Texto: Marcos Anubis
Revisão: Pri Oliveira
Foto: Patrícia Valenti/Reprodução Facebook Garotos Podres

Revitalizada, a banda se apresenta no domingo (3) no Jokers Pub

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No mundo da música, é muito comum que as bandas percam a ideologia ao longo do tempo. Assim, o que era defendido com unhas e dentes quando os grupos surgiram acaba se diluindo à medida que a trajetória desses artistas vai se desenvolvendo. Definitivamente, esse não é o caso da banda punk Garotos Podres e, principalmente, do grande mentor do grupo, o vocalista e letrista José Rodrigues Mao Júnior, o Mao.

No próximo domingo (3), os Garotos Podres se apresentam na 20ª edição do festival Psycho Carnival, que acontece de 1º a 4 de março no Jokers Pub, em Curitiba. No lineup que reunirá 24 bandas, esse é um dos shows mais aguardados pelo público. “Confesso que para nós o convite é uma grata surpresa por dois motivos: o primeiro deles é por ser um evento que acontece no Carnaval. O país praticamente ‘para’ durante esta época do ano. Qualquer evento artístico, cultural ou musical que não esteja ligado à cultura do ‘Samba’ (ou gêneros afins) simplesmente não acontece. Antigamente o ‘ano começava’ depois do Carnaval. O segundo motivo é o fato de não sermos exatamente uma banda de Psychobilly. Para nós, é uma oportunidade de reencontramos velhos amigos dessa cena!”, diz Mao.

Esta será a primeira vez que os Garotos Podres se apresentarão no Psycho Carnival e justamente no ano em que o festival está completando duas décadas de vida e está mais do que consolidado como um dos eventos de Psychobilly mais importantes do mundo. “Nós conhecemos o Psycho Carnival há muito tempo, entretanto, é a primeira vez que temos a oportunidade de participar. Sempre curtimos bastante as bandas da cena psychobilly de Curitiba e já tivemos a oportunidade de tocar junto com muitas delas”, diz.

A música como meio de expressão social

Os Garotos Podres nasceram em 1982 na cidade de Mauá, no ABC paulista, um dos polos industriais mais importantes do Brasil. A estreia fonográfica aconteceu em 1995 com o álbum “Mais Podres do que Nunca”, disco que trazia os clássicos “Papai Noel, velho batuta” e “Anarquia Oi!”.

Desde o início, a consciência política e social fez parte da vida pessoal e musical de Mao e, nesses 37 anos de vida do grupo, o vocalista nunca se negou a opinar sobre a realidade brasileira. “O Garotos Podres é uma banda que surgiu em 1982 no período final da Ditadura Militar. Sempre estivemos inseridos no contexto de resistência dos trabalhadores contra o arbítrio. Para nós, a música sempre foi uma forma para dar ‘ritmo às nossas ideias’. É paradigmático o fato de que a nossa primeira apresentação pública foi realizada em um festival beneficente para o Fundo de Greve do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC”, relembra.

Ao analisar o contexto atual do Brasil, Mao é enfático, como sempre. “Acreditamos que estamos novamente em um período ditatorial inaugurado pelo golpe de estado de 2016. Esta ruptura da normalidade democrática apeou do poder um governo legítimo e iniciou um sombrio regime em que o sistema judiciário é utilizado como ilegítimo instrumento da política com o intuito de manter no poder os representantes políticos mais reacionários a serviço da classe dominante”, afirma.

Na contramão da maioria das bandas brasileiras que defendia algum pensamento crítico e recuou nos últimos anos, Mao continua sem meias palavras quando o assunto é o Brasil. “O governo que emergiu das urnas em 2018 é fruto e resultado desta política de arbítrio inaugurada em 2016. Estamos diante de um governo antipopular que promete acabar com a maioria dos direitos trabalhistas, previdenciários e sociais dos trabalhadores. Estamos diante de um governo que venceu as eleições somente porque o principal candidato dos trabalhadores foi impedido de concorrer, justamente pelo juiz que recebeu como pagamento um ‘ministério’. Um governo que chegou ao poder por meio da disseminação em massa das chamadas ‘fake news’ (mentiras) nas redes sociais. Estamos em um momento difícil, mas ao mesmo tempo desafiador. Temos certeza de que a classe trabalhadora saberá unir-se para derrotar esses reacionários que se apossaram do poder!”, complementa.

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Morte e renascimento

Os Garotos Podres passaram por muita turbulência nos últimos anos, o que levou à ruptura da banda e a uma briga judicial em relação ao uso do nome do grupo. Após muitas desavenças, a situação chegou a um ponto insustentável no início da década. “Em 2012, em um festival na cidade de Araraquara (interior de São Paulo), o nosso então empresário recusou-se a prestar contas sobre o evento. Mancomunado com certos ex-integrantes, este preferiu ‘empreender fuga em desabalada carreira’ (risos). Em outras palavras, fugiram com a van, deixando-me sem dinheiro e a mais de 300 km de São Paulo”, conta.

Porém, os desentendimentos vinham se desenrolando há bastante tempo dentro do grupo, o qe culminou com a saída de Mao. “Esse acontecimento foi apenas a ‘gota-d’água de uma série de problemas e desentendimentos que se somavam durante muitos anos. O ‘pano de fundo’ dessa história toda reside no fato de que dois ex-integrantes estavam se aproximando de posições de extrema-direita. Isso ficou bem claro e patente quando o ex-baixista, o Michel Stamatopoulos, saiu como candidato a vereador em São Caetano do Sul (ABC) pelo PEN, partido que na época era ligado a Jair Bolsonaro e que em 2018 mudou de nome para Patriotas, lançando a candidatura do ‘Cabo Daciolo’ à presidência”, complementa.

A partir daquele momento, foi criado o grupo O Satânico Dr. Mao e os Espiões Secretos que, na prática, como diz o próprio vocalista, era uma identidade secreta para os Garotos Podres. Sob a nova alcunha, a banda lançou o álbum “Contra os Coxinhas Renegados Inimigos do Povo” (2014 ).

No ano passado, a banda lançou as regravações das músicas “Grandola, Vila Morena” e “Aos fuzilados da CSN”, que também viraram clipes. “Atualmente, na prática, o CD enquanto meio de divulgação musical acabou. Achamos mais interessante lançar vários singles nas plataformas virtuais do que um álbum”, explica.

Renegar o passado

Apesar de ser contraditório, essa mudança de postura das bandas em relação ao que elas defendiam não é um fato isolado. Muitas realmente não se sentem mais ligadas ao viés ideológico que diziam ter. Ainda existem grupos como a Plebe Rude e os Inocentes que continuam firmes na postura que sempre tiveram, porém, muitas bandas punk têm feito questão de esquecer o lado mais crítico em relação a sociedade brasileira.

O espanto é grande porque, de maneira geral, os grupos punk sempre tiveram uma postura anarquista que nasceu com o próprio estilo no final da década de 1970. “Eu acho isso muito triste. Resumidamente, ao que parece, muitas pessoas que foram ‘incendiárias’ na juventude, depois de velhas, entraram para o ‘Corpo de Bombeiros’ (risos)”, diz.

Formação e base intelectual

Além do lado artístico, Mao é professor de História e confessa que tem ficado abismado com o desconhecimento que o cidadão brasileiro demonstra ter sobre os acontecimentos recentes vivenciados pelo país.

Parte desse inconformismo vem da formação pessoal do vocalista. “Eu vivi o período final da Ditadura Militar. Aos 14 anos, tomei a minha primeira ‘geral’ de dois sargentos da Aeronáutica por estar caminhando com um ‘caderno debaixo do braço’ e, por esse motivo, fui identificado como um ‘perigosíssimo’ estudante (era a época da greve dos estudantes de 1977). Nessa mesma ocasião, testemunhei a violência da repressão, senti o acre odor do gás lacrimogêneo e corri pela primeira vez da Polícia do Exército (no Largo São Bento)”, conta.

Mao também se recorda da época em que cursou o ensino médio na Escola Técnica Industrial Lauro Gomes, no centro de São Bernardo do Campo, no ABC paulista. “Eu matava aulas para ‘ir ver a greve’. Testemunhei operários sendo espancados pela polícia e helicópteros sobrevoando as assembleias do Sindicato e apontando as suas metralhadoras para os trabalhadores. Quando chegava em casa, assistia aos noticiários e ficava embasbacado com as mentiras e manipulações da mídia. Diante de tanta injustiça e covardia, meu jovem coração de estudante não podia ficar neutro. Desde aquela época eu uni o meu destino aos demais companheiros de minha classe: a classe trabalhadora!”, complementa.

O vocalista destaca que as situações pelas quais passou foram decisivas na formação de um pensamento crítico em relação à sociedade brasileira. “Todas as minhas experiências vividas contribuíram para a minha formação política. Creio que o meu dever é compartilhar tudo aquilo que eu aprendi com as gerações mais novas. Se existe muita ‘desinformação’ acerca de questões políticas importantes, isso não é culpa daqueles que ‘não sabem’. O que existe é uma verdadeira campanha de desinformação levada a cabo pela grande mídia com o intuito de manipular a opinião pública”, diz.

Como se vê, Mao não é alguém que caiu de paraquedas no meio musical apresentando opiniões fortes sobre a sociedade que nos cerca. A história de vida do vocalista sempre foi assim, e as ideias defendidas por ele não mudaram com o passar do tempo.

No próximo domingo, no Jokers, o Garotos Podres vai escrever mais um capítulo da longa relação com Curitiba. A cidade, aliás, sempre recebeu muito bem a banda, pois existe uma conexão da cena da capital paranense com o grupo.

No Psycho Carnival, esse reencontro tem tudo para ser especial. “Sempre tocamos em Curitiba e gostamos muito desta cidade que tem uma grande tradição rock’n’roll! Ficamos um bom tempo sem tocar por aí, retornamos em 2017 e estamos muito felizes por reencontrar a galera agora em 2019! Até breve! Estamos na luta!”, finaliza Mao.

Serviço

A 20ª edição do Psycho Carnival acontece de 1º a 4 de março no Jokers Pub, que fica na Rua São Francisco, 164, no Centro.

Os ingressos já estão à venda, e os valores são: Pacote 4 noites – R$ 200. Pacote 3 noites – R$ 170. Ingresso Individual (para cada noite) – R$ 60. Os preços são promocionais, mas é preciso doar 1kg de alimento na portaria do Jokers nos dias dos shows.

Os bilhetes podem ser comprados no site Sympla. Os pontos físicos de venda são o Jokers Pub (Rua São Francisco, 164, Centro – Segundas, das 11h às 16h, e de terça a sábado, das 11h às 24h), a Cervejaria e Bar Maniacs (Av. Munhoz da Rocha, 1049, Cabral – De terça a sexta, das 15h às 23h; sábados, das 11h às 23h; e domingos, das 11h às 20h) e no Lado B Bar (Rua Inácio Lustosa, 517, São Francisco – De quinta a domingo, das 20h30 às 24h).

Também é possível adquirir as entradas por meio de depósito em conta (a retirada dessa modalidade de ingressos será feita no local das apresentações nos dias e horários do evento).

Para efetuar a compra por meio de depósito bancário, o público deve utilizar a seguinte conta:

Banco do Brasil

Titular: Juliana Ribeiro

Agência: 0056-6

Conta Poupança: 83970-1

Operação: 51

CPF: 224.119.648 – 70

Formas de pagamento

Os ingressos podem ser comprados por meio de depósito em dinheiro em envelope nos caixas eletrônicos, depósito direto no caixa ou transferência entre contas do Banco do Brasil.

Após a compra, é preciso enviar as seguintes informações para o e-mail zombiesunion@gmail.com: nome completo, data e hora do depósito, valor do depósito e nome completo dos acompanhantes especificando o tipo e o dia do ingresso. Além disso, o comprador também deve informar o tipo do depósito e os dados do comprovante.

Os e-mails de confirmação serão enviados em até sete dias após o recebimento.

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