Bono e The Edge, coração e alma do U2. (Foto - Reprodução/Site U2)

Bono e The Edge, coração e alma do U2. (Foto – Reprodução/Site U2)

 

Texto – Marcos Anubis

Revisão e fotos da Irlanda – Pri Oliveira

 

Quatro décadas à frente de uma das bandas mais importantes do mundo. Bono Vox, vocalista do U2, completa neste domingo (10) 55 anos de idade. Após sofrer um grave acidente de bicicleta no ano passado, Bono e seus companheiros irlandeses estão prontos para iniciar a turnê do mais recente álbum do grupo, “Songs Of Innocence” lançado no ano passado. No acidente, Bono quebrou o braço em seis partes, fraturou a cavidade ocular, a mão e a escápula.Ele foi submetido a duas cirurgias.

A tour começa na próxima quinta-feira (14) na Rogers Arena em Vancouver (EUA) e passará por 20 cidades nos Estados e Europa.

 

Vida e U2

 

Bono nasceu como Paul David Hewson no dia 10 de maio de 1960 no Rotunda Hospital, em Dublin, capital da Irlanda. O apelido Bono Vox é uma analogia à expressão italiana “Bonavox”, que significa “boa voz”. No final da década de 1970, o jovem Paul Hewson começaria a trilhar o caminho que o faria conhecido em todo o mundo.

No dia 25 de setembro de 1976, o baterista Larry Mullen Jr. colocou um anúncio na Mount Temple Comprehensive High, em Dublin, procurando músicos para montar uma banda. Seis pretendentes se apresentaram e três deles se uniriam a Larry para formar o U2: Bono (vocal), The Edge (guitarra) e Adam Clayton (baixo).

O grupo teve dois nomes antes de assumir sua encarnação definitiva: Feedback e, posteriormente, The Hype. A conexão musical e de amizade entre os quatro foi automática e fez com que o eles mantivessem até hoje a mesma formação.

Nos quase 40 anos de estrada do U2, o quarteto lançou 13 álbuns, entre gravações ao vivo e em estúdio. Três deles se destacam, cada um por um motivo bem específico.

Frente da casa de Bono Vox em Dublin.

Frente da casa de Bono Vox em Dublin.

 

Punk, Soul, Jazz, Blues, Música Eletrônica…

 

Nascido como um grupo punk, no som e no visual, o U2 foi absorvendo influências ao longo do caminho. Seus primeiros álbuns, “Boy” (1980), “October” (1981) e “War” (1983), refletem a fase mais “rebelde” de Bono, com letras que mesclavam religiosidade e postura política.

Nessa trilogia estão duas das canções mais marcantes da banda: “New Years Day” e “Sunday Bloody Sunday”, onde Bono retrata o “Domingo Sangrento” do dia 30 de janeiro de 1972. O massacre aconteceu em Derry, na Irlanda do Norte, quando uma passeata que reunia cerca de dez mil manifestantes, entre católicos e protestantes, foi atacada a bala por soldados ingleses.

14 ativistas morreram e 26 ficaram feridos. Entre as vítimas estavam seis menores de idade. O objetivo dos manifestantes era protestar contra a política do governo norte-irlandês, que usava a prerrogativa de combater o terrorismo para prender indiscriminadamente qualquer pessoa que fosse considerada suspeita. “E a batalha apenas começou. Há muitas perdas, mas me diga quem ganhou? Trincheiras cavadas dentro dos nossos corações e mães, crianças, irmãos, irmãs separados”, diz a letra de “Sunday Bloody Sunday”.

 

A paixão pela América

 

Em 1987 o grupo lançou “The Joshua Tree”. Na época o quarteto estava literalmente obcecado pela cultura americana e isso pode ser sentido claramente no disco, com influências da música negra, notadamente o Blues, o Gospel e o Jazz, aparecendo de forma muito forte. Entre os clássicos instantâneos do álbum estão “With Or Without You”, “Where The Streets Have No Name” e “I Still Haven’t Found What I’m Looking For”.

O administrador Joel Zolnier pode ser considerado a maior “autoridade” curitibana quando o assunto é U2. Em seu acervo, o fã tem 35 vinis, entre álbuns e singles, 52 CDs, 10 DVDs e três livros oficiais. Ninguém melhor, portanto, para analisar a discografia dos irlandeses. “O ‘The Joshua Tree’ praticamente fez o U2 ‘invadir’ os USA. Lá ele vendeu lá 300 mil cópias em 48hs. Uma das músicas que eu mais gosto nesse disco é ‘Mothers Disappeared’, composta em homenagem às mães dos desaparecidos políticos na Argentina, conhecidas como Plazias de Mayo. Outra faixa interessante é ‘Bullet The Blue Sky’, uma nova homenagem à Martin Luther King. O carro chefe do álbum foi ‘With Or Without You’ e eu lembro que quando ela tocou pela primeira vez aqui em Curitiba, no extinto Club 700, ela foi vaiada. Quis matar todo mundo (risos), diz Joel.

No ano seguinte o U2 lançou o álbum “Rattle And Hum”, que mesclava faixas ao vivo e de estúdio. O disco também gerou um vídeo documentário que é considerado um dos melhores já produzidos por uma banda de Rock. O filme tem duas partes: uma foi gravada em preto e branco e termina com a belíssima “Heartland”, com imagens do grupo observando o rio Mississipi e passeando pela Mansão de Elvis Presley, Graceland. A segunda parte, em cores, começa com “Where The Streets Have No Name” no Sun Devil Stadium, em Tempe, no Arizona.

O choque entre os dois formatos é espetacular. “O álbum traz diversas músicas ao vivo gravadas na turnê do ‘The Joshua Tree’ e mais algumas faixas com participações memoráveis, como ‘Love Comes To Town’ com a lenda viva B.B. King. Na música ‘All Along The Watchtower’, do Jimmy Hendrix, eles montaram um palco no centro de Nova York, tocaram e picharam a frase ‘Rock ‘n’ Roll Stop The Traffic’ em um monumento próximo, mostrando que ainda existia uma veia punk na banda”, analisa Joel.

 

A reinvenção e a música que salvou o U2

 

Em 1991 o som do U2 mudou drasticamente. O quarteto achava que era preciso se reinventar, mas de que forma? Os músicos então se mudaram para Berlim e começaram a criar o que seria o álbum “Achtung Baby”. O disco, foi gravado no Hansa Studios (mesmo local onde Bowie gravou “Heroes”) e teve a produção de Daniel Lanois e Brian Eno. Nesse trabalho a banda incorporava pela primeira vez em sua carreira elementos eletrônicos típicos do anos 1990.

Esse foi um divisor de águas para o U2. O clima era pesado porque os integrantes não concordavam sobre qual seria o melhor caminho musical a seguir. O quarteto estava vivendo o momento mais difícil de sua carreira. Mas enquanto Bono e The Edge achavam que era preciso um descobrir um novo rumo musical, a sessão rítmica do U2, Larry e Adam, mal participava das gravações e composições. O rompimento parecia inevitável, era somente questão de um deles acender o estopim.

Em meio ao desgaste que minava a existência da banda, uma canção mal construída foi tomando forma. Entre um acorde a mais aqui e outro melhor pensado ali, uma melodia estava surgindo para mostrar aos velhos amigos e companheiros que eles ainda teriam pela frente décadas de lenha para queimar. “Está melhor? Ou se sente igual? Tirou um peso das costas agora que achou alguém para culpar?”, diz a letra de “One”.

Na opinião de Joel, o U2 conseguiu o que pretendia: se reinventar. “O álbum marca a diversidade e o fato de a banda se desprender de rótulos, mas sem desagradar seus fãs fiéis pelo mundo inteiro. Um fato interessante é que a faixa ‘Love Is Blindness’ foi cantada pelo The Edge, repetindo o que ele fez na ‘Van Diemen’s Land’, do ‘Rattle And Hum’ (1988), diz.

Depois de enfrentar seus demônios e vencê-los, o U2 continuou sua trajetória de sucesso e lançou mais seis álbuns: “Zooropa” (1993), “Pop” (1997), “All That You Can’t Leave Behind” (2000), “How To Dismantle An Atomic Bomb” (2004), “No Line On The Horizon” (2009) e o recente “Songs Of Innocence” (2014).

O U2 é um sobrevivente de uma época onde as bandas lotavam estádios ao redor do mundo. Hoje, em meio a um cenário musical cada vez mais volátil e descartável, o quarteto irlandês é um dos poucos artistas que conseguem essa proeza. Calejados pelas alegrias e obstáculos do Rock ‘n’ Roll, o quarteto ainda tem gás para produzir músicas de qualidade, como a maioria de sua obra. Como canta Bono em “Exit”: “Mãos que constroem também podem destruir. Mesmo as mãos de amor”. Bono, Larry, The Edge e Adam entenderam bem isso.

A fotógrafa do Cwb Live, Pri Oliveira, morou durante cinco anos em Dublin. Veja o álbum de fotos que ela fez mostrando a casa de Bono na Vico Road, que fica nos arredores da capital irlandesa.

Assista também a alguns momentos importantes na carreira do U2: “The Eletric Co” gravada ao vivo no DVD Live At The Rocks de 1983. “Heartland”, com um depoimento emocionado de Larry falando sobre Elvis Presley e “Mysterious Ways” que retrata bem a fase “Achtung Baby”.