Texto: Marcos Anubis
Revisão: Pri Oliveira
Fotos: Divulgação e Tattyne Lauria

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A Legião Urbana é, ainda hoje, um dos maiores ícones do rock nacional. Cultuada pelos fãs, a obra de Renato Russo, Dado-Villa Lobos e Marcelo Bonfá colocou a música brasileira em outro patamar. A partir do sucesso da Legião e, na sequência, de outras bandas da “geração 80”, as gravadoras brasileiras perceberam que o rock nacional era viável.

Agora, boa parte da trajetória do que muitos consideram a maior banda que o Brasil já teve poderá ser vivenciada pelo público em geral. A responsável é a jornalista carioca Chris Fuscaldo, autora do livro “Discobiografia Legionária”.

Nesta sexta-feira (23), Chris fará o lançamento do livro na capital paranaense com uma noite de autógrafos nas Livrarias Cultura do Shopping Curitiba.

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O nascimento do projeto

A ideia de escrever um livro falando sobre a Legião surgiu há oito anos. “Em 2008, eu fui convidada pela gravadora EMI Music para preparar textos que seriam encartados na reedição em vinil dos oito discos de carreira da banda que seriam lançados em 2010. Com as entrevistas que fiz, percebi a riqueza do material e, ao perceber a dificuldade de acesso dos fãs (afinal, com preços altos, os LPs viraram artigo de luxo), achei que a história que estava contando nos encartes renderiam um livro”, conta Chris.

A partir daí, o projeto começou a tomar a sua forma definitiva. “Neste ano, após assinar com a editora LeYa, fiz uma nova pesquisa e muitas outras entrevistas para falar também dos discos ao vivo, das coletâneas e dos projetos solo de Renato Russo. Minha ideia era colocar no livro a biografia de toda a obra da Legião Urbana enquanto os três estavam vivos e juntos”, complementa.

O livro conta histórias sobre os bastidores das gravações de todos os álbuns da Legião desde o primeiro LP, “Legião Urbana” (1985), até os discos póstumos, as coletâneas e os trabalhos solo de seus integrantes. Para falar sobre os acontecimentos que envolvem esses álbuns, além de entrevistar Dado Villa-Lobos e Marcelo Bonfá, Chris também procurou outras informações.

Entre os entrevistados estão alguns técnicos de som que trabalharam com a banda, diretores artísticos da gravadora e músicos que tocaram com a Legião Urbana entre 2008 e 2016. “Percebi que todos foram muito generosos com o projeto, solidários com a memória da música brasileira e legais comigo ao abrir o coração e a cabeça para o resgate dessas histórias. Abordei todos os assuntos, até os mais delicados, como a doença do Renato Russo, porque precisava saber como situações como essa influenciaram na produção dos discos da Legião urbana. Todo mundo comprou a ideia do projeto comigo”, revela.

Nos últimos anos, Dado e o Marcelo “reviveram” a Legião Urbana e passaram a fazer alguns shows. O primeiro foi um tributo à banda promovido pela MTV, em 2012, no Espaço das Américas, em São Paulo. Naquela ocasião, os vocais ficaram por conta do ator Wagner Moura.

Os mais recentes começaram em 2015, com a banda se apresentando sob o nome Legião Urbana XXX, e com o ator e cantor André Frateschi nos vocais. Vendo esse ressurgimento do nome Legião Urbana, o filho de Renato, Giuliano Manfredini, deu início uma interminável batalha jurídica a intelectual contra Dado e Marcelo.

Durante o nascimento da “Discobiografia Legionária”, segundo Chris, não houve nenhum problema com Giuliano. Ela afirma que ele não colocou nenhum obstáculo nesse processo de lançamento do livro. “Não. E nem poderia. Desde que o Supremo Tribunal Federal (STF) liberou as biografias, no ano passado, não existe mais quem possa colocar impedimento. De qualquer forma, eu e a editora LeYa entramos em contato, avisamos a respeito da produção do livro, até para que ele pudesse participar caso quisesse, assim como fiz com todos os outros durante o processo. E a equipe dele nos encaminhou à Companhia das Letras, que tem lançado material inédito de Renato Russo, para avaliar se eles poderiam ter algum tipo de contrato de exclusividade que pudesse nos atrapalhar. A editora também não se opôs”, revela.

O clássico

A grande obra-prima da Legião é o segundo álbum da banda. “Dois” (1986), trazia clássicos que se tornaram imortais, como “Índios”, “Quase sem querer” e “Tempo perdido”. No livro, Chris conta que Renato vislumbrou claramente a mudança no futuro da Legião depois desse álbum. “Na época do lançamento, o Renato disse que, com o ‘Dois’, a banda não precisaria mais bater na porta das pessoas, gritando. Era hora de falar de relacionamento emocional e afetivo, para ele”, diz.

Naquele momento, as canções do primeiro álbum, como “Soldados” e “Será” ainda estavam em evidência. Por causa disso, o grupo estava inseguro quanto ao sucesso do novo trabalho. “Quando a banda entrou no estúdio para gravá-lo, o primeiro disco ainda estava ecoando nas rádios. E bateu a ‘síndrome do segundo disco’, aquele medo de não conseguir fazer algo para segurar o sucesso do primeiro”, conta.

Para enfrentar essas dúvidas, a banda se dedicou ainda mais à produção e à lapidação das novas canções. “Toda a produção levou muito tempo. O Renato cismou que o disco precisava de violões e o Dado teve que se reinventar. ‘Andrea Doria’, por exemplo, só deu liga quando o Dado colocou o violão. Uma curiosidade é que a composição dessa música surgiu a partir de dois acordes tocados pelo Bonfá na guitarra!”, conta.

A despedida de Renato

Um dos assuntos mais emocionantes do livro é quando Chris aborda os últimos dias e a morte de Renato. Ele faleceu no dia 11 de outubro de 1996, após uma longa batalha contra a AIDS. Falar com as pessoas que vivenciaram esses momentos certamente foi uma das fases mais pesadas durante o processo de entrevistas. “Foi triste. Fiquei com muita vontade de chorar. E não só falando com Dado e com Bonfá, mas também com outras pessoas que estavam trabalhando com ele na época: o produtor e tecladista Carlos Trilha, o diretor artístico da EMI, Jorge Davidson, o fã que virou roadie, Reginaldo Ferreira e outros”, conta.

Em primeira mão, Chris transcreve na íntegra um trecho do livro que fala sobre esse esses momentos. “Dado, que não era de se atrasar, demorou a chegar à sua loja, a RockIt!, onde o roadie trabalhava. A mulher do guitarrista, Fernanda Villa-Lobos, confessou ao funcionário que Rafael Borges tinha pedido para Dado visitar Renato. À uma da tarde, o guitarrista entrou na loja e foi direto para sua sala. Dado chorou trancado no banheiro do apartamento de Renato Russo quando viu o amigo pela última vez, três dias antes de sua morte. Ao lado de Rafael Borges, fez uma visita meteórica ao cantor, já muito abatido e com pouca capacidade para reconhecer as pessoas. Mas ele se lembrou do guitarrista. E fez questão de se despedir com um “adeus” quando viu os dois indo embora”.

Essas e outras histórias estão no livro “Discobiografia Legionária”. O evento de lançamento acontece nesta sexta-feira (23), a partir das 19h, nas Livrarias Cultura do Shopping Curitiba.

Também haverá uma sessão de autógrafos com a jornalista Chris Fuscaldo. A entrada é gratuita. “Faço questão de ir a Curitiba porque tenho muitos amigos e parentes na cidade e soube que tem muitos fãs de Legião Urbana por aí, também. Quero muito que as pessoas venham me encontrar para eu conhecer mais legionários e ter certeza de que a escolha do tema do livro foi certa!”, finaliza Chris.