Texto: Marcos Anubis
Revisão e fotos: Pri Oliveira
Nem só de Psychobilly vive o Psycho Carnival. Na realidade, o festival vem, há muitos anos, abrindo espaço para outros estilos. Uma dessas vertentes que sempre marca presença no evento é a Surf Music. Na 18ª edição do evento, que acontece entre os dias 24 e 27, no Jokers, o representante do estilo será o trio The Mullet Monster Mafia, o maior expoente da Surf Music Instrumental no Brasil.
A banda nasceu em 2009 na cidade de Piracicaba, interior de São Paulo. A formação atual tem Ed Lobo Lopez (guitarra), Marcondinz Vernizério (baixo) e Emiliano Ramirez (bateria). Tradicionalmente, o Mullet é umas das principais atrações do Psycho Carnival.
A estreia aconteceu em 2011, na Festa do Esquenta. Naquele ano, o festival foi realizado no extinto Moinho, onde hoje é o Espaço Trésor Eventos. “O começo foi estranho porque a moçada não entendia muito bem o que a gente fazia ali no meio. É difícil até achar fotos do Mullet nas coberturas dos Carnivals de 2011 e 2012. Mas, com o passar dos anos, o festival foi ficando até com um caráter mais abrangente do que antes, quando era composto praticamente só por bandas Psycho”, relembra Emiliano, que também é baterista do Sick Sick Sinners.
A possibilidade de agregar outros estilos musicais, na visão de Emiliano, tornou o festival ainda mais interessante. “Atualmente, sempre tem uma ou outra banda de Surf, Garage, etc. Eu acho isso importante demais porque, no fim das contas, é o mesmo público. Eu vejo essa diversidade musical até como um bálsamo em meio ao festival. Dá uma mudada, o que sempre é bom”, elogia.
Uma ausência será sentida no show do próximo domingo (26). A banda não contará com o seu excelente baixista original, Marcondinz Vernizério, que está se recuperando de problemas de saúde. “Ele deve voltar depois de abril, se nada mudar. Devemos fazer uma turnê pelo Brasil, antes de irmos para a Europa”, explica Emiliano.
O “substituto” de Vernizério no show do Psycho Carnival será o músico Jefferson Novaes, ex-One Minute Less. “Ele é um figuraça lá de Piracicaba. Menino ‘bão’, baixista cascudo e que tem uma história foda na cena Punk/Hardcore do interior de São Paulo”, diz.
A discografia do trio conta com quatro álbuns lançados: “Power Surf Orchestra” EP (2009), “Dogs of the Seas” CD (2011), “Clash of the Irresistible” CD (2013) e “Surf‘n’Goat” EP (2016), todos distribuídos pelo selo Drunkabilly Records, da Bélgica.
O recém-lançado “Surf‘n’Goat” foi gravado no Milestones Studio, em Piracicaba, e no Family Mob Studios, em São Paulo. “São quatro músicas novas. Uma delas foi a primeira que fizemos com o Vernizério, já tendendo cada vez mais para o surfão da prancha invertida. A produção foi do eterno quarto elemento do Mullet, o nosso irmão Emiliano Donato. Apesar de ter sido registrado em estúdios diferentes, a master feita no Válvula 9 Studios, em Rio Claro, pelo pata de bode Johnny Cristofoleti, unificou o som”, explica.
Em 2017, o Mullet ainda deve lançar dois splits: o primeiro será dividido com uma banda da Europa e o segundo com três bandas brasileiras. “Na verdade, eu não me amarro muito em disco grande. Curto mais os EPs. Acho complicado demais fazer um discão com várias canções e manter a qualidade de todas elas. Devemos fazer um CD com oito ou nove músicas, mas acho que só no ano que vem”, revela.
Ares europeus
Com a ajuda da Drunkabilly Records, o Mullet vem construindo uma sólida carreira fora do país. Até hoje, a banda já fez três turnês pela Europa, em 2011, 2013 e 2016. No ano passado, porém, a experiência foi ainda mais marcante.
Afinal, a banda foi co-headliner no Surfer Joe Summer Festival, na Itália, que é considerado o maior evento de Surf Music do mundo. “Essa foi a tour mais bruta que nós fizemos por lá, pois muita gente já conhecia a banda. Algumas pessoas chegaram a vir de outros países para nos ver ao vivo. Massa demais! Outra coisa legal foi ver as pessoas com camisetas das nossas turnês anteriores nos shows”, conta.
A saga continuará em junho, quando a banda embarcará para mais uma turnê europeia. “Não estávamos planejando voltar já neste ano para lá. Porém, durante a tour, já começamos a receber vários convites para shows no verão de 2017. Então, resolvemos fazer uma segunda tour divulgando o ‘Surf‘n’Goat’ pela Europa”, revela.
A aventura de organizar o maior festival de Psychobilly do país
Além de assumir as baquetas do The Mullet Monster Mafia e do Sick Sick Sinners, Emiliano também participa há sete anos da organização do Psycho Carnival. “O lance começou depois que eu entrei para o Sinners. O Vlad (guitarrista e vocalista do Sick Sick Sinners) levava o trem nas costas, sozinho. Como eu trabalho com produção, acabou sendo natural entrar para o time. Comecei como gandula, mas hoje já estou como terceiro goleiro. Não é fácil estar ali, empurrando a roda. Normalmente, você está suando enquanto o pessoal está na farra, mas é por isso mesmo que nós fazemos. A satisfação é encontrar os amigos, ver os shows, fomentar a cena e se divertir garantindo a diversão das pessoas”, afirma.
A edição deste ano terá 24 bandas se apresentando durante quatro dias no palco do Jokers. Para Emiliano, além dos shows com suas bandas, esse período também será de muito trabalho. “Para mim, a expectativa é sempre pela festa. Com certeza acontecerão grande shows! Todo ano é assim! A expectativa maior é pelo The Meteors epelo Long Tall Texans, também. Mas estou muito a fim de ver as bandas No Milk Today, Tampa do Caixão, Surf Aliens, Red Lightz Gang, As Diabatz, Billys Bastardos com nova formação, Bad Luck Gamblers, Jinetes, o Mongo que ainda não vi ao vivo… Boto fé que será mais uma edição histórica!”, afirma.
Cultura de resistência
Hoje, a cultura vem sendo deixada cada vez mais de lado pelos governos. Também por causa disso, chegar a 18ª edição de um festival é uma coisa fantástica. Essa longevidade torna ainda maior a importância do Psycho Carnival dentro da cena underground brasileira. “O Psycho Carnival é parte da cultura de resistência, cara! É um evento que se mantém por 17 anos na base do suor e do sangue, literalmente vendendo o almoço pra pagar a janta. O festival existe porque acreditamos em tudo que isso envolve: o segmento, os nossos amigos e o Psychobilly como subcultura dentro da cena ‘alternativa’ que inclui outros estilos e tendências”, afirma.
Lutando contra o pouco apoio das entidades culturais da cidade, o Psycho Carnival é um exercício diário de perseverança para todos que, de uma forma ou de outra, contribuem para que o festival seja realizado. “É sempre uma dificuldade imensa fazer o festival. Já pensamos em parar o barco algumas vezes mas, aí, o que aconteceria com o nosso círculo de amizades, a nossa cultura e os nossos objetivos?”, questiona.
A realização do Psycho Carnival durante quase duas décadas se torna ainda mais impressionante por ser em Curitiba. Afinal, apoio aos artistas e eventos culturais não é o forte da capital paranaense. “A cultura no Brasil sempre foi e continua sendo tratada como algo supérflua. Não se enxerga a cultura como o que, na verdade, ela é: uma extensão da educação. Nós temos a oportunidade de rodar o mundo e ver o quanto isso é importante e fundamental nos países ditos de primeiro mundo, mas aqui tenho a impressão que basta darmos um passo para frente que o magnetismo da imbecilidade nos puxa 30 passos para trás”, compara.
Em 2017, por exemplo, a Oficina de Música de Curitiba foi cancelada em cima da hora, pela primeira vez em 35 anos. A decisão, tomada pelo novo prefeito, Rafael Greca (PMN), desprezou um evento que é reconhecido no Brasil e no mundo.
Para piorar o cenário, esse tipo de atitude parece estar ganhando cada vez mais força entre os políticos do país. “O desprezo com a educação, a falta de zelo com a cultura, o crescimento desenfreado das igrejas que alienam cada vez mais, a máquina de vômito fascista que temos como grande mídia… Com o perdão do termo, isso tudo é uma grande merda e nos coloca cada vez mais como país atrasado e retrógrado, infelizmente. O Brasil é um país incrível, com pessoas amigáveis, comida inigualável, cultura que explode pelos poros, mas estamos amarrados pela falta de educação, discernimento e opinião própria”, avalia.
Na contramão desse “novo mundo”, o Psycho Carnival vem mostrando na prática que é possível fomentar a cultura sem entregar a sua alma aos interesses menores (ou mais lucrativos). “A mídia vende a ideia do sucesso como sendo o que está no topo, o melhor, o vencedor, quando na verdade o vencedor é quem vive feliz! Simples assim! Sendo o mais alto cargo ou o básico e fundamental dentro de uma cadeia de atividades, ninguém é melhor do que ninguém. Eu acredito que, no dia em que ‘nós’, brasileiros, aprendermos a pensar no ‘nós’ antes do ‘eu’, as coisas podem começar a mudar. Até lá, viveremos lutando contra os nossos iguais no nível mais baixo da sociedade enquanto os ‘donos da bola’ se divertem com o jogo. Enquanto isso, a gente segue na guerra levantando a nossa bandeira e lutando, porque quem fica parado é provador de produto ilícito na biqueira!”, finaliza Emiliano.
O The Mullet Monster Mafia se apresenta na terceira noite da 18ª edição do Psycho Carnival, que acontece no domingo (26), no Jokers. As entradas são limitadas e estão à venda no site Sympla. O Jokers Pub fica na Rua São Francisco, 164, no bairro São Francisco. Informações pelo fone (41) 3013-5164.
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