Texto: Marcos Anubis
Revisão e tradução: Pri Oliveira
Foto: Reprodução/Facebook The Wedding Present

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A década de 1980 é sempre lembrada como um período extremamente criativo para a música britânica. A influência dessa época é sentida até hoje em bandas contemporâneas. Entre os inúmeros artistas que se destacaram nessa “década de ouro”, estava o The Wedding Present.

Prestes a lançar seu novo álbum, o vocalista, guitarrista e principal compositor da banda, David Gedge, conversou com o Cwb Live e contou algumas histórias vividas nesses trinta anos de estrada do grupo.

A continuação da saga

Formada em 1985 na cidade de Leeds, na Inglaterra, a banda tem no mínimo dois álbuns que fazem parte da discografia básica do Rock inglês: “George Best” (1987) e “Bizarro” (1989). Mas David Gedge (vocal e guitarra), Sam Beer-Pearce (guitarra), Katharine Wallinger (baixo e backing vocal) e Charlie Layton (bateria), não pararam no tempo.

No próximo dia 2 de setembro, o The Wedding Present lançará “Going, Going…”, o 9º álbum de estúdio de sua carreira. Esse novo trabalho começou a nascer em 2013, após a turnê do álbum “Valentina” (2012). “Nosso novo álbum esteve ‘germinando’ por uns bons cinco anos, mais ou menos. O nosso álbum anterior, ‘Valentina’, foi lançado em março de 2012 e então nós passamos praticamente o resto do ano e uma parte do ano seguinte (2013) em turnê. Assim, eu posso dizer que esse projeto nasceu oficialmente na Primavera de 2013, quando o próximo lote de novas canções começou a surgir”, conta David.

Uma característica inusitada de “Going, Going…” é que ele terá 20 faixas, fato pouco comum dentro do formato em que os CDs são lançados atualmente. O “normal” é que eles tenham dez faixas, no máximo, o que corresponde a aproximadamente uma hora de música.

Em seu novo álbum, o The Wedding Present fez questão de não seguir por esse caminho. “Eu escolhi o número 20 porque a viagem que fizemos em 2014 visitando 20 estados parecia ser o número mais óbvio! Mas não… Nós costumamos ter inúmeras ideias para as músicas, sempre!”, explica David.

Uma experiência sensorial

A viagem a que David se refere não influenciou só o número de faixas do novo CD. As canções de “Going,Going…” virão acompanhadas por vídeos que complementam a parte sonora das faixas. Um deles é “Bear”, que você pode assistir acima.

Eles foram gravados por David e pela fotógrafa Jessica McMillan. “Eu já tinha decidido que eu não queria fazer somente ‘outro álbum’ e, então, surgiu a ideia de criar vinte ‘pedaços de música’ interligados. Assim, no verão de 2014 eu viajei pelos Estados Unidos com a Jessica McMillan e nós fizemos alguns curtas-metragens para acompanhar as músicas. Desde então, tem sido o caso de progredir nas vinte músicas, testando todas e as mais variadas ideias, vendo como elas funcionam em conjunto com os elementos visuais”, complementa.

Como David queria que o novo CD do grupo tivesse algo especial, surgiu a intenção de incrementar o novo lançamento com outro tipo de arte. “A ideia de produzir filmes enquanto viajávamos através dos Estados Unidos evoluiu ao mesmo tempo que a música, ou seja, a relação entre os elementos visuais e o áudio já existia desde o início”, explica.

A intenção é estabelecer um link entre música e vídeo, de maneira que um complemente o outro. Eles estarão disponíveis no YouTube e também serão exibidos durante as apresentações da banda.“Eu acho que os elementos visuais são como um pano de fundo para a história nas letras das músicas. E elas são uma experiência, de alguma forma. É como quando você assiste a um filme e ouve uma música, a sua mente acaba por encontrar um padrão, ligando o áudio ao visual. É semelhante ao que você sente quando está andando na rua usando fones de ouvido. Eu acho que isso faz você ouvir a canção de um modo diferente”, diz.

Pílulas

“Going, Going…” será lançado no mês que vem, mas algumas canções já podem ser ouvidas pela internet, pois a banda optou por liberar alguns singles antes do álbum completo. Uma delas foi “Sprague”, uma canção instrumental, calma e envolvente. Nela, arpejos executados no piano são sobrepostos por uma melodia tocada por um quarteto de cordas. David criou a música em seu computador durante uma passagem pela cidade de Rockport, em Washington. Ela foi gravada pelo músico e produtor Paul Hiraga no Crackle & Pop!  Studio, em Seattle.

Já em “Pledge”, “Bear” e “Broken Bow”, as tradicionais guitarras raivosas e as microfonias, duas das características do The Wedding Present, se fazem presentes. As inovações que envolvem “Going, Going…” também se estendem ao formato de seu lançamento.

Pioneiros dentro da indústria fonográfica, o The Wedding Present aderiu aos novos métodos de divulgação dos artistas. “Eu não sei mais o que é preciso nos dias de hoje! Eu sou apenas guiado por pessoas que aparentemente têm conhecimento em ‘promoção’! O problema é que nós lançamos um álbum a cada poucos anos. Nesse intervalo de tempo, nós estamos prontos para lançar o próximo e então as regras mudam novamente!”, explica David.

Os novos indies

Hoje, o termo “indie” se tornou muito vago. Entre as décadas de 1980 e 1990, principalmente, a nomenclatura era usada para definir bandas que não pertenciam ao mainstream. Esses grupos eram vistos quase como heroicos, pois não entregavam a sua arte para as grandes gravadoras.

A partir dos anos 2000, tudo isso mudou drasticamente. “O termo ‘indie’ pode significar qualquer coisa nos dias de hoje: desde ‘o espírito livre de independência’ até o som da sua guitarra. Logo, sim, ele se tornou ‘vago’. Dito isso, mais pessoas entendem o que é uma banda indie atualmente. Isso é bem diferente da época em que nós começamos, nos anos 1980”, analisa.

Esse novo formato da música indie em todo o mundo também se reflete no Brasil. Na “terra do Samba”, muitas bandas foram influenciadas pelo The Wedding Present. E uma das cenas que mais se destacaram no país, talvez a maior delas, existiu em Curitiba na década de 1990. “Eu ouvi dizer que há uma grande cena ‘indie’ no Brasil. Infelizmente, eu acho que não conheço nenhuma das bandas”, diz.

Pérolas

Na discografia do The Wedding Present, dois álbuns se destacam como obras-primas: “George Best” (1987) e “Bizarro” (1989). Apesar de reconhecer a importância desses álbuns na carreira da banda, David não os coloca acima dos outros trabalhos lançados pelo grupo. “Eu realmente não vejo qualquer álbum como sendo mais significativo do que outro. Cada lançamento é um documento que demonstra como a banda soava naquele momento e como nós escrevemos e fizemos os arranjos das canções durante aquele período. Assim, cada álbum tem a sua própria personalidade e estilo”, afirma.

Alguns detalhes da gravação dos dois álbuns também são ingredientes que podem ter ajudado a torná-los especiais. “O ‘George Best’ e o ‘Bizarro’ são o que eu chamaria de ‘álbuns de estúdio’ em que nós gravamos todas as partes separadamente. O que eu quero dizer é que, embora os membros da banda fossem até o estúdio criar e tocar juntos, somente a bateria foi gravada assim. Na verdade, no ‘George Best’, a bateria não era mesmo de verdade. Mas isso já é outra história!”, conta.

Apesar de terem funcionado muito bem, esses métodos não seriam repetidos indefinidamente nos outros trabalhos do grupo. “O que nos explicaram é que se as guitarras e o baixo fossem gravados separadamente, nós seríamos capazes de tomar mais cuidado com os sons e com o que estávamos tocando. E isso certamente é verdade. Mas então nós conhecemos Steve Albini”, relembra.

O músico e produtor americano Steve Albini produziu vários álbuns importantes, entre eles “Surfer Rosa” (1988) do Pixies e “In Utero” (1993) do Nirvana. Como instrumentista, Albini já integrou as bandas Big Black, Shellac e Rapeman. “O método dele era, e ainda é, fazer todos tocarem juntos enquanto ele grava tudo. Desse jeito, ele diria, você captura a ‘emoção’ da banda trabalhando como uma unidade, que é como as músicas normalmente são organizadas, assim como ensaiamos e tocamos ao vivo. Albini nos lembrou de que essa era a maneira como os Beatles gravavam seus álbuns, e os registros deles têm resistido aos testes do tempo!”, diz.

A estreia de Albini como produtor de um full-length do The Wedding Present foi com o álbum “Seamonsters” (1991). “Foi assim que gravamos esse álbum. A gravação levou doze dias, enquanto o ‘Bizarro’ nos tomou seis semanas. E cada gravação do The Wedding Present é feita desse modo desde então. Eu acho que é por isso que ‘Going, Going…’ também soa ‘ao vivo’: os únicos overdubs, além dos que foram utilizados para corrigir alguns erros, são de canto e de alguns instrumentos extras. Ele pode ter algumas imperfeições, mas a vida também é assim!”, afirma.

Brasil

Em seus quase 31 anos de história, inacreditavelmente, o The Wedding Present nunca se apresentou no Brasil. Isso aconteceu não por falta de interesse da banda, mas por falta de oportunidade. “Nós adoraríamos tocar no Brasil! Mas, primeiro, nós precisamos ser convidados por alguma produtora de shows! Eu sei que nós temos fãs aí porque nós ouvimos falar deles sempre”, finaliza David Gedge.

Esse desejo é recíproco, pois o grupo realmente sempre teve muitos fãs por aqui. Festivais como o Lollapalooza, realizado anualmente em São Paulo, ou o Lupaluna, que poderá voltar a acontecer em Curitiba, seriam oportunidades perfeitas para isso. Quem sabe…