Texto: Marcos Anubis
Fotos: Reprodução Odery, Jazzwise e arquivo Hélio Brandão

Show acontece neste sábado (26) e será transmitido no YouTube e na página do projeto




Airto Moreira é reconhecido como um dos melhores percussionistas do mundo. Dono de uma técnica única, ele já tocou com inúmeros artistas, entre eles, as lendas Miles Davis, Chick Corea e Ron Carter.

Com Miles, por exemplo, Airto gravou o álbum “Biches Crew” (1970), que revolucionou o Jazz naquele período. A experiência com Miles Davis, que abordava a música com uma perspectiva completamente inovadora, foi um período de muito aprendizado. “Eu toquei o que senti. Primeiro, nós gravamos e depois ele começou a me convidar para fazer as turnês. Ele nunca disse ‘eu quero que você toque assim’. Foi tudo bem espontâneo, com todos os músicos. Era um trabalho bem criativo”, conta Airto Moreira.

Neste sábado (26), Airto se apresenta como convidado especial no show que o multinstrumentista curitibano Hélio Brandão fará na edição virtual na 6ª Edição do Festival BB Seguros de Blues e Jazz.

Por causa da pandemia do novo coronavírus, o evento será transmitido por meio do canal do BB Seguros no YouTube e da página do projeto no Facebook.

As apresentações também serão transmitidas em um telão montado no Planeta Drive In, na Pedreira Paulo Leminski, com entrada gratuita. Os ingressos (que são válidos para um carro com até quatro pessoas) podem ser reservados por meio deste link. As regras de segurança e saúde serão seguidas à risca para que as pessoas, dentro dos carros, possam curtir os shows com toda a segurança e conforto.

Na versão curitibana do evento, que ainda será realizado posteriormente em outras cinco cidades brasileiras, o lineup será composto oito bandas e artistas.

As atrações internacionais são o virtuoso guitarrista Stanley Jordan e a cantora Thornetta Davis. Do Brasil, além de Hélio e Airto, foram escalados o Dudu Lima Trio e os grupos Bixiga 70 e O Bando – Tributo Eric Clapton. Os shows terão 50 minutos de duração e começam às 17h.

As apresentações do festival foram pré-gravadas, mas com a preocupação de criar uma atmosfera que se aproximasse da energia de um show ao vivo. “O Hélio organizou tudo. Ele falou comigo, formou o grupo e fomos ensaiar. Ele tem muitas músicas, então, nós escolhemos o repertório. Primeiro ele ensaiou individualmente e depois com todo mundo junto e isso foi uma boa ideia. O ensaio foi muito bom, com todos chegando na hora e querendo tocar. Isso é muito importante! Todo mundo estava com prazer de tocar um com o outro. A coisa mais importante é a vibração, a energia que a gente cria quando toca e nesse grupo a energia estava ótima! Eu gostei muito”, diz Airto Moreira.

Hélio sempre admirou a obra de Airto e esse carinho aumentou ainda mais quando os dois se conheceram. “Eu conheci o Airton há algum tempo e tivemos muitas conversas. Nesses papos, ele me contou um pouco do que viveu, sobre a experiência musical dele. Ele é um músico muito importante que levou a música brasileira para o mundo inteiro”, elogia Hélio Brandão.

Pouco depois, Hélio dividiu o palco com Airto em um cenário mágico no litoral paraanense. “Eu tive a oportunidade de tocar com ele em Morretes, no Festival Nhundiaquara, quando fizemos um tributo ao Weather Report. Agora, apareceu esse show no Festival BB Seguros”, diz Hélio.

Para os artistas, esse novo formato de show é uma novidade, mas não deixa de ser uma maneira de permanecer em contato com o público. “A música foi prejudicada diretamente pela pandemia e, assim, os músicos precisam ter outro tipo de criatividade. Um toca no Brasil, outro em Londres, outro no Japão e, assim, fazem um show. É uma diferença muito grande da música ao vivo para as lives. As pessoas estão começando a se interessar até por músicas mais antigas, coisas que já passaram, porque não tem nada novo, ao vivo. Porém, é sempre música e, quem ouviu, vai gostar ou não”, avalia Airto.

Voltar ao convívio dos amigos, mesmo que por um breve período, fez muito bem para todos os envolvidos na apresentação. “Foi muito bom ter a oportunidade de ensaiar depois de cinco meses sem tocar com ninguém, só estudando em casa. Fizemos um ensaio mais curto, com a proteção das máscaras, mas foi muito bom, mesmo com todas as limitações de segurança”, diz Hélio.




Uma união de talentos

O show foi gravado no estúdio Gramofone, em Curitiba. O repertório será composto por cinco composições de Hélio Brandão, inspiradas e dedicadas a músicos que são referencias para ele: “Equilibrista”, “Andarilho” e “Fagulha” (Wayne Shorter), “Quatro Ilhas” (Jaco Pastorius), e “Felizia” (Egberto Gismonti). Além delas, o grupo também tocará “Café”, de Egberto Gismonti.

O Quinteto Hélio Brandão é formado por Davi Matheus Silva (bateria) Hélio Bravi Sartori (piano), Thiago Duarte (baixo), Hélio Brandão (sax), com a participação especial de Airto Moreira, na percussão.

Hélio é multi-instrumentista, saxofonista e compositor e tem uma longa trajetória na música. Entre outros projetos, ele já tocou com a Orquestra Sinfônica do Paraná, com a Camerata Antiqua de Curitiba e com a Orquestra de Câmara de Blumenau. “Eu tenho 62 anos e comecei a tocar em casa, com uns sete anos de idade. Eu nem sei dizer exatamente quando eu comecei a ser profissional.  Lá em casa, nós sempre convivemos com a música. Nós pensamos na música como se fosse uma religião, ganhar dinheiro é o de menos. O mais importante é a convivência com a música”, afirma Hélio.

A música esteve no dia a dia de Hélio desde a infância, afinal, o pai dele, que também se chamava Hélio Brandão, sempre esteve envolvido a cena cultural curitibana. “Ele era médico, mas tocava violino e gostava muito de música. Já a minha mãe era pianista. Ao lado de dois amigos, eles fundaram a Orquestra Sinfônica do Paraná, que existiu antes da USIMPA, do Guaíra. A sede era lá na Universidade Federal do Paraná”, conta Hélio.

Os registros fonográficos da carreira de Hélio contam com gravações de 10 obras completas que homenageiam grandes autores da música: Villa-Lobos, Hermeto Pascoal, Egberto Gismonti, Wayne Sorther, Tom Jobim, Chico Buarque, Edu Lobo, Piazzolla, Fauré, Coltrane, Charlie Parker e Bach.

Ainda em 2020, Hélio pretende apresentar as duas últimas séries do “Hélio Brandão Tributos”, que reúne dois shows que foram registrados em 2019, na Casa Brandão.

O primeiro é um Tributo a Charlie Parker (gravado com um quinteto instrumental, com 13 faixas instrumentais e 47 minutos de duração), e o segundo é o Tributo a Bach (gravado em quarteto, reunindo três movimentos e com duração de 26 minutos).




Reconhecimento e respeito em todo o mundo

Airto nasceu na cidade de Itaiópolis, em Santa Catarina, mas foi criado em Curitiba. Em 1965, ele conheceu a cantora Flora Purim, no Rio de Janeiro e, dois anos depois, os dois resolveram tentar a vida nos Estados Unidos. Começava aí uma trajetória repleta de sucesso e reconhecimento.

Em mais de 50 anos de trajetória artística, Airto já gravou aproximadamente 40 álbuns, entre trabalhos próprios e participações. O mais recente é “Aluê” (2012), que contou com a participação da filha dele, Diana Purim, nos vocais. Na extensa lista de bandas das quais Airto fez parte estão o Quarteto Novo, no qual tocou ao lado do Bruxo Hermeto Pascoal.

Entre as colaborações, duas são bem inusitadas. Em 1993, Airto participou da gravação do CD “Smashing Pumpkins MTV Unplugged” e, em 2001, do CD “Exciter”, do Depeche Mode, quando tocou nas músicas “Freelove” e “I feel loved”. Atualmente, ele trabalha com vários artistas e grupos, entre eles, Frederic Galliano e Giles Peterson.

Em agosto de 1981, Airto foi escolhido o percussionista do ano na opinião de 55 críticos de Jazz de todo o mundo no 29º Annual International Jazz Critics Poll, promovido pela conceituada revista “Down Beat”.

Na música de Airto, a liberdade artística e de criação é total. De alguma maneira, ele conseguiu se desprender das amarras da música tradicional, digamos assim, e deixar a criatividade fluir acima de qualquer rótulo. “Tudo acontece assim, de uma maneira criativa. Graças a Deus, nós temos essa inspiração que vem e você faz uma música. Como nós passamos a vida inteira praticamente lá nos Estados Unidos, a gente criou um estilo nosso que foi uma mistura da música brasileira e latina, Jazz e outros estilos, como a música africana”, explica Airto.

Com essa perspectiva de trabalho, Airto define a música como poucos. “A música sem criatividade não existe, ela fica sem energia. É preciso ter criatividade para criar a harmonia e a melodia. A gente sempre trabalhou bem a vontade, um ajudando o outro, sempre pegamos músicos bons, os melhores que estavam disponíveis e queriam muito tocar com a gente. Além disso, é ensaio, muito ensaio!”, diz Airto.

Essa paixão pela música rendeu muitas turnês por todo o mundo. “Em muito lugares, eu não tinha a menor ideia de que as pessoas conheciam a gente, mas elas apareciam! Sempre tinha um público bom, formado também por brasileiros que moravam nesses lugares”, diz. “Chegamos a fazer turnês de três meses na Europa toda e depois na Ásia. Embora eles não entendessem o que a gente falava, a energia era muito boa, então, todo mundo gostava porque ritmicamente o Brasil é um país riquíssimo. A música brasileira é uma das melhores do mundo”, complementa Airto.

Além de participar do show do Festival BB Seguros, ao lado de Hélio Brandão, Airto também veio a Curitiba para gravar um novo álbum. “A gente ainda está preparando porque teremos músicos que virão de fora e ainda não estão aqui. Estamos escolhendo o repertório”, diz Airto.

Coma sabedoria de quem leva a música como uma atividade realmente espiritual, Airto avalia de uma maneira bem leve a situação pela qual o mundo está passando. “A pandemia está afetando muito a humanidade. O Covid-19 veio para nós, os seres humanos. Acho que isso é uma lição pra gente, para os seres humanos que moram aqui nesse momento, que reencarnaram aqui. Acredito que ainda vai demorar bastante, ninguém sabe quando vai terminar. Acho que isso é uma coisa de Deus, do nosso Criador, que está oferecendo mais uma lição pra gente não ficar como estava antes. Cada um de nós precisa cuidar de si, da família, das pessoas que a gente ama. Precisamos ter respeito um pelo outro e tentar ajudar a quem a gente puder. Ajudar é parte da pandemia, aprender a ser um ser humano melhor”, finaliza Airto Moreira.

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