Texto e fotos: Marcos Anubis




Anos 1980. Época de bandas criativas, imensamente populares e engajadas politicamente. Uma delas era o Simple Minds. No último sábado (12) em seu show no Circuito Banco do Brasil, que foi realizado no BioParque em Curitiba, os escoceses superaram o frio e o desconhecimento do público mostrando a qualidade de um pop/rock que não é mais encontrado, atualmente.

O baixo grave e marcado de Ged Grimes, em “Waterfront”, marcou a entrada do grupo no palco. Logo de cara o público que não conhecia a banda pode perceber a simpatia de Jim Kerr. Com sua postura característica, se abaixando para cantar e pedindo a participação da plateia, o cantor se esforçou durante toda a apresentação para manter uma conexão entre o quinteto escocês e os fãs no BioParque.

Um dos momentos mais emocionantes da noite veio logo na segunda música, “Mandela Day”, onde Kerr pediu que os curitibanos cantassem para o líder sul-africano Nelson Mandela, que vem passando por vários problemas de saúde nos últimos anos. E isso não soa como uma demagogia. O Simple Minds apoiou várias causas beneficentes nos anos 80/90, entre elas a organizações Human Rights Now e a Amnesty International. Um dos momentos mais marcantes da história do grupo, inclusive, foi a iniciativa de mobilizar o mundo contra o apartheid, regime segregacionista da África do Sul que durou quatro décadas e deixou marcas profundas no país. “Mandela Day”, do álbum “Street Fighting Years”, lançado em 1989, foi escrita nesse contexto. “Há 25 anos eles prenderam aquele homem. Agora a liberdade se aproxima a cada dia. Enxugue as lágrimas dos seus olhos entristecidos. Eles dizem que Mandela está livre, então pise lá fora”, diz a letra.

A qualidade do som que chegava ao público no BioParque chamou muito a atenção. A equipe da banda conseguiu equalizar os instrumentos de forma precisa, fazendo com que tudo fosse ouvido com clareza. Isso não é uma coisa simples, visto que o quinteto utiliza teclados, guitarras e vozes sempre envoltas em efeitos de delay e reverb.

Clássicos como “Someone, Somewhere in Summertime”, “Promised You A Miracle” e “Sanctify Yourself” fizeram a alegria dos fãs que foram especialmente para ver o Simple Minds. “Foi um show impecável, tanto na área musical quanto na produção. O som permitiu que todas as nuances fossem percebidas. Cada transição, cada acorde e cada instrumento ficaram nítidos como se estivéssemos com um fone de ouvidos!”, elogiou o funcionário público e DJ Márcio Fernandes (39).

Para a publicitária Suddie Ramos (29), o profissionalismo e o carisma do grupo foram um dos pontos altos da apresentação. “Foi de arrepiar! Ver esses dinossauros super experientes, ao vivo, foi demais! Sempre me arrependo quando não consigo ir em um show desses caras que, com a experiência que tem, deveriam ser mais respeitados pela nova geração. Todos deveriam aprender, músicos e plateia, com o carisma, simpatia, educação e profissionalismo deles”, afirmou.

Logicamente, o grande destaque da noite foi “Don’t You (Forget About Me)”, tema do filme “The Breakfast Club”, dirigido por John Hughes e lançado em 1985. Após sair do palco, a banda voltou para o bis com “Alive And Kicking” e “Ghostdancing”, que fechou o show.

A passagem da “Greatest Hits + Live Tour” por Curitiba provavelmente tenha sido uma oportunidade única de ver, ao vivo, um dos grupos que ajudou a construir a melhor fase da história do pop/rock.




O pop feito com classe

O som do Simple Minds é refinado. As ambiências criadas pela guitarra de Charlie Burchill são criativas e marcam um estilo que poucos guitarristas possuem. Hoje, para soar “pesado”, a esmagadora maioria dos músicos se vale de pedais e efeitos cada vez mais artificiais. Burchill consegue impor peso nas canções usando reberbs e delays, o que exige muito talento.

O baterista Mel Gaynor e o tecladista Andy Gillespie também se destacam como fiéis escudeiros de Burchill e Kerr. Enquanto Gaynor consegue impor uma “pegada” mesmo nas partes mais lentas das músicas, Gillespie conduz as melodias que criam os climas envolventes das canções do grupo.

Uma herança que se perde?

Durante a apresentação dos escoceses, um fato chamou a atenção: poucos jovens conheciam o som ou a história do Simple Minds. Será que a herança musical dos pais não está sendo passada, ou absorvida pela nova geração de fãs de rock and roll? “Acredito que não exista interesse na qualidade. O pessoal não compreende mais o intuito de um álbum inteiro. Cada música se tornou algo isolado, sem contexto. Não se trata mais de sentar em frente ao aparelho de som e descobrir o trabalho da banda e do produtor, percebendo a cada nova audição um instrumento, um acorde, um trabalho de mixagem”, argumentou Márcio.

Para os fãs mais antigos, entretanto, a qualidade musical dos artistas da década de 1980 supera qualquer moda ou estilo atual. “O Simple Minds, assim como outros grupos da época, consegue o que 90% das bandas de hoje não conseguem: eles nos fazem sentir. A letra, a melodia e o clima arrepiam. O silêncio do vocalista, o baterista tocando sozinho, tudo isso emociona”, conta Suddie.

Após o show dos escoceses, tanto Suddie quanto Márcio foram embora, saciados em sua sede pelo pop/rock que moldou as suas preferências musicais. “Mesmo depois de tantos anos, é muito bom perceber que os caras ainda se esforçam pra compensar cada tostão gasto pelos fãs”, finalizou Márcio.

Confira três músicas do show do Simple Minds“Don’t You (Forget About Me)”, “Waterfront” e “Mandela Day”.