Texto: Marcos Anubis
Foto: Reprodução Gracey/Morgue File
Você lembra quando foi a última vez que ligou a TV e viu artistas do porte de Chico Buarque, Djavan ou João Bosco, desfilando seus talentos na telinha? Ou ligou o rádio do seu carro e ouviu os acordes mágicos de “Little Wing”, do imortal Jimi Hendrix, ou “Kashmir”, do Led Zeppelin? Em um mundo cada vez mais conectado, onde o acesso à informação depende apenas de um clique, é impressionante que boa parte das pessoas simplesmente não conheça a obra de grandes mestres da história da música. Estaria a cultura musical brasileira em um processo de decadência, sem volta?
Money for Nothing
O Escritório Central de Arrecadação e Distribuição dos direitos autorais das músicas tocadas em público (Ecad), divulgou no mês passado a prévia do ranking das canções mais executadas em 2013 nas rádios AM e FM. Os números se baseiam no período entre janeiro e setembro do ano passado.
De acordo com o estudo, as músicas mais tocadas nas emissoras nacionais foram: “93 Million Miles” de Jason Mraz, “Don’t You Worry Child” do trio sueco de música eletrônica Swedish House Mafia, “Esse Cara Sou Eu” do cantor Roberto Carlos e “Vidro Fumê” da dupla sertaneja Bruno e Marrone. Esses números refletem um cenário cada vez mais descartável, onde artistas aparecem e somem com a mesma velocidade.
“No futuro todos terão os seus quinze minutos de fama”, Andy Warhol
A falta de respeito e de interesse da máquina midiática brasileira para com os seus ídolos se torna cada vez mais evidente e forte. Enquanto os grandes nomes da música nacional são renegados ao limbo, “artistas” do porte de Naldo, Thiaguinho, Anitta e Cláudia Leitte são exaustivamente expostos nas TVs, rádios e jornais do país.
A “qualidade” desses cantores os credencia a estarem tão em evidência? Talvez existam outros motivos. O “jabá”, prática de comprar o espaço para um artista na mídia, nunca foi novidade para ninguém em nenhuma parte do mundo. Esse tipo de artimanha é um artifício antigo. “Sempre foi assim. Na maioria das rádios só tocam os esquemas. O jabá foi instituído em Curitiba na metade dos anos 90”, conta o jornalista Fernando Tupan, ex-programador musical da mais emblemática emissora da história da radiofonia curitibana, a Estação Primeira, que encerrou suas atividades em 1995.
Mas até que ponto a parte comercial de um veículo pode influenciar em sua programação? Juliana Erthal foi locutora da rádio 91 Rock, onde apresentava o programa diário Social Rock. Na sua visão, a busca das emissoras por audiência e a falta de discernimento musical do público são dois fatores primordiais nesse contexto. “No quesito propaganda, é inquestionável que os anunciantes buscarão a mídia com maior audiência. A audiência quem faz é o povo. Diante deste panorama, percebemos uma massificação de uma cultura pobre, difundida pela televisão que, de uma forma geral, salvo alguns programas que despertam o senso crítico, emburrece e forma rebanhos, gente sem opinião”, analisa.
A era da internet
As novas tecnologias mudaram a forma de o ouvinte consumir e ouvir música. Hoje, por conta dos home studios, gravar um CD se tornou acessível a praticamente qualquer pessoa. Uma vez gravadas, as canções podem ser expostas na internet sem custo algum, alcançando milhões de pessoas no mundo todo.
Se essa evolução ocorreu no sentido tecnológico, não se pode dizer o mesmo da parte humana desse processo. “O ouvinte migrou para a internet. Hoje só se ouve rádio no carro, e olha lá. Meus filhos são um exemplo, só internet com o Youtube, Soundcloud, Myspace e Vimeo. A incompetência da maioria dos programadores espantou os ouvintes”, critica Tupan.
As próprias gravadoras e artistas ainda não encontraram o timing dessa nova realidade. O professor de webdesign Docca Soares acredita que são vários os motivos que levaram a esse cenário. “Em primeiro lugar eu citaria a inabilidade das gravadoras e assessorias de lidar com o avanço das novas mídias, as facilidades tecnológicas que fazem com que artistas menores e independentes possam produzir seus trabalhos, além do consequente avanço da pirataria”, diz.
A grande mídia, percebendo que o público está cada vez mais “sugestionável”, alimenta sua programação com artistas e programas descartáveis. “Some-se a isso um forte mercado de subcelebridades e modismos arrebatadores que tomaram conta da mídia nos últimos anos. A promoção cada vez maior de desconhecidos sem talento via reality shows, videologs e redes sociais ajudou a desviar o foco de artistas consagrados, uma vez que a novidade representada por estes ‘artistas’ gera uma grande audiência e sua promoção é relativamente barata”, acredita Docca.
Existe luz no fim do túnel? A teoria da indústria cultural pregada pelos pensadores Adorno e Horkheimer, que diz que toda forma de arte se torna mercadoria, é inevitável e eliminará da mídia qualquer vestígio de boa música? “Estamos vivendo a era do retrocesso cultural. A maioria não quer pensar. Perderam a vontade de reflexão. O povo está complacente diante de um contexto nada ideológico em que estamos submersos”, finaliza Juliana.
Vivemos uma nova realidade, que vem se consolidando desde os anos 1990, onde a quantidade de bandas tem se tornado inversamente proporcional à qualidade das mesmas. As opções para mudar esse cenário existem. Cabe aos ouvintes, como consumidores de música, decidirem.
Olá!
Será que vc poderia me ajudar? Estou elaborando meu TCC livro reportagem sobre cantores desaparecidos da mídia. Achei seu artigo pesquisando algo sobre meu tema e estou com dificuldades para dar continuidade. Deixo meu contato. Obrigada
Mariana, é claro que sim. Entre em contato pelo e-mail anubiscwblive@gmail.com.