Texto: Marcos Anubis
Revisão e fotos: Pri Oliveira
“Frio e chuva em Curitiba, por isso estou voltando pra lá. Cidade da Boca Maldita onde o Rock ‘n’ Roll esquenta o ar”. O som da banda curitibana Caixa Prego nasce aqui, nas frias paragens da capital das araucárias, mas caminha por Liverpool, Manchester, Londres e outras cidades importantes na história do Rock, incorporando influências diversas.
Renato Ximú (voz e violão), Marcos Gonzatto (voz e baixo), Yuri Vasselai (bateria) e Marco Ookla (voz e guitarra) viajam pelo som dos anos 1970 com riffs sujos e carregados de drive acompanhados por uma cozinha de baixo e bateria pesada e criativa.
O grupo teve início em 2009 e acaba de lançar seu primeiro álbum oficial. “Rock ‘n’ Roll Feito No Sul” soa quase que como um carimbo da música feita neste extremo do país, assumindo as influências e o sotaque característicos da região. “Eu acho que pelo clima e pelo jeito que é aqui, o Rock do Sul é um pouco diferente do resto do país. Não que seja melhor ou pior, mas é diferente, você sabe que é uma banda do Sul. O Rock daqui é mais puxado para os anos 1960/70, é uma coisa mais britânica. Não é nenhum bairrismo”, explica Marcos.
O álbum foi gravado e produzido pelo grupo no estúdio Old Black Records, mantido por Ximú e pelo empresário Helinho Pimentel. Na parte técnica, os registros de praticamente todas as canções foram feitos ao vivo e isso pode ser sentido na audição do CD, pois ele soa de uma forma bem orgânica, sem firulas tecnológicas. “Nenhuma música foi gravada seguindo o metrônomo, é sempre a banda tocando ao vivo. É uma coisa bem diferente do que é feito atualmente”, diz Ximú.
Essa forma mais livre de composição e gravação se reflete bem no som da Caixa Prego. O grupo cria as suas músicas em um processo literal de brainstorming, experimentando ideias até que elas se encaixem em um formato de canção. “Nós não tínhamos nada pronto. Alguém toca um riff aí se todos gostam nós acrescentamos o baixo, vamos ensaiando e começamos a gravar assim, do nada. Ninguém sabe onde será o refrão, nada disso. Nós só vamos estruturando ela. Aí depois nós escrevemos, gravamos, e aí temos que tirar a música novamente, porque não foi uma coisa pensada”, explica Marcos de forma bem humorada.
Como cada vez mais a venda de CDs diminui, principalmente em relação aos artistas independentes que não possuem uma grande divulgação, a banda optou por disponibilizar o CD completo na plataforma Soundcloud. A venda do álbum físico acontece nos shows do quarteto. “Hoje é complicado. Você faz mil cópias e gasta uns 2 mil reais para isso, mas vende uns 15 CDs em um show e o resto você vai acabar dando”, diz Ximú.
Como um aperitivo ou uma apresentação do que o ouvinte encontrará no CD, a arte da capa do álbum também chama a atenção pela qualidade e pela mensagem que passa. A foto foi tirada por Ximú em uma viagem aos Estados Unidos. “Eu estava no Mississipi, na Highway 61 que é uma estrada famosa pelo Blues, quando vi essa casa e resolvi tirar uma foto. É uma casa no meio do nada, bem ‘Caixa Prego’, mesmo”, explica.
O clima soturno e introspectivo da imagem, ao que parece, refletiu bem a intenção dos músicos. “Ela me passa uma sensação de isolamento. Na gravação nós ficamos aqui no estúdio, fechados, isolados. Às vezes nós chegávamos às três da tarde e ficávamos compondo até de madrugada”, complementa Marco.
Cena local
Prestes a perder o seu mais tradicional espaço para a música autoral com o iminente fechamento do 92 Graus, Curitiba vive um momento de incerteza. É fato que os trabalhos independentes sempre remam contra a maré vigente, em qualquer parte do mundo. Na capital paranaense, por vários motivos, essa equação é um pouco mais complicada. “Pra mim a cena existe, mas só ela não adianta. Quem faz a cena é o público”, diz Ximú.
Na visão da banda, qualquer iniciativa da mídia ou dos produtores locais só vai realmente surtir efeito quando o público curitibano abraçar as bandas locais. “Não adianta, por exemplo, uma rádio colocar um programa de bandas locais em horário nobre se a audiência cair, se ninguém escutar. Então o problema é cultural. Não digo que a culpa é da mídia, a culpa é do próprio povo”, diz Marcos.
Mas mesmo com o acesso ilimitado a todo tipo de música, seja ela de bandas consagradas ou independentes, o enigma é: Por que o interesse pelo novo é tão pequeno? Se nas gerações anteriores o grande barato era ir em um sebo e encontrar um disco de uma banda nebulosa que só você conhecia e de quem só você teria o álbum, hoje a realidade é outra. “Às vezes eu acho que falta as pessoas quererem conhecer uma coisa nova. O cara querer escutar um som novo, estar aberto para aquilo”, opina Marcos. “É um pouco de preguiça. Hoje tudo é muito mastigado”, complementa Yuri.
Consciente dos obstáculos, mas procurando levar a música à sua maneira, a estreia da Caixa Prego mostra uma banda madura e que conseguiu registrar em seu primeiro trabalho a alma de seu som. Veja a Caixa Prego tocando três músicas gravadas no Old Black Records: “Frio e Garoa Em Curitiba”, “Tela Assinada” e “Jaqueta Rasgada”. Depois dos vídeos você tem o link para ouvir o álbum na íntegra.
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