma cena seja divulgada e se fortaleça, seja ela qual for, são infinitamente mais abrangentes do que na década de 1990. A história do Tods foi construída em uma época em que a Internet não existia. A divulgação das bandas era feita por fanzines, fitas demo ou na propaganda boca a boca. Hoje, com o auxílio das redes sociais e sites, tudo fica, teoricamente, mais fácil. “Naquela época não tínhamos a Internet para trabalhar, e mesmo assim conquistamos público em outras cidades e estados apenas com demos enviadas por correio e contatos telefônicos. Quem sabe agora possamos chegar ainda mais longe. Somos pretenciosos, mas sempre fizemos música por amor. Somos eternos amadores”, analisa.

Curitiba agradece por ter um de seus mais talentosos grupos de volta. Quem sabe, o Tods traga novamente os bons ventos de uma época em que a cidade mostrou que pode e tem condições de manter uma cena organizada, com produção fonográfica, shows e apoio da imprensa. Seria sonhar muito? “Com mídia ou sem mídia nós faremos barulho novamente e mostraremos para essa geração como é ter atitude e fazer as coisas com o coração, sem essa busca de preencher o ego com futilidades. A música pode ser manipuladora, e é, mas também tem o poder de libertar e expandir ideias, agregando valores e unindo pessoas para um bem comum”, finaliza Rodrigo Elias.

O Tods se apresenta hoje no 92 Graus, ao lado do Cassim & Barbária e do April Seven. Os ingressos custam R$ 15 e pode ser adquiridos no local, na hora do evento. A casa abre às 22h e as apresentações começam às 00:30. O 92 Graus fica na Av. Manoel Ribas, 108.

Confira a apresentação do Tods no lendário festival Leite Quente, que aconteceu em 1995 no Centro Politécnico, e o ouça as músicas do quarteto no Soundcloud da banda.