Texto: Marcos Anubis
Revisão: Pri Oliveira
Foto: Divulgação

volkana

Formada em 1987, a Volkana marcou seu nome na história do Heavy Metal brasileiro em vários aspectos. Um dos mais impactantes, na época, era o fato de a banda ser composta só por mulheres, algo que, até hoje, não é tão comum. Na verdade, Mila Menezes (baixo), Karla Carneiro (guitarra), Débora Darwich (bateria) e Marielle Loyola (vocal) abriram as portas para que muitas instrumentistas brasileiras fossem devidamente reconhecidas.

Apesar de o mundo do Rock, e principalmente do Heavy Metal, ser essencialmente composto por homens, ao que parece, a banda não sofreu preconceito durante a sua trajetória. “Todo mundo fala desse preconceito por ser mulher… Na real, eu, a Mila e a Karla tocamos desde sempre. Então, para a gente, o estranho era estar entre mulheres. Elas sim tinham um lance estranho com a gente (risos)”, conta Marielle.

Depois de dois álbuns, “First” (1990) e “Mindtrips” (1994), a banda encerrou as suas atividades em 1996. Hoje, após 20 anos, o grupo está retomando a sua trajetória. Ao lado do baterista Sérgio Facci, que entrou na banda pouco antes da gravação da primeira demo, a cantora e radialista Marielle Loyola é a responsável por essa volta. A nova formação é completada por Priscilla Tiemi (baixo), Isa Nielsen e Karen Ramos (guitarras).

Radicada em Curitiba, Marielle é uma das maiores incentivadoras da cena musical da capital paranaense. Além de continuar com seu trabalho musical com o Cores D’Flores, grupo que construiu uma grande trajetória no rock curitibano, a vocalista também desenvolveu uma bem-sucedida carreira como radialista nas rádios 91 Rock e Mundo Livre FM. Hoje, ela trabalha na Claymore Radio e continua abrindo espaço para os artistas locais.

Inicialmente, a Volkana teria um nome e uma formação diferentes. Porém, as circunstâncias levaram o grupo a seguir por outro caminho. “A Mila e a Karla me convidaram para montar uma banda só de meninas, que seria o Autópsia. A Syang seria a guitarrista, mas aí ela casou com o Ronan do P.U.S. e foi tocar com ele”, conta Marielle. “Aí, nasceu a Volkana, já com a Débora Darwich na bateria, eu no vocal e a Karla assumindo a guitarra. A Ana montou o Flammea e todos diziam que a gente tinha treta com eles. Ridículo! Nunca rolou nada. Cada uma foi fazer o som que gostava: a Syang tocando Death Metal, a Ana tocando Hard Rock e a gente um Punk Thrash”, complementa.

O próximo passo foi se mudar para São Paulo e gravar uma demo para buscar uma gravadora que lançasse a banda. Nesse período, Débora decidiu deixar o grupo. “Quando ela saiu, ficamos sem ninguém. Tivemos a Patti do Ozone e a Roberta do Kleiderman, mas não era a mesma coisa. A Débora era tipo a Fernanda Terra, muito demais! Então, como a gente ia ensaiar no estúdio da Rock Brigade e o Serginho também ensaiava lá com o Vodu, pedimos pra ele dar uma força e fazer a batera pra gente em um ensaio ou dois (risos). Tocar com ele era perfeito e aí não quisemos mais tocar com outro baterista”, conta.

O EP “Thrash Flowers” (1988) foi gravado no Zen Estúdios, em Brasília, e produzido pela própria banda no melhor estilo “faça você mesmo”. A partir daí, as portas se abriram para que a banda construísse uma trajetória que já se desenhava promissora. “Aí, o bagulho ficou bom (risos). Eu saí do Arte no Escuro e a Débora se desligou do Detrito Federal para nos dedicarmos à Volkana. Fomos contratadas pela Eldorado, que já tinha em seu cast o Sepultura, o Ratos de Porão e o Viper”, diz.

Porém, até selar o acordo com a gravadora mineira, o grupo teve que passar por algumas situações no mínimo inusitadas. “O contrato com a Eldorado foi engraçado. A gente mandou uma fita para o João Gordo e o Max e eles disseram ‘apareçam aqui que nós levamos vocês na gravadora’. Acho que eles não botavam fé que a gente ia e a gente foi! Quando eles nos viram na gravadora (chegamos lá às 8 da manhã, sem grana para nada, nem para voltar) eles devem ter pensado ‘as minas são doidas e vieram mesmo’! Aí, eles apresentaram a Volkana para os diretores, que ouviram a demo, curtiram e disseram que queriam nos contratar. Eles não sabiam que só tínhamos três músicas (risos)”, relembra.

Teoricamente, a missão havia sido bem-sucedida, mas ainda faltava uma coisa. “Eles deram o contrato para análise e a gente ficou olhando pra eles. Nós não tínhamos como voltar para casa, pois viajamos somente com a passagem de ida. Quando lembro disso eu me divirto (risos). Aí eles pagaram as passagens de avião pra gente”, complementa.

“First” (1990), o álbum de estreia da Volkana, foi gravado no Estúdio Eldorado, em São Paulo, e produzido por Carlos Eduardo Miranda. Logo de cara, a pegada Thrash/Punk da banda impressionou o público. Daquela época, também, ficou uma grande conexão com o malucaço Miranda. “Ele virou nosso amigão. Acho que foi a primeira produção dele por uma grande gravadora. Foi animal”, conta.

Além das influências mais diretas do grupo, o disco também contava com a participação do rapper Thaíde e de seu parceiro musical, o DJ Hum, na faixa “Scratch noise/War? Where my enemy lie”. Essa colaboração era algo impensado em uma época em que a união do Rap com o Metal era quase impossível de acontecer. “Eles também eram da Eldorado e nós ficamos muito amigos. Eu sempre amei e amo o Rap e, de tanto trocar ideia sobre o mundo, sobre as roubadas da vida, resolvi convidá-los. Na época, todo mundo achou um absurdo, mas a gente não estava nem aí. Se você ouvir o ‘First’, dá pra sacar vários elementos que, para a época, eram ‘estranhos’, muitos scratchs e tal. Enfim, rolou e logo depois isso virou meio que moda no mundo. Eu acho que estilos chamados de ‘underground’ trazem a mesma linha de pensamento e passam pelos mesmos sufocos, então, ‘tamo junto’ (risos)”, diz.

Com o disco na praça e a banda sendo convidada para vários programas, entre eles, o Matéria Prima da TV Cultura, que era comandado pelo apresentador Serginho Groismann, a turnê de divulgação do álbum rendeu alguns shows marcantes. “Abrimos uma turnê do Titãs que passou por quatro capitais, fizemos tour com o Ratos por todo o Nordeste e também tocamos em Curitiba. O show foi produzido pelo querido Beto Toledo. Foi tudo superorganizado. Tinha van, hotel, alimentação, só não tinha som no local, que era no Clube Água Verde (risos). Aí, as bandas daqui que iriam tocar com a gente arrumaram um som horrível, mas de coração (risos), relembra.

Na sequência, antes da gravação do segundo álbum, “Mindtrips” que seria lançado apenas em 1994, Marielle deixou a banda. “Acredito que tudo acontece porque tem que acontecer. Eu tive que voltar a Curitiba, pois estava com um problema de saúde na família que levou a pessoa que mais amei, meu irmão, Mariel Loyola”, relembra. Dois anos depois, o grupo encerrava oficialmente as suas atividades.

Demorou 15 anos para a banda voltar a se reunir, mesmo que brevemente. Foi em 2011, quando a Volkana participou do CD/documentário “Brasil Heavy Metal”, que resgatou nomes que ajudaram a consolidar o estilo no Brasil. “Nós voltamos para fazer dois shows a pedido do pessoal que organizou o filme, mas foi só isso. Não tínhamos a intenção de voltar. Eles colocaram no palco novamente grandes nomes do Metal dos anos 1990 com esse projeto que foi demais!”, diz.

O primeiro show dessa nova fase aconteceu no festival Metal Warriors, que aconteceu no John Bull, em Curitiba, no dia 9 de dezembro. A Volkana se apresentou como atração principal do evento que ainda contou com shows dos grupos Aquilla, Disharmonic Fields, Hot Foxxy e Phelan.

O retorno, dessa vez, será realmente uma continuidade na carreira da Volkana. “Agora é pra valer! Eu e o Serginho já vínhamos fazendo algumas coisas juntos, aí o Marllon do Aquilla me pediu pra fazer esse show no Metal Warriors, pois ele queria muito ver a Volkana e é um amigo muito querido. Então, eu falei com o Serginho que já tinha conhecido umas meninas que queriam muito tocar na Volkana e tocavam muito bem. Conversamos com a Mila e a Karla, que não estão mais tocando, e elas deram uma puta força. Eu já tinha tocado com a Karen Ramos no Cores D’Flores e sempre soube que ela era metaleira de alma e sempre falava da Volkana”, conta.

Dessa forma, Marielle e Serginho resolveram encarar o desafio de voltar aos palcos. “Não foi nada pensado ou qualquer coisa assim, só vontade de tocar mesmo. Aí já apareceram pessoas que gostariam de produzir o trampo e está indo legal. A Isa Nielsen e a Priscila Tiemi são meninas geniais, com pouca idade, mas fodásticas. Está sendo um grande prazer tocar com elas”, elogia.

E a ideia não é somente voltar a fazer shows. O próximo passo é começar a compor e preparar o material para um novo álbum. “Já estamos falando sobre as próximas músicas. O ‘First’ também será relançado no começo de 2018. Faremos shows com músicas dos dois álbuns e até o final do ano que vem estaremos com um novo disco. Talvez até antes a gente lance alguns singles e, até julho, um clipe. Vai ser legal”, revela.

Entre as diferenças da década de 1990 para o mundo cibernético atual, Marielle vê pontos bons e ruins. “Só a internet já agiliza muito mais o trampo, né, até ensaiar pelo Skype é massa (risos). Antes, tudo era lento, mas existe um romantismo sobre tudo que já passou. Foi muito legal, mas hoje em dia tudo é melhor, o equipamento principalmente”, compara.

No mundo musical, a cantora não nota muitas mudanças. “Sonoramente, eu não consigo ver diferença do que fazíamos para o que é feito hoje. A gente toca para ser feliz e a Volkana sempre foi isso. A gente tocava porque curtia e agora não está sendo diferente. O que vier será resultado do nosso trabalho feito com paixão pelo Metal, não tenho dúvida”, finaliza.