Texto: Marcos Anubis
Revisão: Pri Oliveira
Foto: Reprodução Facebook Krisiun

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O Krisiun tem uma relação muito próxima com a cena metal curitibana. Afinal, desde que a banda foi formada em 1990, na cidade de Porto Alegre, Alex Camargo (baixo e vocal), Moyses Kolesne (guitarra) e Max Kolesne (bateria) construíram uma relação de amizade e respeito com várias bandas e músicos de Curitiba. “São amizades de longa data. Sempre curtimos e respeitamos muito as bandas e a cena metal curitibana. Desde os primeiros shows em Curitiba, a gente já trombava com essa galera e tomava uma cachaça junto. O Metal é uma grande família, um estilo de vida em que construímos amizades para a vida toda”, afirma Max.

Nesta sexta-feira (14), O Krisiun se apresenta no Jokers (com abertura das bandas curitibanas Jailor e Howfar) para lançar o mais novo trabalho do grupo. “Scourge of the Enthroned”, o 11º álbum de estúdio do trio gaúcho, retoma a contundência sonora que sempre foi uma característica muito forte do Krisiun. “É um álbum bruto, veloz, direto, curto e grosso, diferente dos lançamentos anteriores, nos quais exploramos mais variações rítmicas, partes mais lentas e cadenciadas e músicas mais longas. Ele marca uma espécie de volta às nossas raízes. Eu acho que o ‘Scourge of the Enthroned’ representa de verdade a real essência do Krisiun”, explica.

O álbum foi produzido pelo músico, engenheiro de som e produtor musical alemão Andy Classen, que já havia trabalhado com o Krisiun nos álbuns “Conquerors of Armageddon” (2000), “Southern Storm” (2008) e “The Great Execution” (2011). Além da banda brasileira, Classen já produziu CDs de vários grupos, entre eles, “The Last Supper” (1995), do Belphegor; “Genesis” (2002), do Rotting Christ; e “Afterburner” (2006), do Sinister.

Justamente por toda essa bagagem como produtor, Max afirma que Andy teve uma participação fundamental na construção final do álbum. “O Andy se tornou um grande fã da banda. Na visão dele, a música do Krisiun deve soar natural, orgânica, crua, mas limpa e com clareza ao mesmo tempo. Diferentemente da maioria das bandas de hoje em dia, que optam por gravações superdigitais, editadas, manipuladas e que soam bem artificiais, a meu ver. O Andy também opina em certos arranjos. Às vezes, ele pede para diminuirmos e tirarmos algumas partes que se repetem na música, para que fique tudo mais dinâmico e direto. Eu acho muito importante ter um produtor com essa visão, uma pessoa de fora que possa opinar e ajudar nos pequenos detalhes”, explica.

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Entrosamento

Tanto no estúdio como principalmente ao vivo, o Krisiun mostra uma química que é difícil de ser alcançada. Afinal, em qualquer banda, por mais que os integrantes sejam tecnicamente virtuosos, se não houver uma “liga” entre eles o resultado não convencerá.

Obviamente, a estrada proporciona a evolução dessa química, mas o Krisiun carrega mais do que isso na essência da banda. “São muitos anos fazendo shows, ensaiando, gravando juntos, e isso criou essa química muito forte entre nós três. A identidade da banda depende muito dos três elementos. Se tirar qualquer peça não será mais o Krisiun real. Nós sempre buscamos ter uma identidade própria, soar como o Krisiun, mas também acho que o fato de sermos irmãos e termos desde o começo o mesmo ideal e a mesma busca musical fez com que a química surgisse lá atrás, desde a época do ‘Black Force Domain’. Com o tempo, fomos aperfeiçoando”, analisa.

Boa parte dessa química musical acontece porque Moyses, Max e Alex conseguem equilibrar muito bem a técnica com a criatividade. Diante disso, depois de tantos anos, a necessidade de soar mais rápido ou mais pesado deu lugar a um processo mais natural. “Acho que a questão da velocidade e do peso é algo muito natural para o Krisiun, faz parte da nossa essência como músicos. Quando eu escuto qualquer riff de guitarra quando estamos compondo, eu já penso em como o riff soa com o blastbeat (batida metranca), principalmente no disco novo, em que não houve restrições e pudemos exagerar nas metrancas e riffs velozes. Entretanto, certamente nós tivemos o cuidado também na hora de compor os riffs e as linhas vocais inovadoras e também com aquele ‘feeling’ bate cabeça, afinal, a essência do Metal é sempre essa. Não importa o quão veloz ou técnico você toque, se não tiver essa essência será só um amontoado de batidas e riffs, e ninguém vai curtir o som”, diz.

A construção da carreira e a cena metal

Depois do Sepultura, sem dúvida nenhuma o Krisiun é a banda brasileira que mais conseguiu destaque internacional, e isso foi construído com muito trabalho e dedicação. Desde o início, o grupo superou inúmeras barreiras para que, atualmente, ela seja considerada uma das bandas de Death Metal mais importantes do mundo. “A gente sempre se dedicou muito. A banda sempre foi prioridade, e nosso foco sempre foi transformar o Krisiun em uma força real no Death Metal”, relembra.

Logo de cara, o álbum de estreia da banda se tornou a porta de entrada do Krisiun na cena internacional. “De certa forma, tivemos sorte. Nosso primeiro disco teve destaque na época em que saiu. Muitas bandas estavam mudando o som, partindo para algo mais acessível e comercial, e o ‘Black Force Domain’ chegou com muita força. Era um disco muito bruto, cru e veloz, com uma vibe totalmente old school, e ali nós já conseguimos um contrato com uma gravadora gringa e começamos a entrar no circuito de turnês internacionais. É óbvio que existiram altos e baixos ao longo da carreira, mas sempre nos mantivemos lançando discos e fazendo turnês internacionais, e já estamos com a mesma gravadora, a Century Media, há quase 20 anos”, analisa.

Uma das grandes características que o Krisiun sempre demonstrou durante essas quase três décadas de estrada é o respeito aos fãs, um tipo de postura cada vez mais em extinção no atual mundo do “culto ao ego”.

Afinal, manter a sanidade em meio à exposição mundial gigantesca que a banda alcançou, tocando nos grandes festivais e convivendo de igual para igual com os maiores nomes do Heavy Metal do planeta, não é uma tarefa simples. “Na real, quanto mais velhos vamos ficando, mais humildes nós nos tornamos, afinal não somos melhores do que ninguém. O segredo de uma vida com equilíbrio é respeitar a  todos e encarar tudo com certa leveza. Se você se deixar levar pelos caprichos do ego e da arrogância, você se fecha para o mundo e vira uma pessoa frustada, infeliz e amarga. Somos pessoas normais, que tocam e depois do show tomam uma com os fãs em qualquer boteco”, diz.

Essa ascensão do Krisiun, alcançada na base do trabalho e do respeito, é um belo exemplo de como pequenas atitudes constroem uma cena. Curitiba, por exemplo, tem inúmeras bandas excelentes, desde os pioneiros da cidade, como o Infernal, o Metal Pesado e o Epidemic. Mesmo assim, a cidade luta há muitos anos para construir uma cena musical mais forte.

Atualmente, grupos das mais variadas vertentes metálicas, como o Axecuter, o Imperious Malevolence, o Amen Corner, o The Secret Society e o Offal seguem batalhando e produzindo trabalhos de qualidade há muitos anos. Mesmo assim, o público curitibano não compra a ideia da forma que essas bandas merecem, o que faz com que a cena como um todo não se fortaleça.

Com a experiência de quem transita desde os anos 1990 no cenário do Metal internacional, Max identifica vários fatores que fizeram com que as cenas de outros países fossem construídas de forma realmente sólida.

Um dos principais fatores é o apoio que os fãs podem dar às bandas de uma forma muito simples: indo aos shows. “Acho que, hoje em dia, os headbangers precisam desligar o computador, sair de casa,ir mais a shows e apoiar de verdade a cena. Os shows undergrounds sempre têm ingresso barato e, mesmo assim, na maioria das vezes, o público é pequeno, impossibilitando o produtor de realizar o evento em uma boa casa com boa estrutura de som. Existem bandas muito boas no Brasil! Seria legal se em todos os shows o público comparecesse em peso, assim a coisa ficaria mais forte e sólida. Eu conheço uma galera que curte Metal, anda no ‘visu’, mas na hora de ir aos shows sempre tem uma desculpa pra não ir”, opina.

Fanatismo religioso

Hoje, o Brasil vive uma onda muito forte de conservadorismo, inclusive no cenário do Metal. Nas últimas eleições, inclusive, o guitarrista Moyses Kolesne se posicionou claramente e de maneira bem forte nas redes sociais contra esse tipo de situação.

Na visão de Max, o conservadorismo não combina de forma nenhuma com o Heavy Metal. “Cara, conservadorismo, preconceito, fascismo, religião e todo tipo de lixo relacionado a essas coisas jamais terão espaço no Metal”, afirma. “O Metal sempre foi rebeldia e luta contra o sistema, preconceito, tirania, ditadura, religiosos e todo esse tipo de lixo. É muito contraditório ver um fã de Black/Death/Thrash Metal, por exemplo, apoiando fundametalistas religiosos, conservadores ou fascistas. Acho que essa galera tem medo de enfrentar o sistema e quer viver suas vidinhas no conforto de suas casas sem ver a realidade, sem se preocupar com os que não tiveram privilégio algum e vivem à margem da sociedade”, complementa.

Max sabe muito bem do que está falando porque a banda já enfrentou alguns episódios de fanatismo religioso fora do Brasil. Um deles aconteceu em Bangladesh, no ano passado, quando o Krisiun e o NervoChaos foram detidos no Aeroporto Internacional Hazrat Shahjala, em Daca, sob a alegação de serem bandas “satânicas”. As motivações das autoridades locais foram claramente religiosas, pois a maioria da população de Bangladesh é islâmica.

Na ocasião, os músicos foram abordados pela polícia no momento em que estavam retirando as bagagens no aeroporto, tiveram os passaportes retidos e ficaram no local por mais de oito horas. Após entrarem em contato com o embaixador Maximiliano Arienzo, do consulado brasileiro na cidade, os grupos seguiram para um hotel, mas sem autorização para deixarem o país.

Obviamente, o show foi cancelado e a banda só pôde sair de Bangladesh no outro dia. Por causa do incidente, as apresentações daquela turnê, que seriam realizadas na Mongolia, na China, no Vietnam e na Malásia, também foram suspensas.

Diante de tudo isso, Max acredita, inclusive, que o cenário cultural no Brasil pode enfrentar algo parecido com o que as bandas extremas vivenciam em outros países. “Com certeza nós tememos porque isso é muito fácil de acontecer. Na Russia, por exemplo, bandas como o Cannibal Corpse e o Behemoth foram banidas e tudo por conta dos fundamentalistas religiosos. Essa raça já está querendo transformar o Brasil em um país cristão evangélico. Esse projetinho de Hitler que o povo elegeu como presidente já fez declarações absurdas dizendo que as minorias devem se curvar diante da maioria, que não somos estado laico e sim cristão, que mulher deve ganhar menos, que afrodescendente é pesado em arrobas e que ‘viadinho’ se resolve na porrada. E ainda homenageia torturador e nazista. Como pode um país como o Brasil, o país da miscigenação, da diversidade cultural, apoiar esse tipo de lixo?”, questiona.

No show em Curitiba, além das novas canções, o grupo obviamente também tocará os grandes clássicos do Krisiun. Nitidamente, Max, Moyses e Alex estão ansiosos para voltar à cidade que, entre tantas outras ao redor do mundo, o trio sente-se  mais em casa. “Todos os shows em Curitiba sempre foram muito foda, não me lembro de nenhum que não tenha sido legal. Faremos um show muito bruto e pesado, com músicas desde o ‘Black Force Domain’ ao mais recente trabalho, ‘Scourge of the Enthroned’. Nós nos vemos na sexta, irmãos e irmãs do Metal de Curitiba! Vamos curtir uma noite de puro Metal, muita cerveja e irmandade”, finaliza Max Kolesne.

Serviço

Os ingressos para a apresentação desta sexta-feira (14) no Jokers estão no segundo lote e custam R$ 120 (inteira) e R$ 60 (meia/promocional). Na hora do show, os ingressos custarão R$ 140 (inteira) e R$ 70 (meia/promocional). Os bilhetes podem ser adquiridos no site Sympla, no Jokers Pub e nas lojas Dr. Rock (Rua Emiliano Perneta, 297, loja 4, Shopping Metropolitan, fone 3024-0669), Túnel do Rock (Rua XV de Novembro, 74, Centro, fone 3322-4077), Let’s Rock (Praça Tiradentes, 106, loja 3, Centro, fone 3324-2676) e Metal Mania (Rua Izaac Ferreira da Cruz, 3018, Sítio Cercado, fone 3076-4666).

A meia-entrada é válida para estudantes, pessoas acima de 60 anos, professores, doadores de sangue e portadores de necessidades especiais (PNE) e de câncer. Todas as pessoas que doarem 1kg de alimento não perecível na entrada do evento também terão direito a meia-entrada. É obrigatória a apresentação de documento previsto em lei que comprove a condição do beneficiário na compra do ingresso e na entrada do local da apresentação.

A casa abre às 20h e os shows começam às 22h30. O Jokers fica na Rua São Francisco, 164, no Centro.