O grupo estreou a nova turnê com uma apresentação especial no Teatro Guaíra
Obviamente, ter a oportunidade de tocar ao lado de um dos grandes nomes da história do Rock é um privilégio que poucos músicos conseguem receber. Desse ponto de vista, Rodrigo Santos (ex-Barão vermelho) e o baterista do trio Os Paralamas do Sucesso, João Barone, estão vivenciando uma experiência única ao lado do guitarrista do The Police, Andy Summers.
O trio, batizado de Call The Police, nasceu em 2017, quando Rodrigo e Summers convidaram Barone para fechar a formação do grupo, que nasceu como um tributo ao lendário The Police, mas com a essencial presença de um dos integrantes originais do grupo inglês.
Entretanto, para o grande Andy Summers, essa máxima também vale, afinal, Rodrigo e Barone são dois dos melhores músicos do Brasil e fazem parte da rica história do Rock nacional desde o início dos anos 1980. Ou seja, a união desse trio de feras não tinha como dar errado.
Nessa quinta-feira (2), o Call The Police deu início a uma nova turnê, batizada de “The Police Greatest Hits!”, com um show no Teatro Guaíra, em Curitiba. A realização foi da Mosh Productions.
Clássico eternos
A banda abriu o show com “Syncronicity II”, faixa que faz parte do último álbum de estúdio lançado pelo The Police, “Syncronicity” (1983).
É claro que o repertório do show é composto pelos clássicos do trio inglês, como “Walking on the moon” e “Roxane”. Entretanto, Rodrigo, Barone e Andy também tiveram a sensibilidade de incluir duas canções que fazem parte da lista de “lados B” do The Police: “Tea in Sahara” e “Drive to tears”.
Durante a apresentação, apesar de ter uma personalidade mais introspectiva, Andy fez questão de conversar com o público, em uma atitude muito simpática.
Além disso, em vários momentos do show, Rodrigo caminhou até Andy e se abaixou perante o guitarrista, como se estivesse fazendo uma reverência ao companheiro/ídolo.
É claro que o respeito à Summers sempre está presente, mas na verdade, essa é a senha para o guitarrista improvisar e, literalmente, curtir o show. “No Police, ele quase não solava, mas com a gente, desde a primeira turnê, eu me ajoelho e falo: ‘não vou sair daqui’! (risos)”, contou Rodrigo Santos em uma entrevista exclusiva para o Cwb Live, concedida no camarim do Teatro Guaíra após o show.
É claro que o momento mais emocionante da apresentação foi quando a banda tocou “Every breath you take” e todo o público que estava no Guaíra acendeu as luzes dos celulares e cantou junto com Rodrigo.
O curioso é que, no Brasil, a canção, lançada em 1983 no disco derradeiro do Police, se tornou uma “música de amor”. Porém, Sting já deu algumas declarações explicando que a letra, na verdade, fala de um homem possessivo e ciumento.
Naquele ano, na votação do prêmio Grammy Awards, “Every breath you take” recebeu o título de melhor canção.
Um dos últimos guitar heroes
A ideia mais comum que as pessoas têm em relação a um guitar hero é a de um músico virtuoso, que une técnica e velocidade em versões astronômicas.
Andy Summers se enquadra em outra vertente nessa categoria, pois usa a técnica de uma maneira melódica para construir sequências de acordes belíssimas, com linhas de solo muito pontuais.
Foi dessa maneira que ele trilhou uma trajetória marcante ao lado dos companheiros do The Police, Sting (baixo e vocal) e Stewart Copeland (bateria).
Desde a estreia com “Outlandos d’Amour” (1978) até o ultimo álbum de estúdio, Synchronicity (1983), Andy encantou os fãs com o timbre de guitarra limpo e envolvente de canções como “King of pain” e a belíssima “Wrapped around your finger”.
Justamente por causa dessa marca pessoal, Andy chama a atenção até de fãs de outros estilos musicais bem mais extremos, que não têm nada a ver com a mistura de Rock, Pop, Jazz e Reggae que consagrou o grupo inglês.
É o caso do músico e produtor musical curitibano Tersis Zonato, que já fez parte de inúmeras bandas undergrounds importantes na cena musical da capital paranaense, entre elas, o Archityrants (Heavy Doom Metal) e o Axecuter (Heavy Metal).
Apesar de navegar mais frequentemente em outras águas, Tersis acompanha o trabalho do The Police e de Sting desde a adolescência e conhece bem a obra dos ingleses.
Por isso, ele assistiu ao show com um olhar atento às particularidades das gravações originais de cada música.
Tersis, que hoje faz parte do Offal(banda de Old School Death Metal) e tem um projeto de Black Metal chamado Lutemkrat, colocou Andy Summers no olho do furacão e por um motivo bem interessante: apesar de ser uma gigantesca influência para muitos guitarristas que vieram depois dele, o músico inglês sempre fez questão de não encarnar o estereótipo tradicional do guitar hero. “Ele faz solos bem musicais, sem ficar ‘fritando’ os dedos. Ele toca o que a música pede”, analisa Tersis.
Essa, realmente, talvez seja a maior característica do guitarrista inglês e fez com que ele influenciasse praticamente toda a geração de bandas e artistas que surgiu nos anos 1980 no Brasil.
Basta prestar atenção na maneira de tocar de Dado Villa-Lobos (Legião Urbana), Herbert Vianna (Os Paralamas do Sucesso), Eduardo Amarante (Zero) e José Flores (Finis Africae).
Em maior ou menor grau, todos esses músicos beberam na fonte de Andy Summers. Ou seja, indiretamente, ele ajudou a geração 80 a construir as bases do Rock brasileiro.
Uma das melhores cozinhas do mundo
É muito comum que os fãs olhem com muito mais atenção para o guitarrista e o vocalista da maioria das bandas. Não há como negar que eles se destacam porque estão na linha de frente do que é apresentado no palco.
Porém, é preciso reconhecer que a química entre baixo e bateria é primordial para a musicalidade de qualquer grupo.
Partindo dessa perspectiva, a regulagem do som da bateria de Barone com o baixo de Rodrigo durante o show no Guaíra foi quase perfeita.
Da plateia, dava para ouvir e sentir os graves dos dois instrumentos e era em cima dessa base que Andy fazia os acordes e solos para criar uma atmosfera especial para cada música.
Entretanto, na verdade, essa realidade acabou sendo ainda melhor do que a banda esperava, pois o tempo de preparação para o início da turnê, em Curitiba, foi mínimo. “Nós fizemos apenas três ensaios juntos! O último deles, na quarta-feira, foi tão bom que, no final, o Andy gritou: ‘a banda está de volta’!”, revelou Rodrigo Santos.
Aliás, nesses ensaios, o trabalho vocal do Call The Police talvez seja a parte que mais exigiu cuidado. Afinal, as músicas do The Police são cantadas em tons que demandam muito esforço e preparação. “Eu sabia que o Rodrigo é um bom músico, mas fiquei surpreso ao vê-lo alcançar as notas altas do Sting e sem falsete”, elogia Tersis.
Para fechar a visão crítica do músico curitibano, Tersis voltou a alça de mira para João Barone, que também chamou atenção não só pela técnica, mas também pela capacidade de tocar as levadas de bateria de maneira fiel, mas com uma identidade própria. “O que eu mais gosto no The Police são as linhas de bateria, que são técnicas e criativas. A ‘Walking on the moon’, por exemplo, tem uma levada muito característica e o Barone fez todas as nuances que ela tem. Porém, apesar de tocar de uma maneira muito próxima, ele não fez uma cópia. O Barone colocou o jeito dele de tocar e isso deixou a música bem natural”, diz Tersis.
Um legado gigantesco, mas que poderia ter sido ainda maior
O The Police é uma daquelas bandas para as quais você olha e tem certeza de que ela poderia ter durado muito mais, pois os três integrantes tinham talento e criatividade para criar coisas ainda melhores.
Entretanto, em 1983, após vários atritos, Copeland e Summers perceberam que Sting estava decidido a seguir em carreira solo e isso deu fim ao grupo. Nos anos seguintes, a banda se reuniu somente em algumas ocasiões especiais (a última foi em 2007/2008, quando eles fizeram uma turnê que chegou, inclusive, a passar pelo Brasil).
Porém, era nítido que aquele clima de diversão no palco não era mais o mesmo dos anos 1980 e, em 2008, eles se separaram novamente.
Depois do The Police, apesar de ter construído uma trajetória vitoriosa e repleta de sucessos, Sting nunca mais conseguiu encontrar, na relação com outros músicos, uma sinergia tão perfeita quanto a que ele tinha com Andy e Copeland.
O The Clash é outro grande exemplo que só ratifica que esse tipo de química que existia no The Police não é encontrada com facilidade. Afinal, as sucessivas mudanças na formação (a principal foi a expulsão do guitarrista e vocalista Mick Jones, em 1983) dinamitaram uma das bandas mais impressionantes da história do Rock.
Depois de “Message in a bottle”, o Call The Police saiu rapidamente do palco, voltando para encerrar o show com “So lonely” e “Every little thing she does is magic”. A banda foi para os camarins ainda ouvindo os fãs aplaudindo em pé, o que mostrava a aprovação do público em relação ao que foi apresentado no Guaíra.
O carinho dos fãs claramente é uma afirmação que o tributo de Andy, Rodrigo e Barone ao The Police é sincero, respeitoso e honesto. Diferentemente de muitas bandas que se apoiam na história de algum grupo famoso, fica claro que o Call The Police está prestando reverência a Andy e a banda da qual ele fez parte.
Além disso, criar uma banda tributo a algum artista ou grupo é uma coisa muito complicada, pois as comparações são inevitáveis e, em muitas ocasiões, cruéis. Entretanto, apesar de caminhar por esse terreno perigoso, o Call The Police consegue passar com honras por esse teste.
Quem sabe, o trio esteja quase pronto para dar um passo além e se arriscar a trabalhar em um material autoral. Afinal, se isso depender apenas de química e de talento, eles têm de sobra.
Assista ao vídeo de “Message in a bottle”, gravada ao vivo no show do Call The Police no Teatro Guaíra. Confira também a entrevista exclusiva que Rodrigo Santos concedeu ao Cwb Live, logo após a apresentação, e veja o nosso álbum de fotos.
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