Texto e fotos: Marcos Anubis

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O show da banda carioca Picassos Falsos, no último sábado (31) no SESC Belenzinho em São Paulo, foi uma celebração da qualidade do rock brasileiro. Comemorando os 25 anos de seu lançamento, o grupo tocou na íntegra o clássico álbum “Supercarioca”, de 1988. O disco é uma das maiores referências da música nacional, até hoje. Mesclando rock e samba, Hendrix e Noel Rosa, o quarteto quebrou as barreiras que separavam o rock dos ritmos nacionais, sendo precursor em um estilo que, nos anos 1990, desaguaria na mangue beat de Chico Science e Fred 04.

Formado por Humberto Effe no vocal, Gustavo Corsi na guitarra, Luiz Henrique Romanholli no baixo e Abílio Rodrigues na bateria, o Picassos Falsos entrou no palco ao som de “Retinas”. Effe, acompanhado de seu pandeiro, deu o tom do que seria uma noite histórica, para a banda e para os fãs. A recepção do público foi calorosa, demonstrando todo o respeito e a admiração que o grupo desperta em velhos e novos admiradores. Alguns deles vieram de outros estados, como Ceará e Alagoas. “O show foi maravilhoso! Há muitos anos os caras não vinham para São Paulo. O swing deles é sensacional. O Humberto Effe é ligado em 220 w. E o que é o Gustavo Corsi na guitarra? Arrepia até o último fio de cabelo”, elogia a bibliotecária paulista Ana Marcia Martos Arrais, 43.

Na sequência do show, o quarteto executou duas de suas mais belas canções: “Bolero”, levada no violão e com um riff de guitarra na introdução que é, ao mesmo tempo, cortante e melódico, e “Marlene”. Traçando um paralelo, as pessoas que seguem a religião muçulmana precisam viajar para a cidade sagrada de Meca, ao menos uma vez em sua vida. Transpondo essa tradição para a nossa realidade, “Marlene” é uma daquelas músicas que qualquer fã do rock nacional precisa ouvir, ao vivo, em algum momento de sua existência. Marcada por um andamento soturno e misterioso e com um texto inspiradíssimo de Effe, ela é uma das pérolas da carreira da banda. “Tanto riso, tantas coisas ouvia no meio da noite. Como um gato ninguém me vê. Só você quando passa, quando passa”, diz a letra.

Além do álbum “Supercarioca”, o grupo também tocou algumas músicas de seu primeiro disco, “Picassos Falsos” de 1987 e do mais recente, “Novo Mundo” lançado em 2004. Antes de “Wolverine”, Effe brincou com o público dizendo que quando a canção foi composta, o personagem central não era tão conhecido como é atualmente, por conta dos filmes da série X-Men.

“Sangue”, música que abre o lado b do vinil “Supercarioca”, foi outro destaque do setlist. “Carne e Osso”, que tem todo o clima feito pela cozinha baixo e bateria de Romanholli e Abílio, e “Quadrinhos”, foram cantadas como hinos pelos fãs.

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Muito diferente, em termos de sonoridade e concepção das músicas, o primeiro álbum da banda é igualmente fantástico e com canções únicas, como “Contrastes”, onde Corsi faz uma espécie de “percussão” na guitarra, usando efeitos de modulação que criam um clima etéreo. “Quero cantar, os dias correm muito quentes. Quero sonhar, algo existe em minha mente. Algo mais, bem mais que minha loucura. Algo mais, bem mais que a sua sombra”, diz a letra.

Além de ter um grande compositor e intérprete, o vocalista Humberto Effe, a banda tem uma cozinha entrosadíssima e coesa, comandada por Romanholli e Abílio, mantendo a base rítmica para as intervenções do guitarrista Gustavo Corsi, que passeia pelo funk, (americano, cara pálida), por levadas ao estilo Hendrix ou por riffs mais pesados com a mesma maestria.

Na volta para o bis, o quarteto fez uma homenagem ao cantor e compositor Chico Buarque, tocando a música “Morena de Angola” em uma versão mais rock and roll, a la Picassos Falsos. “Porta Bandeira”, do álbum “Novo Mundo”, encerrou o show. Momentos depois, o grupo voltou para conversar com os fãs, distribuir autógrafos e tirar fotos.

O gosto de “quero mais” estava evidente em todo o público presente. Felizmente para a música brasileira, apesar do orgulho que demonstram pela história que construíram, a banda não vive das glórias do passado. O Picassos já está trabalhando em um novo projeto, mantido momentaneamente em segredo, mas que deve ser divulgado em breve. Aguardem novidades aqui no Cwb Live.

Os “supercariocas” mesclam inteligência, humildade, simpatia e boa música, qualidades que fizeram do Picassos Falsos um dos grandes nomes da história da nossa música. Pioneiros e visionários em uma época em que o rock nacional vivia uma realidade muito diferente da atual, o grupo continua olhando para frente, buscando novos horizontes.

Confira a entrevista exclusiva que a banda deu para o Cwb Live, falando sobre a sua trajetória e sobre a importância do álbum “Supercarioca” na história do rock nacional, entre outros assuntos. Confira, também, três músicas do show no SESC Belenzinho, “Bolero”, “Marlene” e “Sangue”.