Texto: Marcos Anubis
Revisão: Pri Oliveira
Fotos: Gustavo Garrett

Ozzy Osbourne, uma aula de Metal para os curitibanos. (Foto - Gustavo Garrett)

Na última terça-feira (28) Curitiba recebeu pela primeira vez o homem que ajudou a criar o Heavy Metal. Em uma Pedreira Paulo Leminski lotada, o Madman fechou a Monsters Tour desfilando seus grandes clássicos e fazendo um show que ficará na memória dos fãs.

Não é nenhum sacrilégio afirmar que o Black Sabbath descobriu a alquimia rítmica que definiria o Heavy Metal nas décadas seguintes. No início dos anos 1970, os riffs soturnos e inigualáveis de Tony Iommi faziam a base para os vocais agudos de Ozzy Osbourne e começavam a criar o estilo mais agressivo que se tinha visto até então.

Nele não havia espaço para flores, paz ou amor. O Sabbath falava da dura vida dos trabalhadores ingleses e do lado obscuro do ser humano. Da realidade, convenhamos.

O show

A entrada de Ozzy e sua banda, Gus G. (guitarra), Rob “Blasko” Nicholson (baixo), Adam Wakeman (teclados) e Tommy Clufetos (bateria), foi uma demonstração de humildade. Nada de efeitos pirotécnicos ou mirabolantes, apenas a canção “Oh, Fortuna”, da épica ópera “Carmina Burana” ao fundo. “Destino monstruoso e vazio. Tu, Roda da Sorte, és malevolente. Bondade em vão que sempre leva a nada. Obscura e velada. Também me amaldiçoaste. Agora, por diversão, trago o dorso nu e entrego à tua perversidade”, diz a letra. Mais Metal, impossível.

Com o clima preparado, o vocalista apareceu sorrindo e mandando beijos para o público. “Vocês estão prontos para ficarem loucos? Deixem a loucura começar!”, disse. E aos primeiros acordes de “Bark At The Moon”, o Senhor das Trevas foi atendido.

Em seguida o público foi levado para dentro da Igreja Universal do Reino do Rock, como diz o vocalista do Motorocker, Marcelus. Isso porque a introdução com o teclado sintetizando um órgão de igreja soou na Pedreira, anunciando uma das pérolas do repertório de Ozzy: “Mr. Crowley”.

Mas a noite era, como pediu o vocalista, para todos ficarem loucos, não era? Então, no solo da música, o Madman pegou uma mangueira estrategicamente colocada atrás dos seis monitores de voz que o cercavam e deu um banho de espuma nos fotógrafos e nas pessoas que estavam na grade em frente ao palco. Nós, inclusive. Sobrou até para o técnico de palco que tentava em vão enxugar os monitores.

Feita a “travessura”, ele saiu rindo como uma criança, e os que ficaram ensopados também, diga-se de passagem. O show seguiu com “Fairies Wear Boots” do Black Sabbath e a belíssima “Road To Nowhere”, onde Ozzy nitidamente fala sobre a sua vida de excessos e aventuras. “Os destroços de meu passado continuam me assombrando. Isso não me deixará em paz. Eu ainda acho tudo um mistério. Poderia ser um sonho”, diz a letra.

Madman comando o público sem fazer esforço. (Foto - Gustavo Garrett)

Mais de 40 anos depois de seu início no Black Sabbath, Ozzy continua um frontman cada vez melhor. O cantor se movimenta de um lado para o outro no palco, distribui sorrisos e grita a cada música seu inconfundível “I can’t hear you!”. Em “Suicide Solution”, outro banho. Desta vez, porém, os fotógrafos foram pegos de surpresa e literalmente sumiram atrás da espuma.

Em seguida “War Pigs”, também do Sabbath e uma das músicas mais pesadas da história do Metal, levantou a Pedreira. “Políticos se escondem. Eles apenas iniciaram a guerra. Por que eles deveriam sair para lutar? Este papel eles deixam para os pobres”, diz a letra. Pois…

Na sequência, após um solo de guitarra e de bateria, Tommy Clufetos começou a marcar no bumbo o início de “Iron Man”. A comoção foi geral com o público acompanhando o inigualável riff criado por Tony Iommi. “I am Iron Man!”, gritou o vocalista.

Ninguém duvida disso, pois ao lado de outros monstros sagrados do Rock ‘n’ Roll como Keith Richards dos Stones e Lemmy do Motörhead, Ozzy se mantém na ativa mesmo tendo enfrentado alguns dos momentos mais sombrios que um ser humano pode passar.

Inclua-se nessa lista a morte de seu guitarrista, Rhandy Roads, em um acidente de helicóptero em 1982, e o fato de ter quase assassinado a sua esposa, Sharon, em 1989. Voltando ao show, quando você se refere a Ozzy Osbourne, é inevitável direcionar a sua atenção para os guitarristas.

Comparações não são razoáveis, mas vendo a banda atual do Madman, é impossível não lembrar de Rhandy Roads e Zakk Wylde. Gus G. é técnico e bom guitarrista, mas falta algo, e esse “algo” pode ser definido como “alma”.

A belíssima Pedreira Paulo Leminski lotada. (Foto - Gustavo Garrett)

“Ok, nós temos mais uma canção e agora eu quero ver vocês muito, muito loucos”, disse Ozzy antes de “Crazy Train”. Após a canção, o Madman saiu rapidamente do palco e voltou para, com o perdão do trocadilho infame, fechar com chave de ouro sua passagem por Curitiba.

“Paranoid” encerrou a apresentação. “Eu amo todos vocês”, disse Ozzy antes de se ajoelhar no palco e reverenciar o público. “Obrigado, boa noite e que Deus abençoe todos vocês. Obrigado por virem”, completou. A banda se abraçou e saiu do palco sob os aplausos e gritos dos fãs anestesiados pelo que viram. Ao fundo, “Changes” do Black Sabbath, cantada pela filha de Ozzy, Kelly Osbourne.

A voz quase infantil da herdeira do Madman fazia sentido, pois naquele momento todos éramos crianças. Foi impossível segurar as lágrimas. No intervalo de uma semana, Curitiba recebeu três bandas e um vocalista que simplesmente construíram alguns dos alicerces do Heavy Metal.

Daqui a 100 anos, Kiss, Motörhead, Judas Priest e Ozzy Osbourne ainda serão considerados alguns dos precursores desse estilo musical que une milhões de pessoas ao redor do mundo. E nós, curitibanos, poderemos dizer, onde estivermos, que fizemos parte disso, ao menos por duas noites. Somos privilegiados.

Confira três vídeos da apresentação: “Iron Man”, “Mr. Crowley” e “Bark At The Moon”.