Texto: Marcos Anubis
Revisão: Pri Oliveira
Foto: Divulgação

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Apesar de ser um festival voltado para o Psychobilly/Rockabilly, tradicionalmente, o Psycho Carnival sempre abriu espaço para bandas de outros estilos. Na 18ª edição do evento, que acontecerá entre os dias 24 e 27 de fevereiro, no Jokers, não será diferente.

Desta vez, uma das atrações será o quarteto No Milk Today, um dos veteranos da cena punk curitibana. Esta será a primeira vez que Rodrigo Minduim (guitarra e vocal), Mauricião (baixo e vocal), Neto (guitarra e backing vocais) e Mauricio Cabelo (bateria) participarão “oficialmente” da programação do Psycho Carnival. “Em outros anos, nós tocamos em eventos paralelos, nos ‘esquentas’ ou nas ‘ressacas’ (risos). Ficamos muito felizes de poder participar, de estarmos no cartaz. Sabemos que a responsabilidade é enorme e vamos procurar fazer um de nossos melhores shows”, diz Mauricião.

Em seus 24 anos de carreira, a banda tem três trabalhos lançados: “Devolvam Meu Vinil” (2002), “Tormento” (2007) e “Coturno Bastardo” (2015) que, na visão do grupo, é o seu CD mais representativo. “Esse disco nos mostrou quem somos, hoje. Estávamos há muito tempo sem gravar e nossos dois primeiros álbuns tinham muito material do início da banda. Esse foi feito com músicas de agora. Estávamos virando uma banda cover de nós mesmos. Agora, sabemos quem é o No Milk Today de 2017”, diz Rodrigo.

A gravação do CD durou uma semana e foi realizada no Estúdio Garageland, em Curitiba. A produção foi do gaúcho Davi Pacote. “Dos nossos três álbuns, o ‘Coturno Bastardo’ é o mais bem produzido, graças ao Davi Pacote que realmente nos ajudou muito a obter o resultado que esperávamos”, complementa Neto.

O álbum tem dez faixas, mas uma delas chama a atenção do ouvinte pela ferocidade com que foi gravada. “Punk Rock do Brasil” passa a sensação de ser uma grande celebração do estilo, que é um dos mais sinceros e diretos do país. “Inicialmente, queríamos citar o nome das bandas que nos influenciaram. Porém, a letra ficou melhor citando frases ou termos de músicas clássicas do Punk brasileiro. É uma brincadeira bacana e aqueles que estiverem com os ouvidos atentos vão achar várias coisas interessantes”, explica Rodrigo. “A letra é sim uma espécie de tributo às bandas que fizeram o Punk Rock acontecer no país. Sem elas, o que seria do gênero por aqui?”, explica Mauricião.

Essa música também expõe uma realidade que foi vivida pela maioria das bandas punks do país a partir da metade dos anos 1980. “Depois da ditadura, escutar Punk Rock nacional era fazer parte de algo e sonhar em poder, no futuro, formar uma banda. Graças a esses grupos, a música Punk era bastante limitada, mas muito forte se comparada a de hoje”, diz Rodrigo. “Ao invés de comprarmos qualquer bobagem com um salário mínimo, optávamos por adquirir uma guitarra velha, um amplificador moído ou parcelado nas Lojas Brasileiras. Procurávamos falar algo por meio da música. Passamos a nos sentir alguém, naquele momento. Daí vem essa homenagem”, complementa Neto.

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A história

O No Milk Today nasceu em 1993 e, logo no seu início, a banda vivenciou o que muitos consideram o período de ouro da música curitibana. Na época, devido à quantidade e à qualidade dos grupos na capital paranaense, Curitiba foi batizada de “Seattle brasileira” pelo ex-VJ da MTV, Fabio Massari.

O apelido fazia referência a capital do Grunge, nos Estados Unidos. “Existe um pouco de fantasia e exagero nessa história. Simplesmente tínhamos uma das maiores populações de bandas por m² do Brasil, querendo fazer algo no mesmo momento. Mas não era alguma coisa pensada, organizada e revolucionária”, analisa Mauricião. “Depois daquilo, houve uma época até melhor, que foi o início dos anos 2000, antes dessa era das redes sociais. A cena hoje está andando, mas não tem mais aquela utopia de ‘ah, vamos estourar’. Aliás, nunca teve e isso não é ruim”, complementa.

Muita coisa mudou desde aquele momento de euforia, mas atualmente os integrantes do No Milk Today acreditam que o cenário como um todo está mais fortalecido. “Imagine que, naquela época, sem internet, o reconhecimento de um cara foda como o Massari trazia toda aquela repercussão. Mas acho que, se duvidar, a cena de hoje é mais rica do que daquele tempo. Agora, porém é tudo difuso, espalhado por diversas mídias e meios. Não é uma MTV que vai levantar uma lebre como outrora. Aqui tem Psycho, Rock, Industrial, Indie, One man band, Punk e Metal, tudo da melhor qualidade. Aonde mais você encontra isso no Brasil?”, analisa Rodrigo.

Na realidade, muitos alicerces da música autoral curitibana foram construídos naquela época. Talvez a maior deles tenha sido a participação efetiva do público que, diferentemente de hoje, abraçou as bandas locais. “Concordo com o Mauricião, mas entendo que Curitiba recebeu este rótulo porque tinha mais bandas de Rock independente por m² do que em outras capitais. Foi uma fase muito boa! O Rock alternativo e autoral era mais respeitado e as casas de shows davam mais espaço para essas bandas do que para os covers, mesmo se o grupo fosse uma bosta. Acho que esse é o caminho. Foi uma junção de tudo, principalmente da participação maciça do público nos eventos. Ainda bem que por aqui ainda respiramos isso!”, opina Neto.

A mensagem

Tradicionalmente, as letras punks possuem uma mensagem forte e direta. Essa característica, talvez de forma um pouco mais sutil, também está presente nas composições do No Milk Today. “Não somos demasiadamente encanados com isso. Fazemos letras sobre o cotidiano, falamos das coisas que vivemos e do dia a dia de nossa cidade. Não levantamos bandeiras. Buscamos o melhor contra o pior”, explica Mauricião.

No CD “Coturno Bastardo”, inclusive, a banda dedicou uma atenção maior ao texto das músicas. “Nesse último álbum, tivemos a preocupação de compor algo que nossos filhos possam ouvir e acreditar. Por causa da zoeira, essa é uma coisa difícil nos discos punks. Isso deixou o CD um pouco mais sério, porém bem mais digerível. Recebemos mensagens de jovens e crianças de todo o país cantando e curtindo. Além disso, nos shows, a galera mais antiga canta em coro conosco. ‘Seja punk, mas não seja burro’ é a guia para escrever as nossas letras”, complementa Rodrigo.

O No Milk Today também já começou a pensar no sucessor de “Coturno Bastardo”. Após a esperada apresentação no festival, a intenção da banda é iniciar a pré-produção de um novo álbum. “Chegamos ao nosso 24º ano de vida com apenas três álbuns de estúdio, o que é muito pouco. A forma com que fizemos o nosso último CD funcionou bem, então repetiremos neste ano. Vamos parar de agendar shows e nos recolher para compor e gravar. É um sumiço de quase um ano, mas que vale a pena”, conta Rodrigo. “Depois do Psycho, nós vamos completar um rolê nos principais picos que tocamos: Jokers, Lado B, 92º e Lino’s, além de um show em Araucária. Feito isso, vamos nos recolher para compor e gravar. É só assim que a coisa funciona para nós. Provavelmente, só voltaremos no final de 2017 ou começo de 2018. Por isso, esperamos todos no Psycho Carnival. Será um show emblemático.”, complementa. “O estúdio fica na minha casa. Vai ser foda aguentar esses caras entocados lá durante todo esse tempo, mas o resultado é bacana”, brinca Cabelo.

Um festival com a cara de Curitiba

O Psycho Carnival está há quase duas décadas sendo realizado ininterruptamente. Em função disso, o respeito demonstrado por artistas psycho de todo o mundo sempre é muito grande. Dentro da cena musical curitibana, de qualquer estilo, isso não é diferente. “É importantíssimo, quase vital! Do jeito que a coisa evoluiu (graças ao árduo trabalho dos caras) o Psycho Carnival ajudou as outras cenas, também. Profissionalismo e organização precisam estar presentes em toda e qualquer produção artística. Eu sempre acreditei que ia virar! Por isso, sempre que pude eu ajudei”,   elogia Mauricião.

Essa admiração se deve, em boa parte, ao trabalho que os organizadores desenvolvem. Mesmo sem contar com grande apoio local, o músico e produtor Vladimir Urban consegue manter vivo o Psycho Carnival, ao lado de toda a equipe de produção do festival. “Tenho orgulho do Psycho Carnival! Convido amigos de todo o país e de fora para estarem aqui no festival. Ele coloca Curitiba na agenda dos principais festivais do mundo, pois traz o mignon do Psychobilly mundial (até porque boa parte dele está aqui mesmo em Curitiba). A cidade respira Rock nesses dias. Ele tem que ser cuidado, protegido e reconhecido como uma referência para as gerações. Todos se envolvem direta ou indiretamente na cidade. É importante demais”, afirma Rodrigo.

Além de ser uma das atrações desta edição do festival, o No Milk Today também demonstra a expectativa de ver ao vivo alguns grandes nomes que passarão pelo palco do Jokers. “Não tem como ignorar qualquer dia do festival. Todo fã de Rock que se preza tem que, uma vez na vida e todas as possíveis, ver o Ovos Presley no Psycho Carnival. Para nós, não é diferente!, diz Rodrigo.

Mas a lista não para por aí. “Neste ano, a programação está especial. Nós vamos dividir o palco com o Phantom Rockers, que são uns caras com uma baita história. Também queremos muito ver o Long Tall Texans e as inigualáveis As Diabatz. Esse será um show histórico, pois acontecerá na mesma noite do Sick Sick Sinners. É imperdível!”, continua Rodrigo. “Sou fã de carteirinha do Rockabilly. É difícil elencar, mas quem puxar para o Billy clássico terá a minha simpatia. Bateras tocando em pé merecem respeito!, complementa Cabelo.

O No Milk Today também pretende estar presente nos shows de duas bandas que possuem uma ligação muito antiga com o Psycho Carnival. “Para completar, queremos, como sempre, ver o power trio The Mullet Monster Mafia. Em nossa opinião, eles são a melhor banda instrumental do Brasil no momento, independentemente do estilo. O Kráppulas também está na nossa lista. Eles não sabem, mas são mais Hardcore do que a maioria das bandas Hardcore, pois são rápidos e pesados. E, é logico que vamos esperar para ver ao vivo o The Meteors. Temos discos deles em nossas coleções e, depois de alguns anos, soubemos que aquele estilo Punk, meio Billy, tinha nome: Psychobilly!”, finaliza Rodrigo.

O show do No Milk Today será no dia 24 de fevereiro, na Noite do Esquenta. Os ingressos para a 18ª edição do Psycho Carnival já estão à venda. A carga de bilhetes é limitada. Confira neste link quais são os valores e as formas de pagamento.