Texto: Marcos Anubis
Fotos: Reprodução/Sites Edgard Scandurra e NANE
Existem artistas que são verdadeiras instituições da música nacional, pela qualidade do seu trabalho e pelo que representam na construção do que hoje é chamado de rock brasileiro. O guitarrista Edgard Scandurra faz parte desse seleto grupo.
Dono de uma técnica única, o músico integrou uma das mais importantes e criativas bandas tupiniquins, o Ira!. Edgard, gentilmente, concedeu uma entrevista exclusiva ao Cwb Live falando, entre outros assuntos, sobre a reaproximação com o cantor Nasi e uma possível volta do Ira!.
Dias de luta
Em 2007 o Ira! chegava ao fim de uma forma totalmente inesperada, após 27 anos de história. Diante de desavenças entre os músicos, tentativa de interdição e brigas com o empresário da banda, a relação entre Edgard e Nasi, vocalista do grupo, chegou a um ponto de ruptura quase definitivo.
Os dois velhos amigos, que construíram uma parceria de músicas e letras que gerou grandes clássicos do rock nacional, como “Receita para se fazer um herói” e “Rubro-Zorro”, só voltaram a se reaproximar no começo deste ano. “Desde 2007 eu não falava com o Nasi e, em maio passado, fiquei sabendo que ele gostaria de conversar comigo. Disse que não haveria problema e ele me ligou”, conta Scandurra.
Uma ação filantrópica de Edgard acabou servindo de ponte para o reencontro dos dois parceiros. O guitarrista estava desenvolvendo um projeto de um show beneficente visando arrecadar fundos para a NANE, uma escola sediada em São Paulo que cuida de crianças com dificuldades diversas de aprendizagem. “Quando ele me ligou, se oferecendo para participar desse show, eu achei que seria uma oportunidade única para os fãs matarem a saudade do Ira! e também para eu e o Nasi terminarmos aquela coisa deprê de inimizade perpétua”, revela.
O reencontro no palco já tem data marcada. Será no próximo dia 30 de outubro, às 19h, no Traffô Espaço de Eventos, em São Paulo. “Ainda não resolvemos o que vamos tocar, mas será Ira!, com certeza!”, conta Edgard.
Ninguém precisa da guerra
“Como se fosse fácil entender que preciso de paz. Não preciso da guerra, ninguém precisa da guerra. O jovem pode levantar cedo, com um sorriso toda manhã”. A letra da música do álbum de estreia do Ira!, “Mudança de Comportamento”, lançado em 1985, reflete uma pergunta que todos os fãs do Ira! estão fazendo, desde que a notícia do show foi confirmada, na tarde desta quarta-feira (2): existe a possibilidade de o grupo voltar a se reunir? Edgard deixa a questão no ar. “Ainda é cedo para tal afirmação. Um passo após o outro. Primeiro esse show beneficente, que também tem a participação do Paulo Ricardo (vocalista e baixista do RPM) e de minha banda”, diz.
A movimentação dos fãs nas redes sociais é impressionante. Admiradores, músicos, produtores, todos se uniram para saudar e manifestar a sua alegria pelo fato de rever a dupla de volta aos palcos. Scandurra ainda prefere manter a cautela ao falar do futuro. “Nosso reencontro tem a finalidade desse evento e de retomarmos a nossa amizade. O que vem depois não sei dizer”, explica.
Receita para se fazer um herói
O respeito que Scandurra adquiriu, tanto do público quanto dos músicos brasileiros, é imenso. Ele credita esse prestígio a vários fatores. “Acho que é uma soma de atitudes que tive e procuro ter dentro da cena musical que me dá esse crédito tão bacana com a galera”, analisa.
Atualmente tocando na banda do cantor Arnaldo Antunes, Edgard já se apresentou ao lado de vários artistas nacionais, ao longo de sua carreira. Mais do que um guitarrista, Scandurra é um músico que consegue transitar por vários estilos musicais, do rock ao eletrônico, sempre mantendo intacta a qualidade do que faz. “Gosto de deixar a minha guitarra a serviço da música que eu toco, seja leve ou agressiva, lenta ou rápida e por aí vai. Sou um músico a serviço da boa música e procuro sempre tocar com quem realmente gosto. Isso me inspira a fazer o melhor”, afirma.
Após mais de três décadas de rock and roll, o músico acredita que sua carreira foi bem construída. Os constantes convites para participar de trabalhos de outros artistas e a admiração dos colegas são provas disso. “Tive o prazer de tocar com guitarristas de diversas ‘praias’ do rock nacional e percebi que sou muito respeitado… Fico muito feliz e agradecido por tudo que consegui na música”, agradece.
Além de emprestar o seu talento ao Ira!, Edgard também sempre investiu em sua carreira solo, onde gravou três álbuns: “Amigos Invisíveis” (1989), “Benzina” (1996) e “Amor Incondicional” (2006). Segundo ele, já existe material para um novo disco. “Tenho muitas músicas guardadas e mais algumas para finalizar. Se tudo der certo, em breve farei um belo registro desse material”, revela.
Nasci em 62
O cenário musical, hoje, é muito diferente dos anos 1980. Na década que consolidou o rock brasileiro como um produto popular e de qualidade, o vinil era o grande carro chefe do mercado fonográfico e as grandes gravadoras detinham os direitos sobre a esmagadora maioria dos artistas, praticamente sem concorrência. Hoje, as mudanças em todos os setores da sociedade são tão grandes que Edgard acredita que não existe comparação entre os dois períodos. “A tecnologia mudou o mundo de tal maneira que não dá mais pra fazer paralelos entre quase 40 anos de distância. O que eu posso ver, de semelhanças, são as influências que ainda vem da guitarra e do bom e velho rock”, analisa.
O fato é que a reunião entre Edgard e Nasi devolve ao cenário musical brasileiro uma dupla responsável por grandes momentos da história do rock nacional. Atualmente, a chamada “indústria cultural”, profetizada por Adorno e Horkheimer no começo do século passado, tomou conta das rádios e TVs brasileiras. Encontrar boas melodias e letras inteligentes, diante desse cenário, não é uma tarefa fácil.
Com a fase turbulenta superada, a expectativa dos fãs é de que surjam novidades de uma das maiores parcerias da história da nossa música. “O mais importante era que retomássemos a nossa amizade e que pudéssemos um olhar para a cara do outro com um sorriso de velhos amigos, sem receios ou rancores. Isso está acontecendo. Agora, falar sobre volta do Ira! ainda é um tanto prematuro. Um passo de cada vez”, finaliza Scandurra.
Confira a participação de Edgard no show de Arnaldo Antunes, no festival Lupaluna, em Curitiba, no ano passado.
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