Texto: Marcos Anubis
Fotos: Camila Kovalczyk
Expor o lado podre do homem, sua decrépita sociedade e sua inútil existência. É essa linha que o duo curitibano Decadência procura seguir. Nesse domingo (9) no Manifesto Café, após quatro anos de batalha, Gustavo Toscan (acordeon e vocal) e Nélio Gomes (bateria) lançaram o primeiro registro oficial do duo.
O EP “Início do Fim” (gravado no Estrondo Studios, em Campo Largo, com produção de “Preto” Fabricio) reúne três faixas que retratam muito bem a pegada Folk/Metal/Punk da dupla: “Início do fim”, “Decadência” e “Homem lobo do homem”. Inicialmente, o EP está disponível em material físico, mas também será disponibilizado nas plataformas digitais em breve.
“Início do Fim” não é o primeiro lançamento do Decadência porque, anteriormente, eles já tinham gravado a demo “Vamos Todos Para o Inferno” (2018). Mesmo assim, Gustavo e Nélio consideram que o EP é o debut oficial da dupla. “A gente já tinha umas 15 músicas autorais, então ele é um trabalho tardio. Dividir os valores de gravação somente em dois músicos sempre fica mais pesado. Gravar não é fácil e nem barato, mas isso dá um valor ainda maior para o trabalho, pelo menos pra gente. As pessoas compram o CD pronto, mas todo trabalho que a gente teve está bem refletido nessas três músicas do EP”, diz Gustavo Toscan.
Musicalmente, o som do Decadência chama muito a atenção, principalmente pela formação inusitada. Na prática, enquanto Gustavo faz a linha melódica das músicas no acordeon, Nélio cria os ritmos de maneira técnica, mas ao mesmo tempo minimalista. A união de dois instrumentistas com estilos tão extremos gera uma obra igualmente extrema e original. A dupla abriu o show com as três músicas que fazem parte do EP, seguidas por “Abismo” e “Lixo”.
Além da gravação das músicas, o duo curitibano também procurou incluir outros atrativos no EP. “Nós optamos por fazer uma coisa diferente porque hoje o CD está perdendo força. Então, criamos um encarte que, na verdade, é um fanzine de dez páginas que conta a história da banda, o processo de gravação do EP e também fala sobre as nossas visões ideológicas. Além disso, o zine também tem um álbum de figurinhas que nós vendemos nos shows”, explica.
Após “Lixo”, Nélio passou as baquetas para Mateus Pedroso, que está assumindo a bateria do Decadência. Com ele, o duo iniciou a segunda parte do show com a pesadíssima “O silêncio também mata”.
Contestação
Liricamente, o Decadência procura falar sobre o cotidiano dos brasileiros de maneira direta, sem meias palavras. Entretanto, a mensagem das canções também ressalta a necessidade de não se entregar às dificuldades. “Nós retratamos a realidade nas nossas músicas, mas isso não quer dizer que precisamos nos submeter a elas. O auto-conhecimento e o fato da gente saber para onde está caminhando são os primeiros passos para fazer algo que vá contra tudo isso”, diz. “As músicas falam muito sobre a degradação da natureza humana, em como a sociedade se tornou individualista e só pensa no dinheiro e no lucro. Esse capitalismo massificado está em todas as esferas e a gente percebe que ele está levando os seres humanos ao início do fim. Parece que nós estamos em um ponto no qual só dá pra ver como isso vai piorar”, complementa.
Porém, a intenção do Decadência é ir além do simples discurso. Como prova disso, no show de lançamento do EP, o duo arrecadou doações que serão encaminhadas para a comunidade do Caximba, que foi duramente atingida pelas chuvas do início deste mês, em Curitiba. “A gente quer transformar as nossas letras e as nossas ideias em ações diretas. Procuramos maneiras de saber como a nossa banda pode servir aos propósitos que nós temos como ideais. Se a gente fala mal do governo e das pessoas, de que forma nós podemos não ser como eles? Nós estamos no palco, o que já é um puta trabalho, mas sempre podemos fazer um pouco mais”, diz.
Obviamente, diante de uma sociedade brasileira polarizada, o trabalho de Gustavo e Nélio é recebido de diversas maneiras diferentes. “Quando a gente começou, as pessoas torciam muito o nariz. Nós tocávamos mais com bandas de Metal e essa galera não é tão libertária quanto a gente pensava que fosse. O vídeo que a gente fez no estúdio Tenda nos ajudou muito, assim como o convite para tocar no Maniacs Metal Meeting lá em Rio Negrinho, que foi sensacional!”, explica.
Na visão do duo, o ponto de virada aconteceu no início deste ano durante a participação no festival Pinhão Profano. “Ali nós começamos a ver o público que nós estávamos formando e percebemos que existe uma galera que curte essa mistura que a gente faz. Agora as pessoas estão começando a entender porque a nossa própria formação, sem baixo/bateria/vocal, desvirtua tudo que se faz no Metal”, conta. “Depois que nós descobrimos que não era preciso se restringir ao Metal, nós também começamos a fazer versões de músicas regionais brasileiras que também tem a ver com a nossa questão ideológica, e começamos a tocar com bandas de Psychobilly e de outros estilos”, finaliza Gustavo Toscan.
A parte final do show teve duas versões bem interessantes para canções imortais de dois ícones da MPB: “Canto das três raças”, de Clara Nunes, e “Asa Branca”, de Luiz Gonzaga. “Trabalhar liberta” encerrou a apresentação. Confira dois vídeos do show do Decadência no Manifesto Café: “Abismo” e “Trabalhar liberta”.
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