Texto: Marcos Anubis
Tradução e revisão: Priscila Oliveira
Fotos: Reprodução Facebook Philm/Andrew Stuart

Depois da saída conturbada do Slayer, Lombardo está com um novo projeto chamado Philm, no qual aposta em outras sonoridades além do Heavy Metal



Técnica, peso e agressividade. Essas são características primordiais em um baterista de Heavy Metal. Nenhuma delas, porém, funciona sem um ingrediente único: criatividade. Dave Lombardo, ex-baterista do Slayer e atual Philm, une todas essas qualidades em uma escala assombrosa.

Dave Lombardo nasceu na cidade de Havana, capital de Cuba, no dia 16 de fevereiro de 1965. Com dois anos de idade sua família se mudou para a cidade de South Gate, no estado da Califórnia, Estados Unidos. Em 1981, o baterista se uniu ao baixista e vocalista Tom Araya e aos guitarristas Kerry King e Jeff Hanneman dando início à trajetória de uma das bandas mais importantes da história do Thrash Metal, o Slayer.

A temporada no abismo

Com o Slayer, Lombardo gravou álbuns que fazem parte da discografia básica do Heavy Metal, como “Reign In Blood” (1986), “South Of  Heaven” e “Seasons In The Abyss” (1990). Sua forma de tocar logo chamou a atenção do público e da crítica, pois não se prendia somente ao bate-estaca característico do estilo.

No dia 12 de fevereiro de 2013, dias antes de a banda iniciar uma turnê pela Austrália, o Slayer anunciou de forma inesperada e estranha que Lombardo não fazia mais parte do grupo. O assunto ainda parece incomodar o baterista. “Por favor, consulte a minha declaração no Facebook em 20 de fevereiro de 2013 sobre a razão pela qual eu não estou mais lá. Não foi minha escolha sair. Eu queria resolver esses problemas e seguir em frente com a banda”, explica. Paul Bostaph, que já havia tocado com o grupo na primeira saída de Lombardo, em 1993, assumiu as baquetas do Slayer.

Na declaração a que se refere, Dave alegava não concordar com a forma com que os negócios do Slayer estavam sendo conduzidos. “No ano passado (2012), descobri que 90% da renda da turnê do Slayer estava sendo deduzida como despesa, incluindo taxas para os empresários, custando milhões de dólares à banda e deixando 10% ou menos para ser dividido entre nós quatro. Na minha opinião esse não é o jeito que uma banda deve fazer negócios”, explicou na nota.

Lombardo ainda revelou que não foi pago por todos os shows que fez com o Slayer no ano de 2012 e que apenas ganharia sua porção dos lucros se assinasse um contrato que não permitia o seu acesso aos relatórios financeiros e o proibia de dar entrevistas ou falar algo a respeito da banda. Ainda na nota, o baterista revelava que tentou um acordo com o grupo, mas o guitarrista Kerry King e o baixista Tom Araya não quiseram conversa.

O aviso de que Lombardo estava fora da turnê pela Austrália veio por um e-mail enviado pelos advogados do quarteto. “Não há mágoa, mas com certeza decepção pela forma como nosso legado está terminando em baixa. Mas, dito isto, eu segui em frente com alguns projetos incríveis e continuo a ser procurado para novas oportunidades que nunca teriam vindo em minha direção, se eu ainda estivesse na banda”, afirma.

Apesar dessa saída conturbada e das declarações dadas por ambas as partes, na época, o baterista parece estar superando esse momento difícil e seguindo com sua carreira. “No geral foi uma experiência de aprendizado difícil para mim, mas esta nova direção na minha vida me fez um homem e músico melhores”, complementa.

Jeff Hanneman

Em maio do ano passado o Slayer sofreu um duro golpe com a morte do guitarrista Jeff Hanneman, em decorrência de insuficiência hepática. O músico já estava afastado dos shows do grupo desde 2011, se tratando de uma doença auto imune adquirida após sofrer uma picada de aranha. A perda foi particularmente difícil para Lombardo, pois Hanneman, um dos principais compositores do Slayer, era muito próximo do baterista. “Jeff era o meu melhor amigo no Slayer. Nós passávamos a maior parte do tempo juntos no ônibus antes dos shows, enquanto Tom e Kerry estavam no camarim”, conta.

Por conta de sua proximidade com o guitarrista, Dave já tinha uma certa “premonição” do que estava por vir. “Eu acho que, no fundo, eu sabia que isso poderia acontecer, mas de alguma forma eu ainda senti como algo completamente inesperado. Foi uma surpresa quando eu soube da notícia. Eu fiquei em choque”, diz.

As três décadas de convivência no Slayer, principalmente com Jeff, deixaram o seu legado para Dave. “É sempre difícil aceitar a perda de um amigo, mas ainda mais doloroso quando é alguém com quem você compartilhou tantos anos e experiências históricas. Eu sinto falta dele”, afirma.



O novo projeto

Depois de sua saída do Slayer, Lombardo vem se dedicando ao Philm. Na nova banda, completada pelo guitarrista Gerry Nestler e o baixista Pancho Tomaselli, o músico pôde expor ainda mais suas influências que não se restringem ao heavy metal. O Philm tem uma concepção sonora bem experimental, unindo peso e improvisações. O som do trio lembra uma banda obscura dos anos 1990, o God Machine.

Em 2012 a banda lançou seu debut, “Harmonic”. O novo álbum do grupo já está gravado, mas alguns detalhes do lançamento ainda estão sendo decididos pelo trio. “O novo álbum é um pouco diferente do primeiro. As músicas foram escritas sob uma forma mais estruturada em vez das improvisações soltas que nós criamos em ‘Harmonic’. No momento o álbum está masterizado e pronto para o lançamento, mas nós ainda não decidimos qual será o método de distribuição, ou seja, se o lançaremos de maneira independente ou com a ajuda da gravadora. Nós ainda estamos indecisos”, explica Lombardo.

Além do Heavy Metal

A percepção musical de Dave Lombardo parece ser muito mais ampla, abrangendo vários estilos além do Thrash Metal. No disco de estreia do Philm, a música “Way Down”, por exemplo, tem passagens que lembram até Jazz.

Essa quebra de barreiras é um dos motivos que levaram o baterista a ser reconhecido como um dos melhores. “Com minha experiência e o sucesso em misturar gêneros, Punk & Metal = Thrash, por exemplo, eu sinto que há muitas direções diferentes que a música pode tomar. Isso por si só é o que me motiva”, analisa.

O desafio de compor algo novo, usando essas influências, é um dos combustíveis da carreira de Lombardo. “Isso me dá grande satisfação para criar algo que nenhuma outra pessoa tenha criado. Além disso, estou cercado por tantos amigos queridos que são talentos excepcionais. De compositores brilhantes a músicos lendários. Eles me inspiram e me influenciam diariamente”, complementa.

Grip Inc. e Testament

Lombardo também participou de outros projetos em sua carreira. Um deles foi o Grip Inc., formado em 1993. A banda tinha o guitarrista do Voodoocult Waldemar Sorychta, Jason Viebrooks no baixo e Gus Chambers no vocal. O quarteto lançou quatro álbuns: “Power of Inner Strength” (1995), “Nemesis” (1997), “Solidify” 1999 e “Incorporated” (2004). Gus faleceu em 2008 e desde então Lombardo não fomentou mais o projeto. “Infelizmente o vocalista Gus Chambers faleceu há alguns anos. Na época, nós nunca consideramos realmente tentar seguir em frente sem o Gus. Ele é insubstituível”, afirma.

Gus Chambers tinha 52 anos e se suicidou. Dave diz que, no momento, existe a possibilidade da banda voltar à ativa com um novo vocalista. “Recentemente eu estive pensando em reunir a banda novamente. Eu conheci um cantor chamado Casey Chaos, da banda Amen. Sinto que ele seria a combinação perfeita. Waldemar Sorychta e eu estivemos pensando em fazer alguns shows com Casey no futuro, só para ver se há alguma química entre nós”, conta.

Outra participação marcante do baterista foi no o álbum “The Gathering”, do Testament, lançado em 1999. A amizade com o vocalista e o guitarrista do grupo foram fatores fundamentais para essa parceria. “Eu conheço o Chuck Billy e o Eric Peterson há muitos anos. Nós somos grandes amigos. Eu tive uma das minhas mais notáveis experiências de composição e gravação com eles”, relembra. A química entre os três músicos transparece nas gravações do álbum. Um exemplo é a música “Legions of the Dead”, uma das melhores do CD. “Eu acredito que a paixão e o entusiasmo que você ouve nesse disco tem muito a ver com a nossa amizade e o respeito mútuo que temos uns pelos outros”, diz Lombardo.

Bill Ward

Ultimamente, em suas redes sociais, Lombardo postou algumas fotos com o ex-baterista do Black Sabbath, Bill Ward. Além do talento e da criatividade, os dois bateristas partilham a “coincidência” de terem sido preteridos de forma desrespeitosa por suas bandas. Dave explica como aconteceu essa aproximação. “Em janeiro de 2013 eu fui convidado para um jantar com a presença de vários bateristas favoritos de Bill Ward. Fiquei muito honrado por ter sido convidado. Desde então eu tenho mantido contato com Bill e desenvolvemos uma grande amizade. Nós temos muito respeito um pelo outro. Eu valorizo os momentos que eu tenho compartilhado com ele e espero ansiosamente por muitos momentos mais”, conta.

Brasil

Historicamente, o Brasil é um dos países onde o heavy metal é mais popular. Lombardo pôde presenciar isso em várias ocasiões. A última delas foi em 2011 quando tocou com o Slayer nas cidades de São Paulo e Curitiba. Atualmente, com a facilidade que a internet proporciona principalmente por meio do Twitter e do Facebook, os fãs brasileiros conseguem ter ainda mais contato com seus ídolos. “Sim, eu percebo a paixão e o amor que o Brasil tem pelo metal. Tenho testemunhado a experiência em primeira mão em minhas mídias sociais. É impressionante. Eu amo o Brasil, as pessoas sempre foram muito favoráveis a mim e a qualquer banda que eu tenha feito parte”, conta.

Aguardando o lançamento de seu novo álbum com o Philm, Lombardo revela em primeira mão que a banda pode se apresentar no Brasil ainda neste ano. “O Philm não está em turnê agora, porém nós temos alguns shows isolados chegando. Fomos recentemente procurados para fazermos alguns shows no Brasil. Espero que isso aconteça ainda neste ano”, diz.

A prioridade da banda, atualmente, é montar uma equipe profissional para cuidar das turnês do grupo pelo mundo. Se depender da vontade da banda, certamente o Brasil terá a oportunidade de ver o Philm. “No momento, estamos à procura de um forte agente de reservas para fazer parte da nossa equipe, então poderemos focar na programação de uma turnê para apoiar o nosso novo álbum. Eu adoraria que o Brasil fosse incluído nessa turnê”, finaliza.

O talento de Dave Lombardo ainda reserva grandes trabalhos no futuro. Certamente a carreira do baterista vai continuar rendendo bons frutos. Se o Slayer não quis mais contar com os seus “serviços” por motivos escusos, foi a banda que perdeu um dos mais criativos músicos do cenário heavy metal dos últimos 30 anos.

Confira a música “Lion’s pit”, com o Philm. Aproveite para assinar o Cwb Live, pagando a quantia que você achar justa. É só clicar no link da plataforma Catarse que está abaixo (campanha “Eu Apoio o Cwb Live”).

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