Além de lançar o álbum “The Mandrake Project”, o vocalista do Iron Maiden também teve uma passagem repleta de compromissos na capital paranaense

Quando Bruce Dickinson voltou ao Iron Maiden, em 1999, a sensação dos fãs e da crítica era a de que ele ainda tinha muito a mostrar no trabalho solo. Afinal, o vocalista tinha acabado de lançar, sem nenhum exagero, um dos melhores álbuns da história do Heavy Metal, o magnífico “The Chemical Wedding” (1998).

Por todo esse contexto, o show dessa quarta-feira (24), na Live Curitiba, foi uma espécie de retomada de um trabalho que foi interrompido há 26 anos (em 2005, Bruce lançou o álbum “Tyranny of Souls”, mas não organizou sequer uma tour para divulgar esse CD).

Com a Live Curitiba praticamente lotada, Bruce abriu o show com “Accident of birth”, faixa-título do álbum homônimo lançado em 1997.

Acompanhado por Philip Näslund e Chris Declercq (guitarras), Tanya O’Callaghan (baixo e backing vocals), Maestro Mistheria (teclado), e Dave Moreno (bateria), Bruce incluiu 16 canções no setlist, contemplando quase todos os sete álbuns solo que ele lançou até hoje. Entre elas, “Laughing in the hiding bush”, “Gods of war”, e “Abduction”.

Uma ausência fortemente sentida no palco foi a do produtor e guitarrista Roy Z., que é o grande parceiro de Bruce na trajetória solo, mas que não participa dessa turnê por causa de “motivos pessoais”.

Um dos pontos altos do show foi, obviamente, “Tears of the dragon”, cantada por todo o público na Live. Foi essa música, do álbum “Balls to Picasso” (1994), que chamou a atenção do mundo para o trabalho solo do, até então, “ex-vocalista do Iron Maiden”, e virou um grande hit nas rádios alternativas do Brasil.

A primeira faixa de “The Mandrake Project” a ser apresentada no show foi “Afterglow of Ragnarok”, que funcionou muito bem ao vivo.

Surpreendentemente, boa parte do público já sabia cantar a música, o que não é algo muito comum de acontecer quando se trata de um álbum que acabou de ser lançado.

As outras canções do novo CD que fizeram parte do setlist foram “Rain on the graves”, “Many doors to hell”, e “Ressurrection men”.




A leveza de estar no palco apresentando as próprias canções

Durante o show, ficou muito claro que Bruce se sente muito mais a vontade quando está em turnê solo. Provavelmente, isso acontece porque, no Iron, toda e qualquer canção que apareça na banda é “ironmaidenzada” (perdão pela licença poética) por Steve Harris, ou seja, adaptada para o estilo que a banda defende há quase meio século.

No trabalho solo, Dickinson explora outras opções além do tradicional peso do Heavy Metal, criando climas bem característicos e com a permissão de ousar.

Na Live, uma das grandes provas dessa leveza aconteceu nos solos das músicas, que não ficaram restritos aos dois guitarristas.

Em diversos momentos, foi Mistheria quem tomou a frente com um teclado Keytar, sem nenhuma cerimônia. Aliás, ele e o baterista Dave Moreno são velhos conhecidos de Bruce, pois fizeram parte da banda que gravou o álbum “Tyranny of Souls”.

Aproveitando que está no Brasil (apesar de Curitiba não ser exatamente a terra do Samba), Bruce até arriscou uma batucada a la Sepultura na instrumental “Frankenstein”, um cover do Edgar Winter Group, na qual toda a banda improvisou livremente.

Obviamente, cada fã que esteve presente na Live sentiu falta de uma canção específica durante o show. Ficaram de fora, por exemplo, “Jerusalem”, “Machine men”, “Inertia”, “Road to hell”, “Tattooed millionaire”, “Gates of Uryzen”, e “Tyranny of souls”.

Porém, com um repertório tão extenso para escolher, é claro que não seria fácil agradar plenamente a todos. As próprias canções do Iron, diferentemente dos outros shows que o vocalista fez na capital paranaense, não foram sequer cogitadas.

Na trajetória solo, Bruce se apresentou em Curitiba em outras três ocasiões. A primeira foi em 1996, no Marumby Expo Center, em um festival que ainda teve a presença de Ronnie James Dio e da banda do baterista Jason Bonham, filho de John Bonham.

Nessa estreia em terras curitibanas, Bruce fez a alegria dos fãs do Maiden cantando “Powerslave”, “The prisoner”, “Run to the hills” e “2 minutes to midnight”.

Em 1999, Dickinson voltou a Curitiba, daquela vez, com a turnê do aclamado “The Chemical Wedding”. O show aconteceu na Forum, que ficava localizada no mesmo local da Live. Nesse show, Bruce foi mais contido e só incluiu “Powerslave” e “2 minutes to midnight” no setlist.

A mais recente passagem de Bruce por Curitiba foi no ano passado, no show “Concerto For Group And Orchestra”, em homenagem ao tecladista Jon Lord, no Teatro Positivo. Naquela ocasião, além dos clássicos do Deep Purple, ele também cantou “Tears of the dragon” e “Jerusalem”.




Cidadão curitibano

A agenda de Bruce Dickinson na capital paranaense não se resumiu somente ao show na Live. Na terça-feira (23), ele participou de um duelo de esgrima com atletas paranaenses e comandou o lançamento da cerveja oficial da turnê The Mandrake Project, a Mandrake Jambu Ale, na Cervejaria Bodebrown.

Para encerrar os compromissos, Bruce ainda recebeu o título de “cidadão honorário de Curitiba”, concedido pela Câmara Municipal de Curitiba (CMC) a pessoas que não nasceram na cidade, mas contribuem de alguma maneira para o desenvolvimento e bem-estar coletivo do município.

Com tantas homenagens, Bruce se sentiu tão em casa que, durante o show, ele se dirigiu ao público chamando os fãs curitibanos de “cidadãos de Curitiba”.

Já podemos até imaginar, daqui a alguns anos, um Bruce Dickinson aposentado (se é que algum dia isso vai acontecer), passeando na feirinha do Largo da Ordem em uma manhã cinzenta de domingo, tipicamente curitibana, cantando “Tears of the dragon” em parceria com o lendário Plá ou, quem sabe, até vendendo pessoalmente as cervejas da Bodebrown.

Brincadeiras à parte, poucos artistas demonstram tanto carinho e conexão com a capital paranaense, e isso justifica todas as homenagens e o respeito demonstrado pelos curitibanos, inclusive, dos que não acompanham de perto o mundo do Heavy Metal.

Outro grande momento da apresentação foi “The alchemist”, uma das melhores e mais misteriosas faixas de “The Chemical Wedding”, álbum que é inspirado fortemente no ocultismo e nos textos do poeta e escritor inglês William Blake. “Dragão de quatro cabeças, para as quatro escalas do fogo. Purificar a loucura traz sempre a melhor solução. Tragam-me todos os elementos, esparramem ao redor da minha cabeça. Tragam para mim os corpos dos homens loucos, eu quebrarei todos eles como um pedaço de pão”, diz a letra.

O final da canção, na qual Bruce repete o refrão da música “The chemical wedding”, foi entoado pelo público de uma maneira tão forte que emocionou até o próprio vocalista.

Depois de “Darkside of Aquarius”, todos os músicos se retiraram do palco para fazer aquele suspense característico e criar um clima para o grand finale.

Na volta para o bis, Bruce trouxe uma Mandrake Jambu Ale, disse que não costumava beber no palco, mas acabou dando um gole na cerveja criada pela Bodebrown especialmente para a tour.

Em seguida, ele presenteou o público curitibano com uma pérola ao cantar, pela primeira vez, no Brasil, a belíssima “Navigate the seas of the Sun”.

A explicação é simples: quando essa música foi lançada no álbum “Tyranny of Souls” (2005), Bruce já estava de volta ao Iron Maiden, ou seja, não era possível fazer uma turnê para divulgar o CD.

Depois, a banda encerrou o show com “Book of thel” e “The tower”, mais duas faixas de “The Chemical Wedding”. No final, antes de tirar a tradicional foto, Bruce agradeceu os fãs e disse que teve mais uma noite mágica em Curitiba.

Aos 65 anos de idade (e depois de passar a vida toda em turnês ao redor do mundo) Dickinson não “mendigou” nenhuma nota dos vocais. Em todas as músicas, ele cantou no tom original, sem o auxílio de Auto-Tunes ou qualquer outro subterfúgio tecnológico.

É preciso ter em mente que 90% do setlist do show da turnê “The Mandrake Project” é composto por músicas que foram gravadas há 20 ou 30 anos, quando a voz de Bruce tinha “três décadas a menos de uso”.

Quantos vocalistas na história do Rock/Heavy Metal conseguiram manter esse nível de qualidade vocal durante tanto tempo? Talvez, em uma análise rápida, só Ronnie James Dio teve essa sorte.

Ou seja, diante das inúmeras perdas irreparáveis que aconteceram no mundo da música nos últimos anos, é mais do que evidente que todo fã, de qualquer estilo musical, precisa seguir uma regra clara: nunca perca uma oportunidade de ver os gigantes enquanto eles ainda caminham entre nós!

Assista aos vídeos de “Navigate the seas of the Sun” e “The alchemist”, gravados ao vivo no show de Bruce Dickinson na Live Curitiba.

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