Texto: Marcos Anubis
Fotos: Reprodução Facebook Tomba Latas/Arquivo pessoal dos adotantes

A ONG curitibana sobrevive, apesar da falta de apoio, e faz um trabalho repleto de histórias de superação




Quem acompanha o trabalho do Cwb Live desde 2011 sabe que a nossa paixão é a música. Nós acreditamos que é possível construir uma sociedade melhor e, dentro dessa linha de pensamento, o respeito aos animais também é uma das nossas paixões.

Pensando nisso, nós estávamos buscando uma maneira de ajudar a causa animal dentro do que está ao nosso alcance. Depois de muita reflexão, nós decidimos que, a partir de hoje, o site do Cwb Live passa a contar com uma página dedicada a adoção de animais.

Ele se chama “Adote Um Amigo” e será usada para divulgar os bichinhos que estão para adoção em Curitiba. A ideia é divulgar fotos e informações sobre os animais que foram abandonados e estão em busca de uma família que acolha cada um deles com carinho e atenção.

O nosso trabalho continua o mesmo, com coberturas de shows, entrevistas exclusivas, fotos, vídeos e matérias. Apenas teremos mais esse espaço para ajudar a bicharada que tanto precisa do nosso apoio.

Nessa matéria de estreia do “Adote um Amigo”, nós fizemos uma entrevista com os responsáveis pela ONG Tomba Latas, que está completando dez anos de vida na capital paranaense. Superando vários obstáculos, o grupo resgata, trata, acolhe e encontra um lar para animais em situação de risco.

Contamos com a ajuda de todos os nossos leitores e acreditamos que, dessa maneira, vamos encontrar um lar para cada um desses animais.




Nunca se renda

A cachorrinha Pucca (foto) foi resgatada em 2012 pelo grupo de protetoras curitibanas Tomba Latas. Durante a vida, provavelmente, ela foi obrigada a participar de rinhas e, quando os “donos” acharam que ela não “servia mais”, a cadelinha foi jogada na rua.

Quando foi resgatada e levada à veterinária, Pucca tinha pedras no estômago. Ao que parece, desesperada e com fome, essa foi a única coisa que ela encontrou para comer quando estava abandonada. “A Pucca foi resgatada na rua e estava bem debilitada. A gente achou que ela estava prenha, mas o ultrassom revelou que eram pedras no estômago. Devido às várias marcas em diferentes estágios de cicatrização e o modo como a Pucca reagia a outros cachorros, chegamos a conclusão de que ela participava de rinhas. Na sequência, ela foi submetida a uma cirurgia para a retirada das pedras e teve um pós-operatório muito delicado”, conta a socióloga Carla Moraes, uma das fundadoras do Tomba Latas.

Assustada e sem confiança no ser humano, por motivos óbvios, Pucca virou uma hóspede permanente do Tomba Latas. Afinal, depois de tanto tempo, nem as protetoras do grupo ainda acreditavam que ela teria uma chance de conquistar uma família.

Eis que, oito anos depois e em plena pandemia do novo coronavírus, a cachorrinha tocou o coração da redatora publicitária Jéssica Dantas e da filmmaker Aléxia Santos.

Em julho, Jéssica e Aléxia começaram uma pesquisa para adotar um cão. Inicialmente, a ideia era buscar um filhote, mas após duas semanas de procura, nenhum animal chamou a atenção e elas acabaram desistindo.

Então, no início de agosto, uma imagem no perfil do Tomba Latas no Facebook acabou mudando o destino dos dois lados. “Nós já tínhamos pesquisado no perfil do Tomba, mas não tinha foto da Pucca. Eu lembro que era uma sexta-feira à noite quando eu entrei e vi a imagem dela. Imediatamente, eu falei para a Aléxia: “olha, que coisa linda, vamos adotar’? Lendo a descrição, que explicava que ela provavelmente era usada em rinhas e que já era idosa, nós sentimos uma coisa tão forte naquele momento que nem pensamos em outra possibilidade”, conta Jéssica.

Nitidamente, a conexão foi imediata e a espera por um lar, que durou oito anos, finalmente chegava ao fim. “A carinha fofa que ela tem, em formato de coração, despertou o nosso interesse. Quando descobrimos a história da Pucca, nós percebemos que ela precisava de um lar e a gente tinha condições para isso. Nós ficamos com muito medo de que ela já tivesse sido adotada e já entramos em contato. Na manhã do dia seguinte, nós já fomos até ela e adotamos”, diz.

Além do charme da cachorrinha Pucca, a maneira carinhosa com que Jéssica e Aléxia foram tratadas pelas protetoras do Tomba Latas fez toda a diferença no momento de concretizar a adoção. “Nós já tínhamos entrado em contato com outras ONGs, mas percebemos que a receptividade do Tomba Latas foi muito melhor. Elas foram acolhedoras e esclareceram todas as dúvidas que a gente tinha desde o primeiro contato. As meninas são muito queridas e percebemos o quanto elas se doam por essa causa”, diz.

Além de toda a disposição em ajudar no que for preciso, a preocupação das tutoras é ainda maior porque a cachorrinha Pucca precisa realmente de cuidados especiais. “Ela tem um probleminha chamado hiperadrenocortismo e o pessoal do Tomba continua ajudando e orientando a gente nesse sentido. Com elas, não é como se a pessoa adotasse o animal e aí tivesse que se virar. Nós tivemos várias dúvidas sobre a melhor forma de cuidar da Pucca, qual seria a melhor ração para ela se alimentar, enfim, e elas sempre ajudaram. A maneira com que o pessoal do Tomba Latas tratou a gente fez toda a diferença”, complementa.

Agora, muito bem acolhida em um novo lar, mas ainda com um histórico de vida bem pesado, Pucca só precisa de carinho e paciência.

Felizmente, Jéssica e Aléxia sabem muito bem disso. “Ela ainda tem medo e não consegue ficar em um ambiente com outros cães. Nós tentamos fazer com que a vida dela seja o mais normal e ativa possível para que ela não sofra. É claro que, às vezes, nós estamos passeando e ela encontra algum cão e fica nervosa, mas nós estamos aprendendo a fazer com que ela se acalme. A gente sabe que isso é um trauma e não vai passar, então, nós temos muita paciência e queremos que ela se divirta sem se estressar”, diz.




Amor, paciência e força interior

A história da cachorrinha Pucca (foto) é uma entre as centenas que fazem parte da trajetória do grupo de protetores curitibanos Tomba Latas que, em 2020, está completando dez anos de vida.

Criado em 2010 por Carla Moraes e outras protetoras, e contando atualmente com dez integrantes efetivos, o objetivo do Tomba é resgatar e proteger animais em situação de risco.

Porém, essa missão não é nada fácil. Afinal, o grupo sobrevive da renda pessoal de cada um dos integrantes, sem nenhum apoio do poder público. “Não temos ajuda nenhuma. O poder público não se importa com a causa animal. Agora, eles estão fazendo algumas castrações, mas tem gente que fica vários meses esperando na fila. Até lá, a cadelinha já deu cria novamente. Nós fazemos rifas e bazares e pagamos as contas em veterinários com a ajuda dos nossos seguidores. Já o hotel de cada animal é bancado por quem fez o resgate. Só alguns cães têm padrinhos. Já cheguei a pagar sozinha as despesas dos hotéis de 14 cachorros! Se eu não desse conta, eles iriam para a rua e o poder público simplesmente ignoraria”, diz a dentista Isamara Talavera, que faz parte do Tomba Latas desde o início do grupo.




Uma luta com poucos aliados

Quando ouvem falar de um grupo que ajuda animais, é muito comum que as pessoas pensem em um abrigo mantido por voluntários que acolhem, tratam e alimentam os bichinhos. Porém, isso está longe de ser a realidade.

O Tomba Latas, assim como a maioria das ONGs que se preocupam com a causa animal, não possui um abrigo para os animais que são resgatados. Na verdade, todos são encaminhados para os lares temporários (LTs), que podem ser na casa dos integrantes ou de outras pessoas que fiquem responsáveis por eles.

Hoje, aproximadamente 70 animais estão sob a proteção do Tomba Latas. Para arcar com as dívidas que fatalmente se acumulam mensalmente, as protetoras promovem rifas periodicamente para ajudar nas despesas com veterinários, hotéis para hospedagem dos animais, ração e remédios. Tudo o que é arrecadado se junta as contribuições pessoais de cada integrante do grupo.

Esse esforço é necessário porque a obrigação de um protetor não acaba quando o animal é resgatado. Tirá-lo de uma situação de risco é só o início de uma intensa batalha para conseguir recursos para levá-lo a um veterinário, medicá-lo e encontrar um tutor que possa acolher o bichinho em casa.

Obviamente, isso não é nada fácil porque envolve dinheiro, tempo e responsabilidade. “É muito difícil quando as pessoas pedem ajuda, mas querem que a gente vá buscar, pague hotel, veterinário, ou seja, que faça tudo. Todos têm que fazer a sua parte. É preciso tirar esses animais da rua, levá-los ao veterinário e fazer uma vaquinha para pagar a castração. Nenhum grupo de proteção aguenta mais tantos pedidos e tão pouca ajuda”, diz Isamara.

Algumas situações, inclusive, exigem outras medidas para que os animais sejam protegidos, principalmente quando eles são agredidos. “Quando os animais têm dono, é preciso fazer uma denúncia pelo número 181. Nós não podemos resgatar, mas a maioria dá o cachorro de uma maneira bem fácil porque querem se livrar mesmo, infelizmente”, explica Isamara.




Como adotar

A adoção é o objetivo de qualquer resgate. Afinal, o animal só terá uma vida melhor se for adotado e receber carinho e atenção.

No Tomba Latas, quando são acolhidos pelas protetoras, eles são encaminhados para a avaliação veterinária, são castrados e, na sequência, vão para um lar temporário.

Só então os animais ficam disponíveis para adoção, em um processo que segue algumas regras rígidas, justamente para tentar minimizar a possibilidade de situações pesadas tanto para os animais quanto para o próprio grupo. “Fazemos uma entrevista, vemos o perfil do adotante, se ele tem condições de pagar uma ração boa, os cuidados veterinários, se a casa é segura, etc. Se tudo estiver certo, o adotante assina um termo de responsabilidade”, explica Isamara.

Entretanto, não é fácil encontrar um adotante que realmente se importe com o bem estar do animal. “O que mais deprime é que muita gente quer adotar, mas sempre vem com aquela história: ‘quero um cachorro pequeno e fêmea porque moro em apartamento e não tenho espaço’. Na verdade, os cachorros grandes se adaptam muito bem em apartamentos. Temos vários machos adultos que vivem bem e nunca fizeram um xixi fora do lugar certo. Os bons adotantes não se preocupam com o porte ou a raça. Ele se preocupam com o animalzinho, procuram dar um lar, curar as feridas que esses coitadinhos trazem e fazer com que eles superem os traumas. Eles são extremamente agradecidos”, diz Isamara.

Antes da pandemia, para buscar um lar para os animais, o Tomba Latas costumava realizar feirinhas de adoção.

Porém, atualmente, com as restrições que o momento exige, o grupo vem tentando manter o trabalho por meio das redes sociais. “Estamos divulgando nos nossos perfis no Facebook e no Instagram. Nesse período, conseguimos encontrar adotantes para alguns cachorros, como a Pucca. Só que também recebemos inúmeros pedidos de ajuda e a maioria é de cachorrinhos doentes. Vivemos enxugando gelo e cheias de dívidas”, conta Isamara.

Porém, nem todos têm a oportunidade de conseguir um lar. Entre os resgatados, os animais que encontram mais dificuldades para serem adotados são os idosos e da cor negra.

Em alguns casos, os resgatados permanecem durante a vida toda sob a tutela das protetoras do Tomba Latas. Um deles é o Orfeu (foto), que está sob a guarda do grupo há sete anos.

Orfeu foi resgatado junto com a irmã, Cigana, em um local no qual ficava localizado um circo. As pessoas que trabalhavam ali cuidavam dos dois, mas quando o circo foi embora, os vizinhos fizeram de tudo para que a dupla “sumisse da área”.

Sabendo da situação, as protetoras do Tomba Latas agiram rapidamente e resgataram os dois irmãos. Posteriormente, Cigana foi adotada, mas Orfeu permanece sob a tutela do Tomba Latas até hoje.

O que poucos sabem, é que quanto mais os animais sofrem, mais ele demonstram amor e gratidão por quem os acolhe. Ou seja, quem adotar o Orfeu, ganhará um amigo fiel e carinhoso por toda a vida.

Outra situação que infelizmente é muito comum é a devolução de animais que são adotados. Os motivos para isso são só mais diversos e vão da falta de adaptação ao novo lar até a simples desistência do adotante.

Só que esse tipo de atitude joga uma carga emocional ainda mais pesada sobre esses animais, que já carregam traumas muito profundos. Afinal, muitos foram agredidos covardemente, maltratados e até feridos antes de serem resgatados. Por isso, uma nova situação de estresse deve ser evitada a todo custo.




Resgates marcantes

Alguns resgates de animais são muito difíceis, afinal, normalmente, eles estão assustados porque sofreram agressões e precisam recuperar a confiança no ser humano.

Dessa forma, inevitavelmente, a lista de lembranças pesadas carregada por cada um dos integrantes do Tomba Latas é bem extensa. “Tivemos vários resgates difíceis. Entre os que eu fiz, o mais complicado foi o de um Pastor Alemão que eu achei que estava morto em frente a um restaurante. Provavelmente, ele era um cão policial ou era usado para cuidar de empresas. Ele estava muito machucado e, quando eu coloquei no carro, tive medo até que ele me atacasse. Outro resgate difícil foi o de um velhinho enorme chamado Lion. Quando eu coloquei no carro, ele queria vir para cima de mim enquanto eu dirigia. Cheguei chorando no veterinário, desesperada”, conta Isamara.

Ou seja, para ser uma protetora, a pessoa também precisa ser forte emocionalmente. “Nosso lema é ‘alegrias superando as tristezas’! Nesses dez anos, tivemos sentimentos muito bons e outros muito ruins. Foram muitos cachorrinhos resgatados de acumuladores, atropelados, espancados, que se recuperaram e estão bem. Porém, tivemos alguns que sofreram muito e para os quais nós não conseguimos dar a vida merecida. É muito triste”, complementa Isamara.

Outro resgate complicado foi o do Lobão (foto), um cachorro idoso que estava em um estacionamento em Curitiba. “Ele estava muito assustado. O resgate foi difícil porque ele foi o cachorrinho mais aterrorizado que já encontramos”, diz Isa.

Depois de ser resgatado, em 2012, Lobão foi acolhido em um hotel para cães. Porém, devido aos traumas emocionais que ele carregava, as protetoras precisaram submetê-lo a um treinamento. “Conseguimos uma pessoa que se ofereceu para fazer o treinamento e ele ficou um bom tempo com ela. Depois, vimos uma mudança no olhar e no comportamento dele. Ele começou a confiar nas pessoas! A gente comemorou, mas infelizmente, ele voltou para o hotel. O Lobão não entendeu o que estava acontecendo e ficou muito magrinho, de repente”, conta Isa.

Lobão foi encaminhado para uma avaliação e as protetoras descobriram que ele precisaria de cuidados contínuos dali para frente. “Ele foi levado para fazer uns exames com a Dra. Giovana Ravedutti e descobrimos que ele estava com um problema cardíaco sério. Ele precisava tomar remédios diariamente, então a Dra. Giovana e a Dra. Renata, da Clínica Unisa, se comoveram e se apaixonaram por ele. Fizeram uma adoção conjunta. Ele vai todo dia para a clínica com elas e volta para casa também com as duas. Ficamos emocionadas e felizes demais. Devido ao problema cardíaco, não sabemos quanto tempo de vida ele tem, mas sabemos que ele tem a melhor vida e está sendo muito amado”, diz Isa.




Momentos felizes

Apesar das situações tristes que periodicamente se apresentam, as protetoras aprendem a se apegar aos momentos de alegria que fazem todo o trabalho valer a pena. “Várias histórias nos marcaram muito. Para mim, a principal foi o Yoda (foto). Ele foi atropelado e, quando eu resgatei, ele foi levado rapidamente à veterinária. Depois de avaliar a situação, ela colocou pinos nas fraturas, mas não deu certo. Ele acabou perdendo uma patinha traseira e ficou mais de um ano no hotelzinho. Então, uma pessoa que estava procurando um cachorro especial para adotar simplesmente se apaixonou de cara por ele. Ela se mudou para o Canadá e hoje sempre me manda fotos e notícias. Ele é muito amado!”, conta Isamara.

Yoda foi adotado em novembro de 2017 pela farmacêutica Karla Baquil, que hoje mora na cidade de Mississauga, no Canadá. “Eu e o meu marido queríamos um pet idoso ou com alguma deficiência porque sabemos que é mais difícil de eles serem adotados. Olhamos o Instagram do Tomba e encontramos a foto do Yoda, que se chamava Bob Duque. Foi amor a primeira vista! Era ele! Entramos em contato e eles passaram o fone da Isa, que resgatou o nosso menino. Fomos conhecê-lo no hotelzinho e não deu outra, resolvemos adotar! Viemos para o Canadá no ano passado e é claro que ele veio conosco. Em nenhum momento pensamos em deixá-lo para trás! Quem ama cuida e ele é parte da família. Apesar de ser um ‘tripézinho’, ele é perfeito, faz tudo o que um cachorrinho com as quatro patas pode fazer. Sempre digo para a Isa que ele tinha que ser nosso. É um amor enorme que sentimos por ele. Somos muito gratos à Isa por ter feito o resgate dele e sempre digo que só dividimos o Yoda com ela!”, finaliza Karla.

Para adotar algum animal resgatado pelo Tomba Latas, visite os perfis do grupo no Facebook e no Instagram. Outra forma de ajudar é compartilhando as publicações para que um número maior de pessoas possa visualizar os animais que estão para adoção.

Você também pode se tornar padrinho de um animal e ajudar mensalmente a pagar os gastos desse resgatado. Basta entrar em contato com o grupo, por meio das redes sociais, e buscar mais informações.

Fique atento aos nossos posts aqui na página “Adote um Amigo” que será atualizada seguidamente com animais que estão para adoção.

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