Texto: Marcos Anubis
Revisão: Pri Oliveira
Foto: Divulgação

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A banda curitibana Sad Theory é um dos mais antigos expoentes do Death Metal local. Formado em 1998, o grupo acaba de lançar o seu quinto álbum, “Vérmina Audioclastia Póstuma”. Sua lineup atual tem Claudio “Guga” Rovel (vocal), Alysson Irala (guitarra) e Daniel Franco (baixo). Em suas gravações o trio utiliza uma bateria eletrônica.

O novo trabalho encerra um hiato de praticamente oito anos, pois a banda se desfez em 2008. O rompimento aconteceu após a gravação do álbum “Descrítica Patológica”, que acabou sendo lançado somente em 2012. Durante esse período, Guga e Alysson colaboraram com trabalhos de outros músicos. “Eu participei de alguns discos e um DVD do Carlos Machado e trocava riffs virtualmente com o Juan Viacava. Também toquei com o Alison Schile em outros projetos”, diz Alysson. “A princípio o ‘Vérmina…’ seria um projeto só meu e do Guga, não seria Sad Theory. Mas, no andar da carroça, nós resolvemos que esse seria o quinto disco. Então, conversamos com o restante da banda. Eles apoiaram a ideia, mas já não eram mais membros efetivos”, complementa.

Uma temática própria

Uma das marcas do grupo é fugir dos temas tradicionais do Heavy Metal, abordando outras questões na concepção da sua música. As letras da banda, por exemplo, falam de assuntos mais profundos, fazendo com que o ouvinte reflita para entendê-las. “Não posso comentar quanto aos álbuns anteriores, mas acredito que em relação ao novo CD os temas acabam sendo provocativos e chocantes, pois abordam, sob um prisma frio e duro, aspectos comuns a todas as pessoas”, analisa Daniel. “Adoecimento, morte e os sentimentos negativos que os circundam são inexoráveis e inerentes à vida. Seja com familiares, com amigos ou consigo mesmos, todos terão seu momento de confronto com a finitude da vida e com os limites da sanidade mental. Acredito que o ‘Vérmina’ consegue materializar, ordenar e clarificar esses temas de maneira inédita no Rock nacional em português”, complementa.

Os títulos dos álbuns do Sad Theory também são pensados e encaixados como uma extensão do próprio CD. É o caso do nome “Vérmina Audioclastia Póstuma”. O título, que era para ter batizado o disco anterior do grupo, “Descrítica Patológica” (2012), foi dado pelo músico Athos Maia, que colabora com Alysson e Guga desde o seu primeiro álbum. “A verdade é que a banda já havia se desfeito quando o ‘Descrítica…’ foi lançado e quem cuidou de toda a parte de confecção de encarte foi o Carlos, nosso antigo baixista. Particularmente, sempre quis que ele se chamasse ‘Vérmina…’, mas o Carlos tomou as rédeas de todo o processo e acabou fazendo as coisas do jeito que achou melhor”, conta Guga. “Não vou entrar no mérito pessoal sobre o Carlos – ainda somos bons amigos. Acho que o ‘Descrítica…’ é um ótimo álbum, com músicas muito fortes e ótimas letras, mas confesso que acho a capa e a logo que saíram nele são belas porcarias. O Carlos tem uma veia artística muito forte. Para ele tudo tem que ser artístico e a parte gráfica acabou seguindo essa linha. No entanto, eu sempre primei por uma veia Death Metal”, complementa.

Apesar de ser uma forte característica do Sad Theory, Guga acredita que a mescla entre música e arte precisa ser muito bem dosada para que não ultrapasse os limites do equilíbrio. “É óbvio que a veia artística tem um alto valor nas composições da banda, mas para tudo tem um limite. Um balanço entre Heavy Metal e arte é o que deve ser feito, e não a sobreposição de um sobre o outro. No fim das contas, o título ‘Vérmina Audioclastia Póstuma’ encaixou como uma luva nesse novo disco. É denso, pútrido e ácido, na mesma atmosfera do personagem arrogante das letras que, no fim de sua vida e de suas paranoias, revive amores, passado, desejos, frustrações e tudo aquilo que o apeteceu”, diz o vocalista.

Bateria eletrônica

Outro fator que chama a atenção no som do Sad Theory é a bateria. Nas gravações da banda, Guga e Alysson criam e gravam toda a parte rítmica usando uma bateria eletrônica.

Mas o que poderia soar de forma artificial, de acordo com sua utilização, confere ainda mais identidade ao som do grupo. “Essa questão de buscar uma realidade no som da bateria eletrônica é polêmica. Entretanto, fico satisfeito em responder a uma pergunta que vem de certa forma afirmando o quão natural ficou a bateria programada, pois o trabalho que isso dá não está escrito. Humanizar esse instrumento foi uma das tarefas mais difíceis ao longo do processo. Nós a gravamos de duas formas: em linha e microfonada. Aí é feita a ‘cola’, que é unificar as trilhas da forma mais natural possível. Essa é a dificuldade, pois instrumentos virtuais não colam facilmente com instrumentos reais”, explica Alysson.

O processo de gravação do álbum

“Vérmina Audioclastia Póstuma” foi gravado no estúdio de Alysson, o Funds House Studio. As etapas desse processo são bem definidas pelo guitarrista. “Tudo começa com um riff de guitarra que pode ser uma intro, um refrão ou um verso. A partir disso, eu gravo o baixo e edito a bateria depois das cordas. Geralmente escrevo a bateria em um editor de partituras MIDI e depois converto o arquivo MIDI em WAVE com algum software de instrumento virtual. As cordas eu já gravo em linha, plugadas nos prés e na interface. Posteriormente eu faço a modelagem dos timbres com o auxílio de plugins de Heads famosos ou com o próprio Head físico”, explica Alysson.

Apesar desse modo metódico de registrar as músicas, muitas canções de “Vérmina Audioclastia Póstuma” nasceram de forma pouco usual. “Quando um músico da banda tem o estúdio e é seu próprio produtor, o disco pode demorar ‘séculos’ para ser finalizado, mas isso tem suas vantagens. Por exemplo: muitos riffs desse disco ‘apareceram’ depois de um sonho/pesadelo (acredite, isso acontece mesmo). Então simplesmente você acorda e vai gravar para não perder a ideia”, explica Alysson.

A profundidade dos textos

“Vérmina Audioclastia Póstuma” é um álbum conceitual e reflete bem a forma com que o trio vê a sua música. “Eu conheci o Guga ‘acidentalmente’ quando nos encontramos no estúdio Funds House. O Irala estava produzindo o meu projeto, o Rotpeter, e naquele mesmo dia o Guga faria gravações de voz do Sad Theory. O disco que viria a ser o ‘Vérmina…’ já estava com a maioria do instrumental composto e gravado, mas ainda havia uma boa parte das letras a ser escrita”, conta Daniel. “Após as gravações, o Irala mostrou para o Guga uma das letras do Rotpeter. Após ler e gostar, o Guga me pediu para escrever algumas letras para o Sad Theory. Como antigo fã da banda, fiquei um tanto quanto lisonjeado, até mesmo chocado com o pedido, e aceitei de pronto”, complementa.

A música “Karnofsky 70-41 (Ícaro)” é um bom exemplo desse formato decidido pela banda.  “Pretérito imiscui-se a delírios. Memórias que não são memórias, apenas curto-circuitos de uma mente à beira da não existência”, diz a letra. “Eu fiz uma letra dividida em três partes, utilizando como referência a Escala de Karnofsky. Ela é utilizada na Medicina, principalmente na Oncologia, para estimar o estado de saúde e a autonomia do paciente no decorrer de um processo de doença crônica. A escala vai de 100 (saúde perfeita) até 0 (morte)”, explica Daniel. “Essas letras não foram feitas, a princípio, tendo em vista um álbum conceitual. Mas como as que o Guga fez (e fui saber disso apenas depois) tinham um caráter pessoal e autobiográfico, os temas acabaram se encaixando de maneira extremamente harmônica”, complementa.

Essas composições foram dispostas como uma espécie de linha mestra do álbum. “As ‘Karnofsky’ foram distribuídas pelo CD como temas recorrentes (de modo semelhante liricamente ao que o Pink Floyd fez no ‘The Wall’ com ‘Another Brick in the Wall’), com o senso de começo, meio e fim sendo expandido para o álbum todo. Aí foi fácil encaixar as letras já existentes no contexto de saúde física e mental definhante (até mesmo o poema do Cruz e Sousa acabou se encaixando perfeitamente na história), bem como compor as letras que faltavam. Já com todo o conceito pronto, o Irala compôs a faixa-título, instrumental, que representa o silêncio e melancolia do post-mortem”, explica Daniel.

Os planos para o futuro

Após essa retomada de suas atividades, o Sad Theory já está trabalhando em um novo álbum. “A princípio queríamos lançar o sexto disco ainda em 2016, mas temos muitos compromissos paralelamente e não podemos nos comprometer com datas. O processo continua. Temos cinco músicas já gravadas e mixadas. Também já temos um nome para o disco. Só posso adiantar que será um daqueles nomes indecifráveis”, diz Alysson.

Dessa vez, a ideia é não trilhar uma linha mestra. “Posso afirmar que, quanto aos temas abordados (boa parte das letras já está escrita), não há um conceito único com desenlace cronológico como no ‘Vérmina’, mas uma órbita em torno de temas que se interrelacionam indiretamente. Falaremos sobre misticismo/religião, loucura, ponerologia e suas consequências na prática, como opressão e extermínios em massa. Entretanto, também haverá outros temas”, complementa Daniel.

Outra questão a ser resolvida nessa retomada é a formação da banda para os shows ao vivo. “Ainda não definimos. Estamos naquela fase teste de escolha dos músicos que a princípio serão contratados. Na verdade não tínhamos a intenção de tocar ao vivo e nem sabíamos se era possível tocar as músicas do ‘Vérmina…’, já que o registro das músicas foi feito por partes e a bateria foi programada por um guitarrista. Mas conversando com outros músicos, possíves membros e fãs da banda, concluímos que seria feito”, diz Alysson. “Logo estaremos ensaiando para possivelmente fazermos shows no segundo semestre. Também estamos selecionando alguns nomes de bandas para excursionar com a gente pelo Sul e por São Paulo”, finaliza Alysson.

Com o lançamento de “Vérmina Audioclastia Póstuma”, o Sad Theory retoma o seu lugar na história do Metal curitibano.